Dia Mundial da Fotografia: conheça diferentes olhares juiz-foranos sobre a área

Entre cliques e olhares atentos, a fotografia segue como um dos instrumentos mais marcantes da comunicação


Por Mafê Braga*

24/08/2025 às 07h00

Comemorado na última terça-feira (19), o Dia Mundial de Fotografia celebra a arte de fotografar. A data escolhida relembra a criação do daguerreótipo, instrumento antecessor às câmeras, que também registrava, com suas particularidades, as realidades do século 19.

Com as inovações tecnólogicas e diferentes maneiras de se observar um mundo marcado pela conectividade, a data adquire novos significados. A Tribuna conversou com juiz-foranos apaixonados pela fotografia que dividiram as diferentes perspectivas sobre como é fotografar na cidade. 

A arte de registrar o cotidiano

Leonardo Costa iniciou de maneira despretensiosa na fotografia, aos 11 anos, em registros com a câmera Love, como a inauguração do Estádio Municipal Radialista Mário Heleno. Influenciado pelo pai, que fotografava por hobbie e “era ciumento com sua câmera Olympus”, começou a se interessar pela área.

Para Felipe Couri, o interesse pela fotografia teve início aos 8 anos, também por influência familiar. Os álbuns de fotos eram a alternativa que para a família, extensa e natural do interior de Minas, registrar os encontros entre os parentes.

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Leonardo Costa teve a oportunidade de fotografar um de seus ídolos de infância, o Zico (Foto: Luiz Carlos Duarte)

Formado em Geografia, Leonardo ingressou na primeira turma de Comunicação da Uniacademia, quando teve aulas com Gleice Lisboa, considerada “a principal responsável” por inseri-lo na área da fotografia. “Foi uma renovação na minha vida: poder registrar tudo que aprendi na Geografia, toda a desigualdade social e pobreza do país. O que aprendi na Geografia, a Comunicação me deixou levar para a rua e ver na prática.”

Tal reconhecimento pela docente também é mencionado por Felipe, colega de curso de Leonardo. “A faculdade voltou a despertar toda aquela minha paixão pela fotografia, e também me abriu uma porta quando eu conheci o fotojornalismo, graças à inspiração da minha mestre Gleice Lisboa, a quem me ensinou tudo e que foi uma referência, enquanto fotojornalista.”

Como fotógrafo profissional, Leonardo passou pelos jornais Estado de Minas, Diário Regional, Hoje em Dia e Agência Diário dos Associados, atualmente é fotojornalista da Tribuna de Minas, juntamente com Felipe, que também atuou no Diário Regional e no Hoje em Dia.  Como fotojornalistas, registraram diversos momentos da história da cidade, como jogos esportivos,  shows de artistas nacionais e internacionais, a morte do presidente Itamar Franco, visitas de presidentes e ex-presidentes à cidade e a cobertura da pandemia de Covid-19.

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Apaixonado por futebol, Felipe Couri já registrou diversos jogos em sua carreira (Foto: Leonardo Costa)

Sobre fotografar, Leonardo garante: “o principal não é talento, estudo ou dedicação. O principal é sensibilidade: se não for sensível, você não vê a foto. Tudo que dói no meu coração, eu registro”, relata. Sobre o fotojornalismo, Felipe acrescenta:  “tem a adrenalina, a expectativa, aquele sentimento de responsabilidade, de levar informação às pessoas, sabe? Que foi o que me levou
a fazer jornalismo.”

Leonardo destaca que nem sempre a foto mais importante para a comunidade é uma foto bonita, se ela soluciona a situação que está sendo retratada, cumpre o seu papel.”A fotografia não tem dono. Se tem utilidade pública, é direito das pessoas registrarem. O celular veio para auxiliar isso: todo mundo ter a sua imagem, a sua visão e vivência.”

Felipe também discorre sobre a fotografia no meio atual: “Faz parte da vida do dia a dia de qualquer cidadão que usa um smartphone. Ela tem esse poder de ser memorável tanto pelo aspecto técnico, fotojornalístico, artístico ou até mesmo pessoal de sentimento.”

