Jornada de trabalho
PEC que trata da jornada 6 por 1 é importante por colocar a discussão na agenda, mas sua aprovação está longe de acontecer ante os impasses que já estão sendo revelados
É provável que, até a publicação deste editorial, a proposta de emenda à Constituição de autoria da deputada Erika Hilton (PSOL-SP) tenha alcançado o número mínimo regimental para entrar na ordem do dia da Câmara Federal, mas sua discussão já está nas ruas desde o dia em que o tiktoker Rick Azevedo, também do PSOL, em um post nas redes sociais, anunciou a criação do movimento Vida Além do Trabalho, que já conta com 2,2 milhões de assinaturas, pedindo o fim da adoção do modelo de trabalho 6 por 1, a redução da jornada para quatro dias, com o máximo de oito horas diárias, e um teto de 36 horas semanais.
Na carona, ele obteve 19 mil votos e toma posse como vereador do Rio de Janeiro no dia 1º de janeiro do ano que vem, mas a discussão, agora, subiu de patamar e está no Congresso Nacional. A deputada comprou a ideia e corre atrás de assinaturas há pelo menos seis meses. De novo, as redes sociais impulsionaram a discussão, e o tema entrou na agenda dos políticos.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, às voltas com o corte de gastos e na tentativa de convencer o presidente Lula a cortar despesas dos ministérios, para atender aos preceitos do arcabouço fiscal, disse que não teve tempo de acompanhar o debate sobre a PEC, mas ele sabe dos custos políticos que ela pode implicar, sobretudo após a presidente Gleisi Hoffmann, uma das lideranças do PT, ter sido uma das signatárias da proposta.
A autora disse que não tem ilusões sobre a aprovação do texto dentro dos padrões estabelecidos na norma, mas destacou que sua ideia é, pelo menos, abrir a discussão para um tema que, segundo ela, não é novo em outros países. Ela tem razão quando destaca a importância da discussão, mas resvalou nos fatos ao apontar que em outros países a jornada reduzida é uma realidade. De fato, sim, mas é preciso, primeiro, avaliar a situação econômica dessas regiões, que, provavelmente, têm diferença abissal com o Brasil.
Discutir não é problema, desde que, de fato, haja espaço para a participação de todos os segmentos. A redução é um pleito justo, mas é necessário avaliar suas consequências no setor produtivo, hoje já com a corda no pescoço. A redução da carga deve implicar contratações – o que aquece o mercado -, mas sua adoção tem consequência nos custos das empresas. E quem vai pagar essa conta?
Enquanto o Governo não se manifestar, a discussão fica mais no campo ideológico, a despeito de exceções entre os signatários, uma vez que, enquanto a esquerda gosta da ideia, mas ainda não apontou como serão resolvidos os impasses econômicos, a bancada liberal tem resistência, por considerar que a conta não vai fechar no fim do mês.
Se obtiver o número necessário, a PEC entra na agenda do Congresso, mas isso não garante a sua aprovação. O dado positivo é a discussão de um tema que, mais dia, menos dia, iria mesmo chegar ao Parlamento. A despeito do momento, é possível avaliar todos os pontos de vista. Entre as perdas e os ganhos é fundamental considerar todos os pontos de vista. Por enquanto, o consenso está num futuro bem distante.