Grupo faz campanha contra assédio na folia e propõe projeto de lei
Movimento Nenhuma Mulher a Menos realiza ato neste sábado e quer apresentar proposta para Município adotar protocolo de segurança
Campanhas contra assédio sexual são frequentes neste período carnavalesco, mas esse tipo de violência faz vítimas o ano inteiro. Pensando nisso, o movimento “Nenhuma Mulher a Menos” estará no Parque Halfeld neste sábado (11) para conscientizar os foliões nos blocos sobre o tema, inclusive sobre a lei de importunação sexual, e também para divulgar e colher assinaturas para o projeto de lei “Não se calem”.
A proposta será apresentada à Prefeitura de Juiz de Fora (PJF), para que o Município adote um protocolo de segurança para mulheres nos bares e nas casas noturnas. O objetivo é que os funcionários desses estabelecimentos estejam preparados para evitar e identificar situações envolvendo algum tipo de violência sexual ou de gênero e, assim, poderem amparar as vítimas, mediante acolhimento e orientação sobre os procedimentos necessários em busca da punição de agressores. O tema ganhou força com a recente denúncia de estupro contra o jogador de futebol Daniel Alves, de 39 anos, na Espanha, onde essa regulamentação garantiu agilidade e eficiência no andamento do caso.
A advogada e ativista Débora Lovisi conta que o projeto de lei deve seguir os moldes do protocolo da Espanha, considerado bem completo. Além de alertar para o assédio no carnaval, a ideia do ato no Parque Halfeld visa a conseguir visibilidade para a causa. “Queremos apresentar uma solução, que não é só para aquele momento de festa, é para ser uma mudança de paradigma e de cultura.” Débora é representante juiz-forana do “Nenhuma Mulher a Menos”, fundado em Divinópolis, em 2020, pela ativista pelos direitos das mulheres Laiz Soares, depois de um caso de feminicídio chocar a cidade.
Segundo a advogada, no Brasil acontece um estupro a cada dez minutos e 99% dos casos ficariam impunes. Diante dessa realidade, ela vislumbra o regulamento proposto como uma forma de coibir esses crimes ou de, ao menos, garantir que a vítima seja amparada e orientada sobre os procedimentos jurídicos e de saúde aos quais tem direito. “O movimento luta não só pela conscientização social, mas para medidas ativas de combate à violência.”
Caso Daniel Alves
Uma mulher, 23, que não se identificou publicamente e deixou claro não querer os holofotes para si, mas para a causa, afirmou ter sido estuprada pelo futebolista Daniel Alves, no fim de 2022, no banheiro de uma casa noturna em Barcelona. Menos de um mês depois do início das investigações, Alves teve a prisão preventiva decretada. Grande parte do êxito no andamento da denúncia foi atribuída ao protocolo de segurança contra violência sexual e de gênero, denominado “No Callem” adotado por bares e casas noturnas da Espanha. A iniciativa tem inspirado projetos de lei semelhantes no Brasil, tanto nas esferas municipais e estaduais, quanto a nível nacional. Com a medida, em geral, os estabelecimentos já encaminhariam o registro da ocorrência policial, acelerando o processo e encorajando as vítimas, acolhidas e conduzidas a serviços de saúde, quando necessário. As empresas também contribuiriam para o esclarecimento dos casos, fornecendo imagens de circuitos de segurança.
“A partir da repercussão internacional da notícia, tomamos conhecimento de uma lei que funciona e que pode ser aplicada de forma bastante eficaz. O grupo Mulheres, do qual também faz parte a fundadora do Nenhuma a Menos, se juntou e dividiu os custos para fazer uma tradução juramentada desse protocolo e, a partir daí, foi desenvolvido um projeto de lei, já apresentado em São Paulo”, conta Débora. Mesmo com a possibilidade de uma política pública federal, o grupo defende a regulamentação de lei municipal o quanto antes, como “uma parceria entre o setores público e privado e a sociedade no combate à violência contra a mulher”. “Os estabelecimentos que adotarem o protocolo ganham um selo de certificação e isso estimula, inclusive, o comércio e garante o engajamento espontâneo dos cidadãos na pauta. Queremos que a cidade seja um lugar seguro para tantos jovens que curtem festas, bares, eventos e shows para, a partir disso, mudar a mentalidade das novas gerações e evoluir como sociedade”, avalia a ativista.
O link para assinatura em apoio à proposta está disponível nos seguintes perfis no Instagram: @nenhumamulheramenos e @deboralovisimg.
Importunação sexual no carnaval
De acordo com a advogada Débora Lovisi, durante o carnaval os casos de assédio sexual aumentam cerca de 20%. “Isso é reflexo da cultura e da sociedade patriarcal em que vivemos, que parece conceder um salvo-conduto para a prática desses atos durante o período de folia. A sensação que temos é a de que, no carnaval, tudo é permitido, e quem tá ali pulando, brincando, se divertindo, é porque topa tudo”, observa.
Débora lembra que, antes da lei de importunação sexual, de 2018, “as famosas apalpadas, passadas de mão, beijos roubados, que são chamados legalmente de atos libidinosos, eram considerados mera contravenção penal – a importunação ofensiva ao pudor -, insuficiente para gerar nas pessoas o temor da punição.” Já com a norma, essas ações praticadas sem consentimento passaram a ser consideradas crimes, punidos com pena de reclusão de um a cinco anos. “Caso o ato libidinoso seja cometido através de violência ou grave ameaça, ele vai se enquadrar como crime de estupro, punido com penas muitos mais altas”, ressalta a advogada, citando o slogan “não é não”, que deu visibilidade à lei.
A delegada da Especializada de Atendimento à Mulher (Deam), Carolina Gonçalves, reforça a importância da conscientização sobre condutas que caracterizam assédio contra as mulheres, sobretudo nas festividades de Momo. “Carnaval bom é aquele curtido com respeito. O corpo da mulher não é disponível aos desejos masculinos. O folião deve respeitar o não de uma mulher: sexo sem consentimento é estupro; beijo forçado, passadas de mão e puxões de cabelo constituem crimes e devem ser denunciados.” A delegada orienta possíveis vítimas a procurarem o posto da PM mais próximo, a própria Deam ou fazer a denúncia pelo 180.