Ceticismo das ruas
Maioria dos brasileiros ainda não acredita que a intolerância entre os cidadãos vai diminuir em 2023
Pesquisa do Instituto Ipsos, publicada no jornal “O Estado de São Paulo”, revela que somente três em cada dez brasileiros dizem acreditar que a tolerância entre os cidadãos aumentará em 2023. “A percepção negativa está atrelada ao cenário de polarização política, que não mostra sinais de arrefecimento”, diz o jornal.
Não há surpresa nos números, sobretudo por refletirem uma situação global. Levantamento semelhante, realizado no fim do ano passado em 36 países para captar os sentimentos para este ano e divulgados no início de 2023, indica que a média global de percepção de tolerância é de 34%, considerada baixa. É o mesmo índice do Brasil.
Um mundo conectado produz situações semelhantes em vários países, bastando avaliar o que aconteceu recentemente nos Estados Unidos e aqui no Brasil. O ex-presidente Bolsonaro teve posturas semelhantes às do ex-presidente Donald Trump e a reação de seus seguidores também se replicou, quando o Capitólio – sede do Congresso dos EUA – e a Praça dos Três Poderes – com sedes do Executivo, Legislativo e Judiciário – foram nvadidos.
Assim como as ações, as reações também seguem a mesma trilha. Quando somente três em dez brasileiros acreditam numa pacificação, a maioria ainda está com um pé atrás, a despeito de todos os esforços para uma retomada das relações democráticas entre os adversários.
Os fatos, no entanto, não contribuem. O 8 de janeiro ainda está muito próximo e os dois lados, especialmente nos parlamentos, continuam sua queda de braço. O discurso do deputado Níkolas Ferreira (PL) no Dia Internacional da Mulher foi um absurdo, sobretudo por conta do preconceito explícito que exibiu. Vai, agora, se submeter à pressão dos adversários, o que, mesmo indiretamente, é mais uma fonte de enfrentamento.
A temperatura tende a se manter alta já por conta das eleições do ano que vem. Embora falte mais de um ano e meio para o pleito municipal, os partidos já se preparam para a guerra e traçam estratégias que vão além dos palanques. O caso das joias envolvendo o ex-presidente Bolsonaro será utilizado nas redes sociais. Sua defesa, à base de contra-ataques também vai para o mundo digital.
Mas se na política ainda há tensão, a sociedade terá que fazer o seu papel, refazendo pontes que foram derrubadas durante a fase mais aguda da disputa. A aproximação deve começar dentro das próprias famílias, por não fazer sentido rompimentos em nome de terceiros. Na recente abertura do segundo andar do Museu Mariano Procópio, o presidente Conselho dos Amigos do Museu, Carlos Eduardo Paleta Guedes, falou ser o momento para implementação da “amizade política”, que implica em um mínimo de civilidade nas relações.
Durante sua fala, no mesmo evento, a prefeita Margarida Salomão endossou o pedido e deu o exemplo. Chamou para o seu lado a senhora Vera Mello Reis, esposa do falecido ex-prefeito Mello Reis. Mais do que isso, elogiou o trabalho do antecessor, que também dirigiu o Museu. Adversários são um dado da política. Inimigos, não.