Após uma semana na Praça do Riachuelo, ambulantes divergem quanto a impacto das vendas
Tribuna esteve nas ruas e conversou com camelôs, que apontam organização e segurança no local, mas reivindicam infraestrutura
Uma semana após a transferência dos ambulantes da Avenida Getúlio Vargas para a Praça do Riachuelo, em frente ao Santa Cruz Shopping, no Centro, a opinião dos camelôs a respeito do comércio popular no local é divergente. Ao passo que alguns já contabilizam vantagem no bolso, outros amargam o prejuízo de ainda não ter vendido nenhum item no período. É o caso da ambulante Verônica Batista, 48 anos, que atua há 15 anos no comércio de rua. Até a manhã desta terça-feira (23), quando conversou com a Tribuna, ela afirmou não ter vendido nenhum dos seus produtos após seu ponto ter sido transferido para a praça.
Verônica comercializa artigos como panos de prato e utilidades para a cozinha e trabalhou por cinco anos na Getúlio Vargas. “Lá eu fazia, em média, R$ 100 por dia de trabalho. Trabalhava das 6h às 10h, porque tinha de voltar para casa e cuidar dos filhos. Aqui eu ainda não vendi nada. Não quero nem calcular meu prejuízo”, lamenta. Por outro lado, ela destaca que o comércio popular está mais organizado e a região está sendo mais fiscalizada. “Isso no deixa mais seguros”, afirma. A melhoria na segurança e na organização, inclusive, foram pontos destacados pelos camelôs ouvidos pela reportagem, embora ainda reivindiquem melhores estruturas para viabilizar o trabalho no local.
Em uma semana, a ambulante Lucilene Barbosa, 37, viu melhorias na ordenação e segurança. Entretanto, ela ainda sente falta de clientela. Ouvida pela Tribuna na semana passada, no primeiro dia de vendas no local, ela afirmou que sentiu “um baque muito grande”. Após uma semana, ela narra que a situação “não mudou muita coisa”. Lucilene tem uma barraca de frutas, hortaliças e legumes. Acostumada com o movimento no ponto onde trabalhou por 20 anos, na Getúlio, perto da esquina com a Rua Floriano Peixoto, ela conta que as vendas costumavam render cerca de R$ 250 por dia.
Agora, afirma não fazer nem R$ 50 e não saber se terá dinheiro para pagar os fornecedores das mercadorias perecíveis. “Tem dias que perdemos verduras e temos de jogar fora, infelizmente”. Na avaliação dela, a Prefeitura deveria investir em eventos no local para atrair o público. “Algo semelhante com a feira noturna às quartas, que tem mais atrativos para as pessoas”, sugere.
Já João Pedro da Costa, de 81 anos, “não tem o que reclamar”. Vendedor ambulante há mais de 40 anos, ele manteve sua barraca de mandioca e bananas na Getúlio Vargas por “algumas décadas”. A mudança para a Praça do Riachuelo, porém, não o abalou. “Nesta semana, caiu um pouco, mas é normal, estamos em um processo de mudança. Eu estou vendendo bem, não vou reclamar da sorte, não”, diz.
Instalação de sanitários e tendas é reivindicada
A ambulante Danieli Gonzaga, 35, responsável por uma barraca de artigos para presente, é uma das que observou as vendas aumentarem após o ponto em que trabalha com a mãe ter mudado para a Praça do Riachuelo. “Para nós, teve uma melhora no movimento sim, e as vendas têm saído de forma considerável. Está mais seguro, tendo fiscalização. Acho que está melhor até para a própria população, que consegue comprar com mais calma e tem menos poluição sonora”, avalia. A trabalhadora, contudo, reivindica a instalação de banheiros em melhores condições sanitárias. No local, há quatro banheiros químicos, instalados pela Prefeitura.
“Nós ficamos aqui das 7h às 19h, não temos condições de usar esses banheiros. Como ficam aí, estão sendo utilizados por moradores de rua e tem ficado inviável usar. Nós queremos que a Prefeitura instale um banheiro com melhores condições.” Na Getúlio, ela costumava frequentar sanitários de lojas, “porque a dona já a conhecia e disponibilizava o banheiro pra gente”. Além disso, Danieli afirma que os ambulantes do local aguardam a instalação de tendas acima das barracas. “A Prefeitura nos prometeu que iria instalar tendas aqui para melhorar a estrutura para dias de chuva ou muito sol. Estamos aguardando”.
