Seguidores têm direito de processar influencer em caso de propaganda enganosa
Código de Defesa do Consumidor entende influenciadores digitais como integrantes da relação de consumo
Se, antigamente, pedíamos indicação de livros, produtos de beleza ou destinos turísticos aos nossos amigos, hoje esse papel costuma ser de outra pessoa: do influenciador digital. O nome por si só já diz muito: o objetivo principal dele é convencer a comprar, seja um produto ou uma ideia. Perfis com milhões de seguidores se tornaram outdoor disputado no processo de expansão da propaganda na internet. E o consumidor, como ficam os direitos dele nessa dinâmica?
Por mais que possam parecer “terra sem lei”, os setores jurídicos das marcas, assim como as próprias administradoras das redes sociais, têm se mobilizado para garantir proteção ao consumidor e estabelecer deveres aos influenciadores. Afinal, se um usuário se sentir vítima de propaganda enganosa na internet, o Código de Defesa do Consumidor permite que ele processe o influenciador que veiculou a publicidade. Pelo código, a pessoa paga para fazer propaganda na rede social é considerada fornecedora por equiparação. Dessa maneira, ela se torna parte da relação jurídica de consumo, uma vez que serviu como intermediária.
Na prática, o que isso significa? Exemplificando uma situação: um influenciador recebe uma quantia para fazer a propaganda de um sapato que se diz adequado para pessoas com joanete. Um seguidor consome a propaganda e compra o produto. Ele não se sente satisfeito e diz que a anatomia do sapato não favoreceu seu problema ortopédico. O consumidor pode processar o influenciador por propaganda enganosa. É o que explica a consultora jurídica, Francianne Paula. “Nesse caso, o direito do consumidor é total. Primeiro porque o influenciador foi contratado para fazer a propaganda e fica entendido que ele testou a marca. Foi uma publicidade contratada, assim como em qualquer outro veículo, rádio, TV ou mídia imprensa. Ele foi pago para influenciar os seguidores a confiar na marca.”
A pessoa que está fazendo propaganda não vai ter a responsabilidade pelos defeitos de fabricação do produto, que são atribuições da marca, mas será incumbido por assumir a posição de garantidor do serviço. A diferença, segundo Francianne, é que o influenciador responde diretamente ao Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) e não à Agência de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon). Na prática, ambos os órgãos atuam na regulamentação das propagandas na internet, mas o Conar não tem poder punitivo, não pode aplicar multas, exigir reembolso de valores e substituir mercadorias, pois seu foco é dar recomendações aos anunciantes. “O Conar pode atuar quando um influenciador não coloca as hashtags de feitos exigidas pelo órgão em uma publicidade, como #publi ou #parceria. Isso pode ser denunciado, pois é uma regra que todo conteúdo pago seja sinalizado ao seguidor, para não induzir a erro.”
Influencer pode buscar proteção jurídica
Atualmente, muitos influenciadores optam por intermediar os contratos de propaganda através de uma agência. Gigi Grandin, especialista em marketing de influência e co-criadora da Grapa digital, afirma que essa decisão é importante para proteger o bem mais importante do influenciador, sua imagem. Ela conta que algumas medidas precisam ser tomadas para que o profissional não caia em golpes e, consequentemente, os transmita ao seu público. “A gente tem um formulário e só assinamos com pessoa jurídica. Pedimos todos os dados, desde o CNPJ, até o endereço, tudo para analisarmos se a empresa realmente é idônea.”
Gigi explica que, mais do que simples garotos propaganda, os influencers atuam também como veículos para a mídia. “O canal em que está sendo veiculada a propaganda é dele. Então fica um pouco injusto, pois, quando comparamos com as propagandas na TV, por exemplo, ninguém processa um canal de televisão por uma propaganda enganosa que está circulando lá. Eles vão direto na marca.”
A advogada Francianne Paula avalia que, devido à dinâmica de consumo, o influenciador fica mais frágil se comparado a uma loja ou a um veículo de comunicação. “Na rede social todo mundo quer ser dono de todo mundo, quer cuidar da vida de todo mundo e, como está a um clique de seu dedo, as pessoas querem ganhar dinheiro fácil também. É muito mais fácil ter acesso ao influenciador do que fazer a reclamação com a própria marca”, explica. Ter um contrato seguro, com cláusulas que protejam o influenciador, para Gigi, é o principal passo para se proteger em um ambiente no qual tentativas de golpe surgem em toda parte.