Da amputação às palestras sobre bem-estar: conheça a história do corredor Anderson Vitoreti
Atleta começou a participar do Ranking de Corridas no ano passado; neste sábado, ele disputa a Corrida Tecnobit, e clama pelo apoio aos PCD’s
Em dezembro de 2014, Anderson Vitoreti, hoje com 43 anos, sofreu um acidente de trabalho grave em uma empresa de metais, o que resultou na amputação bilateral de seus membros superiores. Quase simultaneamente, o morador do Bairro Fontesville, na região Norte, descobriu que sua esposa, Vanessa Moraes, estava grávida do segundo filho, Matheus. Em meio às incertezas, ele teve que passar por um tratamento intenso com uma equipe multidisciplinar devido a vários traumas adquiridos em sequência. Depois de alguns anos, quando estava disposto a se reabilitar na empresa, ocorreu uma troca na gerência e Anderson não conseguiu o sonhado retorno.
Foi em 2019, quando solicitou sua aposentadoria, que ele percebeu que havia ganhado muito peso devido ao tratamento. Procurou um endocrinologista, que lhe alertou sobre o risco de diabetes e a necessidade de fazer exercícios físicos. No ano seguinte, Anderson começou a se movimentar em casa para melhor qualidade de vida e, em 2022, participou de sua primeira disputa do Ranking de Corridas de Juiz de Fora.
Neste ano, o atleta já disputou a Corrida do Bahamas, e irá participar, neste sábado (15), da Tecnobit, a segunda do Ranking. Anderson é o segundo personagem do “Qual é o Seu Corre?”, série da Tribuna de Minas que conta a história de um corredor a cada prova que integra a temporada oficial da cidade para entender a relação de amor ao esporte e os esforços necessários para estar presente nas provas.
“É necessário mais investimento”
Nas corridas do Ranking, Anderson representa a equipe da Secretaria de Esportes e Lazer (SEL). Mais importante que os resultados esportivos são as melhorias tanto no bem-estar quanto na convivência social, conforme o próprio atleta diz. “Convivemos com pessoas que nos incentivam e praticamos uma concorrência sadia entre nós. Isso é um diferencial importante para pessoas com algum tipo de deficiência, que muitas vezes se sentem excluídas. A inclusão social é muito importante e o esporte é essencial para alavancá-la. Acredito que as famílias com pessoas com deficiência precisam dedicar um tempo para inseri-las no meio social, e o esporte é uma excelente forma de fazer isso. No meu caso, foi minha mãe, Ângela Maria, que me incentivou a participar também, porque ela já era atleta”, conta.
Entretanto, apesar da satisfação que o esporte lhe proporciona, o corredor atenta para a necessidade de melhorias estruturais em Juiz de Fora para que as pessoas com deficiências possam ter uma experiência mais agradável na modalidade. “A Prefeitura e a SEL têm projetos, mas é necessário mais investimentos. Não temos muitas pessoas também, falta divulgação dos órgãos competentes, além de várias famílias não disporem de um tempo para ajudar no deslocamento do PCD”, acredita. O atleta realiza seus treinamentos três vezes por semana, no Museu Mariano Procópio ou na UFJF, mas reconhece que outra dificuldade para os corredores é que “a maioria dos lugares de treinamento são afastados. Quem mora em Benfica, por exemplo, tem muita dificuldade para manter uma regularidade de treinamentos”.
Conciliar trabalho e corrida
Como a corrida não é uma atividade remunerada – em Juiz de Fora, muitas vezes os patrocínios só cobrem os gastos das competições – os corredores precisam fazer outras atividades, assim como Anderson. “Eu ministro palestras em várias empresas sobre o cuidado com o corpo, principalmente com os membros superiores. Instruo as pessoas a terem cuidado durante as atividades do dia a dia, seja no local de trabalho ou em casa, porque a gente às vezes acha que acidentes acontecem apenas no serviço, mas não. A maioria dos acidentes é com baixa gravidade e ocorre em casa, só que isso é menosprezado. Tenho como missão tentar mostrar às pessoas que, por mais cuidado que a gente tenha, estamos sujeitos a sofrer um acidente de baixa ou grande proporção. Com base nisso, converso com as pessoas, dou exemplos do cotidiano e da própria empresa e faço dinâmicas. Tento fazer algo bacana para que as pessoas possam levar isso para casa e conversar com filhos, esposo ou esposa e passar isso adiante”, explica.
Além das palestras, o esportista dedica parte de seu tempo para cuidar dos seus filhos, Matheus e Gabriel, de 7 e 19 anos. “Auxilio nas atividades diárias, principalmente no estudo. Converso com eles sobre as minhas dificuldades e as condições de uma pessoa deficiente. Mostro para eles que temos que dar valor à vida, não reclamar de tudo, porque só damos valor quando perdemos, como foi comigo”, diz.
Futuro no esporte e inspiração
Mesmo que tente evoluir gradativamente e acredite ter condições de representar Juiz de Fora como um atleta do paradesporto, Anderson diz levar as corridas de forma leve, sem se preocupar com suas colocações. “Meu objetivo maior é cuidar da saúde, fazer atividade física, e o que vier (além disso) é lucro. Claro que seria um prazer representar a cidade, Minas Gerais ou o Brasil em competições, mas temos que ir devagar. Quero continuar correndo para ter bem-estar”, declara.
Já reconhecido na cidade, apesar de ter começado a correr no ano passado, ele acredita que consegue inspirar outros atletas e mostrar que é necessário que cada um reconheça seus limites. “É importante nós entendermos o que somos capazes de fazer, sem fraquejar no primeiro momento. Para isso, é importante ter o incentivo de amigos e da família, e não se cobrar demais. A deficiência é uma limitação, mas cada passo dado no dia a dia é uma vitória e não se pode desistir facilmente. É preciso ter boa vontade, esforço e persistência para superar as limitações. Se a pessoa com deficiência fica parada, isso pode agravar seus problemas de saúde e torná-la um fardo pesado para a família. Por isso, precisamos inseri-la na comunidade e no meio esportivo, para melhorar sua saúde e desempenho, e ajudá-la a fazer coisas que antes pareciam impossíveis”, clama Anderson. “Não desistam das pessoas com deficiência, elas precisam de incentivo para obter sucesso na vida, e isso depende dos outros”.