Barracas vazias
Algumas barracas cedidas pela Prefeitura a ambulantes estavam vazias na manhã desta terça. Segundo os próprios camelôs, muitos vendedores foram até o local pegar os pontos, mas “não têm ido trabalhar”. “Isso é ruim, porque quem precisaria de mais um ponto sai prejudicado”, avalia Lucilene Barbosa.
Ela reclama que teve de improvisar uma banca para expor morangos, já que a tenda de hortaliças não tem espaço suficiente para acomodar todos os produtos. “Fica difícil, ao mesmo tempo que tem várias barracas vazias. Então, mais uma vez, tinha que ter mais eventos para atrair as pessoas para cá e fazer os vendedores permanecerem ou então, (a Prefeitura) ceder mais pontos pra gente”.
Getúlio sem ambulantes e maior fiscalização
A reportagem percorreu a Avenida Getúlio Vargas e constatou que não havia nenhum ambulante irregular no local, na manhã desta terça. Apesar disso, há relatos de camelôs da Praça do Riachuelo de que alguns vendedores têm, ainda, tentado vender mercadorias na Getúlio. “Sempre tem uns insatisfeitos que tentam burlar a fiscalização”, afirma uma ambulante que prefere não ter o seu nome divulgado.
A Prefeitura tem intensificado a fiscalização no local e também nas ruas adjacentes. O maior controle ao longo da última semana por parte do Município foi percebido por outra ambulante, Laís Martins Fernandes, 34. Ela atua em uma barraca de bolsas, bonés e acessórios na Rua Batista de Oliveira e afirma que a supervisão no local aumentou. Ela, inclusive, percebeu aumento nas vendas com a mudança dos camelôs da Getúlio para a Praça do Riachuelo.
O Executivo justificou a medida, que inclusive garantiu maior fluidez ao tráfego de pessoas e veículos na Getúlio, como parte do processo de reorganização viária na região central, que inclui a inauguração do Viaduto Hélio Fádel Araújo, prevista para o fim deste mês. A estrutura urbana faz a ligação entre as avenidas Francisco Bernardino e Brasil, sobrepondo a linha férrea.
Paralelamente, está sendo feita uma nova normatização do comércio popular no Centro, a partir de um projeto de lei enviado pela prefeita Margarida Salomão (PT) à Câmara Municipal há cerca de duas semanas. Uma audiência pública para discutir as questões ligadas ao tema está marcada para o próximo dia 29.
PJF promete série de ações no local
De acordo com a secretária de Sustentabilidade em Meio Ambiente e Atividades Urbanas, Aline da Rocha Junqueira, a Prefeitura vai reformar o antigo posto da Polícia Militar que há na Praça do Riachuelo, para uso exclusivo dos comerciantes populares, com ponto de água. Ela explica que os quatro banheiros químicos que estão no local são para atender à demanda desse primeiro momento.Segundo a secretária, o Demlurb realiza a limpeza dos equipamentos provisórios diariamente, inclusive, com lavação. “Sentimos que mudou muito o fluxo da praça. O fato de já ter barracas mais padronizadas, presença dos órgãos de segurança, contribuíram para isso. Ainda não temos o movimento da Getúlio, mas a praça está mais atrativa.”
Para atrair um público maior, a Prefeitura afirma que irá promover um evento por dia na praça. A partir desta semana, em todas as sextas-feiras deste ano, será realizado um happy hour organizado pela Secretaria de Turismo (Setur), com venda de cerveja e atração musical. Com a aproximação do período natalino, o local também receberá enfeites e iluminação. Em parceria com o Santa Cruz Shopping, será montada uma “Casa do Papai Noel” na Praça do Riachuelo. Na próxima semana, a PJF estará presente, ainda, com uma tenda de acolhimento da Secretaria de Assistência Social (SAS) para a população em situação de rua, com o intuito de ser um espaço de diálogo, orientação e encaminhamento.
Conforme Aline, mais pessoas estavam dentro do levantamento primário de comerciantes feito pela pasta. No total, 62 comerciantes assinaram o termo de ajuste de conduta (TAC). Ela explica, no entanto, que o fluxo de comerciantes irregulares no espaço é diverso e mutável. “Reforçamos que a Getúlio não terá mais comércio popular, que podemos pensar em criar outros pontos ou até mesmo uma redistribuição, mais isso depende do andamento da lei na Câmara, é uma responsabilidade que precisa ser revista e discutida com toda a sociedade.”