Hospital de Toxicômanos deve abrir quase 100 vagas para presídio

Medida deve ocorrer após a transferência de presos psiquiátricos para unidade de Barbacena


Por Marcos Araújo

15/02/2019 às 21h33- Atualizada 16/02/2019 às 10h38

hospital toxicomano by fernando
O Hospital de Toxicômanos está localizado no complexo prisional de Juiz de Fora, no Bairro Linhares, junto à Penitenciária José Edson Cavalieri (Foto: Fernando Priamo)

O Hospital de Toxicômanos Padre Wilson Vale da Costa, localizado dentro do complexo prisional em Juiz Fora, junto à Penitenciária José Edson Cavalieri (Pjec), no Bairro Linhares, Zona Leste, foi interditado há cerca de dois anos e pode ser transformado em um presídio comum. Funcionários da unidade temem que essa alteração represente um retrocesso para o sistema carcerário. Todavia, para a Justiça e o Governo de Minas, a medida pode impactar de forma positiva a superlotação nas unidades prisionais da cidade.

O hospital, com mais de 20 anos de funcionamento, é tido como referência no atendimento, tratamento e elaboração de laudos para custodiados no sistema penitenciário. Ao longo de sua existência, cumpriu papel de auxiliar o sistema penal do estado, assegurando cumprimento de medida de segurança a quem necessita de tratamento.

“A unidade oferta ao estado uma válvula de escape para a “panela de pressão” que se chama sistema penitenciário. Desde a sua interdição, há um movimento enorme para que se transforme o hospital em presídio comum, que seja apenas um anexo à penitenciária de forma a não mais prestar seus valorosos serviços à sociedade, mas simplesmente trancafiar sentenciados”, afirma um servidor, que prefere não se identificar por medo de represálias.

O trabalhador pontua que a estrutura física de unidade não é apropriada para abrigar um presídio comum, uma vez que foi pensada para receber presos psiquiátricos, ou seja, inimputáveis. “A obra necessária para transformá-la em cadeia comum é mais dispendiosa do que as reformas necessárias para a adequação solicitada para a desinterdição”, argumenta, acrescentando que, para a desinterdição, seria necessário algumas adequações físicas à estrutura, além de contratação de alguns profissionais da área de saúde e farmacêuticos, por exemplo.

Mudança pode impactar superlotação

De acordo com o juiz titular da Vara de Execuções Criminais, Evaldo Gavazza, houve entendimento das vigilâncias sanitárias estadual e municipal, além do Ministério Público, por meio de sua coordenadoria de saúde, que o Hospital de Toxicômanos não tinha condições de abrigar pessoas em sofrimento mental envolvidas em crimes para cumprimento de medida de segurança. “Este não é o posicionamento da Vara de Execuções Penais, mas temos que seguir a determinação do Tribunal de Justiça, que entendeu pela interdição e pelo impedimento de internação no local até que fossem feitas as adequações, que são referentes a recursos humanos e materiais, e que o estado, com a atual crise, não tem como cumprir.”

Ainda conforme Gavazza, há um hospital semelhante em Barbacena, para onde devem ser transferidas as cerca de dez pessoas que atualmente se encontram no Toxicômanos, que será transformado em um presídio comum a fim de contornar a superlotação carcerária nas outras unidades prisionais da cidade. “Temos pessoas doentes, idosos e pessoas com envolvimento em delitos menores que podem ser transferidos para as instalações do hospital, para que sejam retirados da carceragem normal”, afirma o juiz.

Ele concorda que é inconcebível que o Ceresp e a penitenciária Ariosvaldo Campos Pires se mantenham com suas capacidades acima do suportável, enquanto que no Toxicômanos, com capacidade para 97 pessoas, permaneça apenas com dez.

