Mortes por arma de fogo aumentam em JF em 2022
Até novembro do último ano, 50 pessoas foram assassinadas a tiros na cidade; números superam os dos três anos anteriores
Os episódios de violência registrados em Juiz de Fora nos últimos meses mostram seus efeitos sobre os números de mortes causadas por arma de fogo na cidade. Segundo a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp-MG), o município teve 50 homicídios registrados entre janeiro e novembro de 2022 em que o meio utilizado para o assassinato foram as armas. O dado chama a atenção porque, mesmo ainda faltando um mês para contabilizar o total de crimes do tipo ao longo do último ano, os dados representam o maior quantitativo de mortes por armas de fogo desde 2018.
Os números da Sejusp apontam crescimento de 78,5% no total de crimes contra a vida utilizando armas se comparado aos dados coletados entre janeiro e novembro de 2021, quando 28 pessoas foram vitimadas em Juiz de Fora. Na comparação dos dados dos 11 primeiros meses do último ano em relação ao consolidado dos anos anteriores, ainda fica evidente a alta: foram 33 óbitos em 2021; 37 em 2020; e 40 em 2019. Em 2018, a cidade teve 61 assassinatos por arma de fogo e superou os números parciais do último ano.
Outro fator que chama a atenção é que o movimento de alta percebido em Juiz de Fora não é refletido nos números de todo o estado. Os dados referentes ao período compreendido entre janeiro e novembro de 2021 e 2022 em Minas Gerais são, respectivamente, 1.395 e 1.524. Ou seja, houve aumento de 9,24% de um ano para o outro, distante dos 78% de crescimento nos registros juiz-foranos.
O crescimento já era perceptível antes mesmo do fim do ano passado, de modo que a prefeita Margarida Salomão (PT) tratou do assunto em entrevista à Rádio Transamérica JF em dezembro último. Na ocasião, ela anunciou que teria uma reunião com as polícias Civil e Militar logo na primeira semana de janeiro, mas considerou primária a responsabilidade do Governo de Minas Gerais. “A Guarda Municipal tem dado apoio e trabalhado na área da inteligência e prevenção. Mas, efetivamente, os problemas requerem um entrosamento e uma determinação do Estado de Minas em cuidar disso da melhor maneira possível”.
A Tribuna entrou em contato com a Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) na última semana e questionou sobre quais atitudes o Executivo planeja para colaborar na coibição da prática criminosa na cidade. No entanto, não houve resposta.
‘Não tem nada fora do controle’, garante delegado
Os casos de violência chamaram a atenção em Juiz de Fora sobretudo nos últimos meses de 2022. Em dezembro, a Tribuna mostrou que a cidade teve média de um homicídio a cada dois dias em novembro. Os 17 crimes contra a vida registrados no penúltimo mês do ano passado representaram 325% de aumento em relação aos quatro registros do mesmo mês em 2021.
O crescimento no número de assassinatos em novembro coincidiu com o fim da Delegacia Especializada de Homicídios, comunicado em outubro pela Polícia Civil. Não existe, no entanto, relação direta entre a alta dos homicídios e o encerramento da especializada. Ao menos é o que apontam as análises da própria corporação, segundo o delegado regional Márcio Roberto Savino Lopes. “O crescimento (dos homicídios) começou no início do segundo semestre, e as especializadas foram reformuladas em outubro, dois ou três meses depois”, argumenta.
De acordo com o delegado, a Polícia Civil realiza acompanhamento contínuo dos dados da violência armada na cidade. A avaliação da corporação é que fatores sazonais podem ter levado à onda de violência observada no fim do ano passado, algo que já foi percebido em outros municípios, segundo Lopes. “São questões sazonais que estamos plenamente preparados (para enfrentar). Juiz de Fora não tem nada que esteja fora do controle das instituições de segurança pública”, garante o titular da 1ª Delegacia Regional de Polícia Civil de Juiz de Fora.
Com o encerramento da Delegacia Especializada de Homicídios, as investigações de assassinatos foram distribuídas para sete delegacias, além do Grupo de Respostas Rápidas. O modelo adotado ao longo dos últimos meses conta com a aprovação de Lopes. “Os resultados têm sido muito positivos. Hoje, o Grupo de Respostas Rápidas acompanha os locais de homicídios e tem feito uma investigação mais ampla, porque não queremos apenas os executores, mas também queremos os mandantes.”
Crimes têm mudado de perfil, diz pesquisador
Para o professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) Paulo Fraga, o crescimento nos números de mortes por arma de fogo passa por uma mudança no perfil de mortalidade por homicídio percebida nos últimos meses. O integrante do Núcleo de Estudos Sobre Política de Drogas, Violências e Direitos Humanos (NEVIDH) avalia que, ao contrário do que era regra anteriormente, têm ocorrido muitas execuções. “Juiz de Fora tinha um perfil de mortalidade por homicídio relacionado a rixas entre grupos específicos, como bairros. Não existia muita disputa por ponto de tráfico de drogas. Agora, temos tido eliminações”, avalia.
Fraga recorda que Juiz de Fora tinha como característica baixas taxas de mortalidade por homicídio no início dos anos 2000. Essa situação foi mantida até a segunda década do atual século, segundo o pesquisador, quando a cidade entrou em uma escalada de violência que alcançou o auge em 2016. Naquele ano, os órgãos de segurança registraram 106 assassinatos com arma de fogo, o maior número até então. Ainda que tenha havido queda sensível, a cidade manteve patamar considerado alto de homicídios em 2017 e 2018 – com 96 e 61 registros, respectivamente -, antes de ver os dados apresentarem viés de queda, assim como foi visto a níveis estadual e nacional, a partir de 2019.
Uma das hipóteses apontadas pelo pesquisador para o recente aumento de mortes por arma de fogo é a vinda de criminosos de outros estados para Juiz de Fora, mas essa possibilidade ainda carece de estudos aprofundados, segundo o próprio professor. Fraga ainda indica que o encerramento da Delegacia Especializada de Homicídios da Polícia Civil não tem relação direta com o atual momento da segurança pública juiz-forana, mas que, por outro lado, o término também não impacta positivamente. “Uma delegacia que não está funcionando bem pode ser melhorada, mas eliminar justamente no momento em que há aumento (de homicídios) não é uma boa ideia.”