Chapéu D’Uvas, enfim, como planejado
O rodízio no abastecimento de água ainda é um trauma recente entre os juiz-foranos, que foram submetidos a esta medida durante mais de um ano, entre outubro de 2014 e janeiro de 2016, enquanto se manteve a crise hídrica na região Sudeste do país por causa da escassez de chuvas. Porém, a solução apresentada na época, para evitar desabastecimento e outras consequências mais graves, dificilmente voltará a se repetir em curto prazo. Depois deste período, agora é possível utilizar o manancial Chapéu D’Uvas em sua carga máxima prevista. É como se, de um dia para o outro, o município tivesse ganhado 11 novas represas João Penido, até então, o principal lago de armazenamento de água do município. Isso é possível devido à inauguração de um braço da adutora Chapéu D’Uvas, que permite a chegada de suas águas até a Estação de Tratamento Marechal Castelo Branco, na Remonta, Zona Norte. Mas até atingir este patamar, muitos transtornos precisaram ser vencidos, que resultaram em gastos de recursos públicos, aumento da tarifa de água e embates judiciais.
A Represa de Chapéu D’Uvas começou a ser construída na década de 1950, a partir de desapropriações de áreas rurais habitadas pertencentes aos municípios de Ewbank da Câmara, Santos Dumont e Antônio Carlos. Na época, a ideia era regular o nível do Rio Paraibuna, de forma que a vazão pudesse ser estancada em casos de períodos de chuvas constantes, com objetivo de evitar enchentes em Juiz de Fora. Com o espelho d’água de 313 quilômetros quadrados, o lago começou a ser preparado na década de 1990, para, no futuro, servir ao abastecimento público da cidade, através da construção de uma adutora. Esta tubulação foi feita para transportar o recurso até Juiz de Fora, na Estação de Tratamento de Água (ETA) Walfrido Machado Mendonça, conhecida como ETA-CDI, no Distrito Industrial, Zona Norte.
Racionamento com água de sobra
Em meio à grave crise hídrica encerrada no final de 2015, a cidade viveu uma contradição: João Penido correu risco de secar, atingindo o menor nível da sua história, a Represa de São Pedro chegou a nível zero de acumulação e Chapéu D’Uvas tinha água abundante, embora não fosse possível captá-la para tratamento. Isso porque a ETA-CDI, que já recebia as águas do Ribeirão Espírito Santo, que é um manancial de passagem, foi reformada, ao custo de R$ 10 milhões, para atender os recursos do novo manancial. Mas a obra, já nos primeiros testes de operação, apresentou graves problemas estruturais, até então não resolvidos. Na prática, significava que, dos quase 800 litros de água por segundo autorizados para captar de Chapéu D’Uvas, a companhia só conseguia receber 280 litros por segundo.
Diante deste cenário, a Cesama colocou em prática outro plano, que era uma manobra na adutora recém-construída para que o recurso fosse transportado, também, para a ETA Marechal Castelo Branco, que fica em João Penido. Por questões ambientais, a água de Chapéu D’Uvas não é jogada direto no lago de João Penido.
Para custear esta intervenção, inaugurada na semana passada, a Cesama aumentou o valor da tarifa de água temporariamente para arrecadar o dinheiro previsto. A construção custou R$ 8,5 milhões. Ao mesmo tempo, cobra na Justiça, da empresa responsável pela ampliação da ETA-CDI, a recuperação do terreno e a devolução de recursos gastos em obras emergenciais, que não surtiram os efeitos desejados.
João Penido pode ser preservada na estiagem
O manancial João Penido, embora grande, sofre considerável variabilidade do seu nível de acumulação ao longo de 12 meses. No período chuvoso, chega a ficar com mais de 90% de sua capacidade cheia, mas na estiagem, declina, em anos de chuvas dentro da média, para até cerca de 50% ou menos. Em plena crise hídrica de 2014, chegou a atingir 18%. Agora, com Chapéu D’Uvas, espera-se uma diferença menor, permitindo mais segurança ao sistema.
De acordo com a Cesama, Juiz de Fora precisa tratar, em média, aproximadamente 1.500 litros de água por segundo para não haver desabastecimento. Só a Estação de Tratamento Walfrido Machado Mendonça (ETA-CDI) consegue atender demanda de até 710 litros por segundo atualmente, enquanto que a ETA Marechal Castelo Branco, em João Penido, mais 700 litros. A diferença necessária, de cerca de 100 litros, é absorvida pela ETA da Represa São Pedro. Com o braço desta adutora, apenas Chapéu D’Uvas consegue fornecer 780 litros de água por segundo ao sistema, e outros 430 podem vir do Ribeirão Espírito Santo, que é um manancial de passagem. Na prática, isso significa, portanto, menor dependência das águas de João Penido.
Conforme o diretor-presidente da Cesama, André Borges de Souza, todas as manobras possíveis vão garantir segurança ao abastecimento. “Tínhamos três questões para resolver, que era o transporte, a captação e o tratamento das águas. O transporte foi resolvido em 2014, com a instalação de um booster (bomba) que possibilitou a água, tratada na Zona Norte, chegar a outras regiões da cidade sem gargalos. Depois a gente precisava trabalhar na captação, porque a água de Chapéu D’Uvas precisava chegar em Juiz de Fora. Esta meta foi resolvida com a adutora que ligava à ETA-CDI, mas aí tivemos o problema naquela obra de ampliação, hoje ajuizada. Desde a concepção do projeto de Chapéu D’Uvas existia a possibilidade de fazer a interligação, também, com a ETA em João Penido. Conseguimos a viabilidade financeira e fizemos esta construção, que agora permite uma interligação dos mananciais com as principais estações de tratamento do município” explicou.
Mesmo assim, Borges é cauteloso: “Não gosto de dizer que estamos livres do racionamento. Mas posso afirmar que agora o nosso sistema é muito mais seguro do que há quatro anos. Se uma crise como aquela (de 2014 e 2015) ocorresse agora, a gente poderia preservar João Penido muito mais, e as consequências para a população seriam muito menores.”
Prefeito enfatiza segurança no sistema
O prefeito Bruno Siqueira (PMDB) reafirma a questão da tranquilidade no sistema de abastecimento de água em Juiz de Fora a partir do uso maior de Chapéu D’Uvas. Segundo ele, sua importância será ainda mais evidente, em períodos de estiagens severas e prolongadas. “Agora podemos tirar menos água de João Penido e usar mais de Chapéu D’Uvas, que é muito maior. Neste sentido, vamos conseguir preservar os nossos reservatórios.”
O chefe do Executivo também foi questionado do fato de Chapéu D’Uvas estar fora dos limites territoriais de Juiz de Fora e da necessidade de preservar não apenas a represa como também toda a sua bacia de contribuição. Segundo ele, a Prefeitura está aberta ao diálogo com os outros municípios envolvidos, que são Santos Dumont, Ewbank da Câmara e Antônio Carlos. Mesmo assim, ele afirmou que, apesar de as leis de proteção do município não terem jurisdição nestas cidades, outras, do Estado e da União, cumprem este papel. “A fiscalização da represa pode ser feita pela Secretaria do Meio Ambiente.”