Segundo Gavazza, a Secretaria de Estado de Administração Prisional (Seap) assinou compromisso, na gestão passada, para a realização da transferência para Barbacena. “Faltam apenas a alteração por decreto da destinação da unidade e realizar a transferência”, explica o juiz, acrescentando que os servidores do Toxicômanos terão os seus postos mantidos em outros estabelecimentos. “Hoje as unidades prisionais têm carência de material humano. Lógico que haverá algumas adequações, pois, por exemplo, não precisaremos de um médico psiquiatra no local quando for transformado em presídio comum. Assim, ele deverá ser transferido para ser melhor aproveitado.”

O titular da Vara de Execuções Criminais ainda ressalta que, enquanto os servidores das penitenciárias e do Ceresp trabalham em condições estressantes, o servidor que atua no hospital monitora dez internos. Ele também afirmou que, certamente, em razão da interdição, atualmente, há no Ceresp pessoas que receberam medidas de segurança. “Elas estão misturadas com os presos normais, o que representa prejuízo para o cumprimento da medida. “Essa situação será resolvida com a liberação da transferência para Barbacena, que tem instalações adequadas para isso. É uma decisão do Tribunal a qual temos que seguir.”

Arquivamento do procedimento investigatório

O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) esclareceu à Tribuna que a interdição do hospital se deu na esfera administrativa, já que foi interditado pelas vigilâncias sanitárias municipal e estadual. Nesse contexto, o MPMG instaurou inquérito civil para acompanhar o caso e garantir o não encaminhamento de pacientes ao Hospital de Toxicômanos até que fossem feitas as correções preconizadas pelos órgãos sanitários.

Todavia, posteriormente, como ressaltou o MPMG, a Secretaria de Estado de Administração Prisional (Seap) informou que, em virtude da decretação de calamidade financeira, o estado não possuía condições de promover a adequação do hospital, relativamente às condições sanitárias, de acessibilidade e de prevenção contra incêndio e pânico.

Assim, a mesma Secretaria informou a necessidade de mudança da destinação do hospital, transformando-o em anexo da Penitenciária Ariosvaldo Campos Pires. Diante da decisão do estado de transformar o Hospital de Toxicômanos em unidade prisional comum, o MPMG promoveu o arquivamento do procedimento investigatório.

Desinstitucionalização

A Secretaria de Estado de Administração Prisional (Seap) informou que houve, por parte da Promotoria de Justiça da Saúde, a instauração de inquérito civil público para não encaminhamento de novos pacientes ao Hospital de Toxicômanos, interditando-o cautelarmente até que fossem regularizadas as pendências de inadequações organizacionais e operacionais constatadas pelos órgãos sanitários, inviabilizando a liberação do alvará sanitário de funcionamento do hospital.

Segundo a Seap, a pasta não mediu esforços para a adequação das irregularidades constatadas pela Vigilância Sanitária, porém, a situação financeira do Estado e a dificuldade para adequação do quadro de profissionais inviabilizaram o processo de reforma e adequação física e operacional da unidade. Esclareceu, ainda, que, conforme reunião ocorrida em Juiz de Fora, em setembro de 2018, com representantes da Seap, do Tribunal de Justiça, do Ministério Público e da Defensoria Pública, foi decidido em comum acordo a extinção do hospital, criando-se uma unidade para recebimento de presos idosos, doentes e cadeirantes e também para realização de exames periciais ambulatoriais.

A pasta também informou que o Toxicômanos dispunha de aproximadamente 90 leitos, atendendo pacientes de cunho pericial de internação e ambulatorial, assim como tratamentos psiquiátricos temporários. Os pacientes que lá se encontravam, em sua maioria, já foram desinstitucionalizados por alta médica e/ou término do exame pericial ao qual se destinavam. Com a publicação da Política Nacional de Atenção Integral a Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade (PNAISP), os atendimentos aos presos/pacientes, conforme menciona tal política, devem ser referenciados à rede de saúde do município de abrangência da unidade prisional, através dos CAPS e CAPS-AD, prezando pela manutenção do vínculo deste na rede de tratamento.

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