‘Round 6’ não é para crianças; o desenho do Aquaman, sim
Oi, gente.
Pois é: demorei, mas assisti a “Round 6”, a série sul-coreana da Netflix que virou a produção de maior sucesso em todos os tempos da gigante de streaming. Por conta da quantidade de serviços que assinamos, confesso que não havia prestado atenção na produção quando ela foi lançada – e nem me animei a assistir, a princípio, por causa do hype na linha “La casa de papel” (que não assisti até hoje, aliás): gente de macacão, história “inteligente”, essas coisas. Porém, entretanto, todavia, a recomendação de alguns amigos e os memes com aquela boneca gigante despertaram nossa curiosidade, e lá fomos nós assistir à tal da “Round 6”, que só tem esse título no Brasil – o original, “Ojing-eo geim” (“Jogo da lula”), provavelmente foi mudado para não melindrar quem enxerga conspirações esquerdistas em tudo.
E quais nossas considerações consideráveis em relação à série? Em primeiro lugar, a mais importante: “ROUND 6” NÃO DEVE SER ASSISTIDA POR CRIANÇAS. Sério, minha gente, o que tem na cabeça desses pais, mães e responsáveis em geral que deixam uma molecada que tem cinco, seis, sete anos de idade assistirem a uma produção em que pessoas morrem ao participarem de provas baseadas em brincadeiras infantis? Como é que alguém faz festa de aniversário para filhos e filhas tendo a série como tema? Deixar qualquer criança ou pré-adolescente assistir à produção é de uma irresponsabilidade sem tamanho.
Isto posto, podemos dizer que “Round 6” é uma série muito boa, mas com um hype meio limão acima do tom. Assim como o clássico instantâneo “Parasita”, a produção entrega para o público uma crítica ao capitalismo em geral e às desigualdades sociais da Coreia do Sul em particular, algo que o resto do mundo vem descobrindo aos poucos. É também uma “crítica social f***” – termo que já virou piada entre os podcasts sobre cultura pop – ao mostrar o abismo entre aqueles que vivem o desespero de quem perdeu tudo e a turma que está no topo cada vez mais estreito da pirâmide, e se julga acima dos limites morais.
Comentar que a série mistura elementos de “Jogos mortais”, “Battle Royale”, “Jogos Vorazes”, “La casa de papel” e até mesmo “Black Mirror” é o tradicional chover no molhado. O lance é que a produção sabe misturar muito bem essas inspirações variadas, ao criar toda uma mitologia para o jogo e se sair muito bem no desenvolvimento dos personagens e os conflitos entre si, as reviravoltas mais ou menos surpreendentes e apresentar toda uma parte visual que certamente já faz parte do imaginário da cultura pop. A tal boneca gigante, os uniformes, cenários ficarão na nossa memória por muito tempo.
E onde é que o hype perde força? Pois bem: os episódios são desiguais, com alguns muito melhores que outros; a série tem algumas soluções de roteiro preguiçosas ou que deixam um rombo no desenvolvimento da trama; e todo o arco do policial não faria falta alguma para entender a história, os bastidores do jogo poderiam ser mostrados de outra forma (mas aí tem o lance de uma das reviravoltas da série, que só faria sentido com a presença do seu puliça, então fazer o quê).
Para baixar um pouco mais a nota, ainda temos toda aquela parte constrangedora dos VIPs, com diálogos clichês num inglês bizarro. E quem estava a fim de ver um monte de branquelos de meia-idade usando roupões sem nada por baixo, bebendo uísque e com aquelas máscaras bregas?
Hwang Dong-hyuk, criador da série, já anunciou que “Round 6” terá uma segunda temporada, então torcemos para que a Netflix não cometa o erro de esticar a história além do que seria sensato.
Se “Round 6” é uma série que deve ser assistida apenas por adultos, o assunto é diferente quando falamos de “Aquaman – Rei de Atlântida”, minissérie animada em três episódios que chegou em outubro ao HBO Max. Com produção de James Wan, diretor da versão do herói da DC Comics para o cinema, vai agradar adultos e crianças.
A história, mesmo que não seja canônica, se passa logo depois dos eventos do filme do Aquaman lançado em 2018, mas quem não assistiu ao longa ou jamais ouviu falar do personagem não vai ficar perdido. Depois de derrotar o Mestre dos Oceanos, o herói assume o trono de Atlântida, mas, inseguro quanto à sua capacidade de governar, tenta fazer de tudo para se mostrar digno perante os súditos, que ficam ridicularizando o novo monarca o tempo todo enquanto elogiam o antigo rei. Por causa disso, Aquaman procura cumprir da melhor maneira todas as tarefas reais, mesmo que isso signifique se colocar nas situações mais ridículas possíveis.
“Aquaman – Rei de Atlântida” tem um estilo de animação bem simples, no estilo da nova versão dos Thundercats, mas que é perfeita para a proposta da minissérie. Cada capítulo tem cerca de 45 minutos de duração, mas a história é tão ágil, engraçada e divertida, com reviravoltas a cada dois minutos, diálogos espertos e personagens tão bem desenvolvidos, que a gente nem vê o tempo passar.
Na verdade, o que queremos é mais aventuras desse novo Aquaman inseguro e carismático, que procura colocar a razão acima da ação – ao contrário da porradeira Mera, que acha que tudo pode ser resolvido na base do soco. E ainda temos personagens ótimos como o Mestre dos Oceanos e Mortikov, vilões divertidamente caricatos, a Guarda Real de Atlântida e a população do reino subaquático, que proporcionam alguns dos melhores momentos da minissérie.
Se for para deixar a criançada em frente à TV, que seja com “Aquaman – Rei de Atlântida”.
Vida longa e próspera. E obrigado pelos peixes.
(E não esqueça de seguir a playlist da coluna, com milhares de músicas para quem cansou de ouvir as mesmas coisas. Tem no Spotify e Deezer)