Mulher morta já tinha sido alvo da violência doméstica


Por Sandra Zanella

26/06/2015 às 18h07

A Delegacia Especializada de Homicídios está investigando o assassinato de Verônica da Silveira Peregrino, 38 anos, encontrada morta dentro de casa, com duas facadas nas costas, na noite de quinta-feira (25), no Condomínio Neo Residencial, no Bairro Parque Serra D’Água, na Cidade Alta. O principal suspeito, de acordo com o delegado Carlos Eduardo Rodrigues, é o marido da vítima, um porteiro, 42, que deixou a residência no Fiat Palio de Verônica, provavelmente levando roupas e pertences pessoais.

Por se tratar de possível feminicídio, a Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher realizou levantamentos em nome dos envolvidos e localizou pelo menos três ocorrências, as quais demonstram que o casal tinha um relacionamento conturbado. O último registro, em 2012, foi o único que teve desdobramentos, resultando em inquérito. A Justiça chegou a conceder as medidas protetivas previstas na Lei Maria da Penha à vítima, mas, segundo a delegada Ione Barbosa, Verônica, que na época estaria separada do companheiro, não quis representar criminalmente contra ele.

“As medidas protetivas (como o afastamento do homem em relação à vítima) perderam o efeito a partir do momento em que ela voltou a morar com ele”, explicou a policial. Segundo Ione, na ocorrência de 2012, Verônica relata que era constantemente ameaçada pelo companheiro, porque ele não estaria aceitando o término do relacionamento e nem o envolvimento dela com outras pessoas. “Por enquanto, só localizamos esse procedimento instaurado. Em outros dois registros de brigas não foram dados prosseguimentos por parte dos envolvidos.” De acordo com a delegada, é recorrente a violência doméstica nos casos em que o homem não aceita o fim da relação, mas, quando a própria vítima retorna para o convívio com o agressor, a polícia e a Justiça ficam de mãos atadas.

O crime

O delegado Carlos Eduardo esteve na cena do crime e disse ter obtido informações de que o casal começou a se relacionar há, aproximadamente, 17 anos, tendo um filho de 5 anos. “Pelo o que apuramos, não conseguimos detectar muito bem os horários em que ocorreram os fatos, mas tudo indica que o homicídio tenha acontecido ainda de manhã.” O delegado acrescentou que câmeras do condomínio devem auxiliar a identificar o momento em que o suspeito deixou o local.

Segundo Carlos Eduardo, a suspeita é mesmo de fuga, porque o homem chegou a esvaziar gavetas e armários. Ele informou que não há vestígios de briga na casa, como objetos quebrados ou revirados. “Vamos ter que aguardar o laudo da necropsia para saber se houve luta corporal ou não. Mas, aparentemente, a vítima não tinha outras lesões, a não ser as facadas.” A hipótese de a mulher ter sido morta dormindo não foi descartada, já que o corpo foi encontrado coberto até quase o ombro, com um colchão aos pés da cama do casal. O sangue, apesar de em grande volume, estava concentrado apenas no colchão e nas roupas dela. “Parece que ela estava deitada quando foi morta, porque não havia mais vestígio de sangue em outras partes, como no piso. Ainda vamos verificar se há marcas de perfuração no pijama que ela usava”, finalizou o delegado. Uma faca suja de sangue, com cerca de 20cm de lâmina, foi apreendida no local.

Conforme o boletim de ocorrência registrado pela Polícia Militar, por volta do meio-dia, o suspeito chegou a ligar para um irmão, dizendo que havia brigado com a esposa e feito uma besteira. Os dois irmãos se encontraram por volta das 13h em frente à escola onde estuda o filho do casal, mas o suspeito, nervoso, não teria especificado o que tinha feito e foi embora no Palio. No fim do dia, quando a Van escolar retornou à casa para deixar o menino, encontrou o imóvel trancado, e a criança foi deixada com uma pessoa, que seria amiga da família, já cadastrada como autorizada.

A PM foi acionada e chegou ao local no início da noite. Os militares entraram pela janela, que estava aberta, e encontraram o corpo. O óbito foi confirmado pelo Samu, e peritos da Polícia Civil realizaram os levantamentos que devem direcionar as investigações. Militares ainda fizeram buscas pelo suspeito, inclusive no local onde ele trabalhava como porteiro, mas o homem não foi localizado. Familiares de Verônica que estavam nesta quinta no IML não quiseram falar sobre o caso.
Primeiro feminicídio após lei entrar em vigor

Se a Polícia Civil apontar o próprio marido como responsável pelo assassinato a facadas de Verônica da Silveira Peregrino, esse será o primeiro caso de feminicídio em Juiz de Fora desde que entrou em vigor no país, em março, a Lei 13.104/2015. A norma altera o artigo 121 do Código Penal e transforma em crime hediondo o assassinato de mulheres no contexto da violência doméstica e familiar ou quando há menosprezo ou discriminação à condição de mulher. Segundo a delegada titular da Especializada de Atendimento à Mulher, Ângela Fellet, enquanto o homicídio simples prevê pena de seis a 12 anos de reclusão, o feminicídio tem pena que varia de 12 a 30 anos.

Ainda conforme Ângela, há mais de um ano e meio não era registrado na cidade assassinato de mulher por motivos passionais, em situação de violência doméstica e familiar. O período coincide com a inauguração da Casa da Mulher, no Jardim Glória, região central. No local, além do trabalho policial, há atendimento multidisciplinar, com psicólogos e assistentes sociais. A delegada orienta que, para a violência não chegar a situações extremas, como a de Verônica, a vítima deve ficar atenta aos primeiros sinais. “Eles costumam começar com ameaças e, quando há uma primeira agressão, é comum acontecer a segunda. A vítima deve vir à delegacia, fazer o registro de ocorrência e pedir as medidas protetivas.” Ela lembrou que vizinhos ou pessoas próximas podem fazer denúncias por meio do 181, do Disque-Denúncia Unificado (DDU).

A Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher fica na Casa da Mulher – Centro de Referência, na Rua Uruguaiana 94, no Bairro Jardim Glória. Informações podem ser obtidas pelo telefone 3690-5559.

 

 

 

 

 

 

 

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