“Extravagância com dinheiro público”: Justiça determina sequestro de caminhonete de luxo comprada por prefeitura da região
Veículo tem piloto automático adaptativo, rodas de liga leve de 20 polegadas, câmbio automático de dez velocidades e câmera 360º
O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), por meio da Promotoria de Justiça de Alto Rio Doce, obteve decisão liminar que decretou o sequestro imediato de uma caminhonete adquirida pela Prefeitura local, avaliada em cerca de R$ 350 mil. O veículo, ano/modelo 2025, possui itens como piloto automático adaptativo, rodas de liga leve de 20 polegadas, sistema multimídia, câmbio automático de dez velocidades, reconhecimento de sinais de trânsito e câmera 360º, entre outros.
Na Ação Civil Pública proposta contra o município, o prefeito e a empresa vendedora, o MPMG pede a nulidade do contrato administrativo e da licitação realizada, alegando vícios quanto aos motivos e ilegalidade do objeto, nos termos do artigo 148 da lei que estabelece normas gerais de aquisição e contratação para a administração pública. O órgão sustenta que o contrato seja desconstituído com a devolução do veículo ao patrimônio da empresa ou, se isso não ocorrer, a condenação do prefeito ao ressarcimento e à indenização do particular.
Na decisão, a Justiça apontou que os elementos apresentados reforçam o pedido de sequestro do bem. “O perigo da demora também se encontra configurado, uma vez que a utilização do veículo acarreta sua natural e progressiva desvalorização. Se ao final for declarada a nulidade do contrato e o bem tiver de ser devolvido à empresa vendedora, o município provavelmente será obrigado a indenizar pela depreciação resultante da utilização. O sequestro visa apenas garantir a integridade do bem litigioso até a decisão final de mérito, sendo, portanto, uma medida reversível e adequada à situação”.
Em nota, a Prefeitura de Alto Rio Doce afirmou que o veículo “é patrimônio público, adquirido pela administração municipal por meio de processo licitatório aberto, transparente e competitivo, conforme determina a Lei nº 14.133/2021. O veículo é de uso exclusivo da Prefeitura, não pertence ao Prefeito, e foi adquirido para atender às necessidades operacionais do município”. Confira a nota completa ao final da matéria.
Entenda o caso
Segundo o MPMG, a Prefeitura de Alto Rio Doce adquiriu o veículo da empresa Foco Automóveis Ltda., por meio de contrato administrativo precedido de licitação nº 26/2025 (pregão presencial nº 010/2025, registro de preços nº 08/2025, edital nº 013/2025). A estimativa previa a compra de dois veículos, com valor unitário de R$ 354.141,46 (total de R$ 708.282,92), mas o pregoeiro negociou a aquisição de uma caminhonete por R$ 350 mil.
De acordo com o promotor de Justiça Vinícius Chaves, “aparentemente, tudo absolutamente normal, não fosse a tamanha e afrontosa violação ao artigo 20 da Lei 14.133/2021, o qual veda, expressamente, a aquisição de bens de consumo de luxo, além de infringência ao princípio da razoabilidade, conforme prevê a Constituição”. Ainda segundo ele, no município a proibição de compra de bens considerados de luxo está disciplinada no Decreto Municipal nº 2.803/2022. “No caso da referida compra, não resta a menor dúvida que o veículo, objeto de aquisição, tem opulência, ostentação, forte apelo estético e requinte”, ressalta Vinícius Chaves.
Para o promotor, “embora existentes tantos outros modelos no mercado que pudessem atender as reais necessidades de um veículo com utilização em estradas de terra e vicinais, qual a real necessidade do prefeito adquirir, por meio da pessoa jurídica de direito público interno, dois automóveis com atributos de motor de 250 cv, seis cilindros, com diversos acessórios caríssimos? Trata-se de uma verdadeira extravagância com o dinheiro público, ainda mais quando a população de Alto Rio Doce, paradoxalmente, é transportada para os municípios pactuados na área da saúde em veículos muito mais simples e, quando pouco, sem o menor conforto e dignidade”.
O MPMG também afirma que o procedimento licitatório, realizado na modalidade pregão, tentou justificar a aquisição de caminhonete para o gabinete com base em necessidade e interesse público. Além disso, o órgão relata que, após a entrega do veículo ao patrimônio municipal, o prefeito determinou a instalação de placas de “estacionamento privativo” em uma das laterais da praça Doutor Miguel Batista Vieira. Segundo o MPMG, a área pública teria passado a ser utilizada de forma exclusiva pelo chefe do Executivo para estacionar o veículo.
Nota da Prefeitura de Alto Rio Doce:
“A Prefeitura de Alto Rio Doce reafirma que o veículo Ford Ranger é patrimônio público, adquirido pela administração municipal por meio de processo licitatório aberto, transparente e competitivo, conforme determina a Lei nº 14.133/2021. O veículo é de uso exclusivo da Prefeitura, não pertence ao Prefeito, e foi adquirido para atender às necessidades operacionais do município, que conta com mais de 1.000 km de estradas de terra, topografia desafiadora e comunidades rurais distantes.
O automóvel serve como ferramenta de trabalho, não como símbolo de luxo. Em um município de grande extensão territorial, com condições climáticas e geográficas adversas, é essencial dispor de um veículo robusto, seguro e com tração 4×4, capaz de permitir o deslocamento técnico para fiscalizações, visitas a obras, atendimento a emergências e apoio às famílias rurais — garantindo a presença do poder público em todos os cantos de Alto Rio Doce.
A Prefeitura respeita a decisão judicial que determinou o sequestro provisório do veículo, mas reitera que cabe recurso e que serão apresentados todos os documentos que comprovam a legalidade e necessidade da aquisição, já disponíveis no Portal da Transparência. A gestão sempre atuou com responsabilidade e compromisso absoluto com o interesse público.
Reafirmamos nossa confiança na Justiça e seguiremos firmes, com serenidade e transparência, certos de que a verdade prevalecerá”.
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