O Dia Mundial da Fotografia é visto como um reconhecimento. “O dia dá essa identificação e valoriza a classe, mostra que as pessoas sobrevivem disso, que é uma profissão. Acho que a fotografia tem um poder de registro histórico imenso”, analisa Leonardo. “Representa uma das minhas paixões, comemoro a oportunidade de trabalhar com o que gosto”, afirma Felipe.

A cultura sob novos olhares

Janaína Fernandes é fotógrafa de cultura há 20 anos em Juiz de Fora e iniciou na fotografia aos 16 anos, quando começou a trabalhar em um estúdio fotográfico. Hoje, acumula mais de 600 eventos fotografados e registra diversos espetáculos na cidade, o que a elegeu como delegada suplente de Cultura.

“Desde 2005, meu olhar tem se aprofundado na busca por capturar a essência pulsante da cultura popular e dos espetáculos, não apenas como um registro visual, mas como uma narrativa viva que revela as emoções, a história e o pertencimento das pessoas envolvidas. É um olhar que busca ir além da imagem, mostrando a força e a beleza da identidade cultural de Juiz de Fora”, define ela, mais conhecida como Keka.

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Keka registrou diversas edições de Carnaval e eventos culturais de Juiz de Fora (Foto: Divulgação / Arquivo Pessoal)

Daniela Miranda é fotógrafa desde o ano de 2021, quando começou a cobrir as edições do Feijão de Ogun, e relata que sempre foi apaixonada por fotografia. “Costumo dizer que vejo a foto antes mesmo dela acontecer, quando me deparo com certas situações ou paisagens. A fotografia se tornou a forma de mostrar ao mundo como penso e sinto.”

A fotógrafa, que realizou recentemente a exposição “Caminhos ancestrais”, se define como estudiosa de culturas, como o Axé, e se vê como alguém que fotografa com corpo, alma e memória. Ela discorre que registrar  culturas é um ato de respeito e de escuta: antes de clicar, é preciso sentir e compreender a história que está diante de si.

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Daniela Miranda defende em seus trabalhos o papel dos terreiros numa construção cultural inclusiva em Juiz de Fora (Foto: Matheus Zaguetto)

Segundo Keka, a fotografia cultural atua como uma ponte entre o presente e a memória, visibilizando as expressões artísticas e populares que compõem o tecido social. Para ela, fotografar ajuda a valorizar e divulgar a riqueza cultural local, estimulando o orgulho comunitário e fortalecendo o protagonismo dos artistas e grupos envolvidos, muitas vezes invizibilizados. Tal discurso é enfatizado por Daniela, que aborda que a foto não apenas documenta, mas também cria visibilidade, reconhecimento e pertencimento, fortalecendo Juiz de Fora como um espaço rico em ancestralidade, criatividade e resistência cultural.

Keka define que o trabalho fotográfico une a sensibilidade artística com um olhar estratégico para contar histórias que dialogam e conectam. Para ela, o clique perfeito acontece quando sente que aquele instante encapsula uma emoção autêntica, um movimento natural que traduz a alma do evento.

Daniela concorda. “A minha sensibilidade vem da consciência de que não estou apenas registrando uma imagem, estou lidando com ancestralidade, com espiritualidade e com territórios de resistência. Isso me faz buscar imagens que traduzam verdade e potência, e não só estética.”

Dessa forma, Keka acredita que o Dia Mundial da Fotografia “simboliza a celebração do poder das imagens de contar histórias, preservar memórias e transformar percepções”. Daniela complementa que “ao dar visibilidade também a fotografia de terreiro, representa uma pequena, mas significativa, conquista na luta por reconhecimento e respeito às religiões de matriz africana. Ao colocarmos essas imagens em circulação, desafiamos a intolerância e os estereótipos que ainda permeiam a sociedade, reivindicando reconhecimento e abrindo espaço para que nossas tradições sejam vistas com respeito e dignidade.”

Entre a técnica e a prática

Graduada em Comunicação Social, mestre em Artes, Cultura e Linguagens e especialista em Arte, Cultura Visual e Comunicação, Gleice Lisboa atuou mais de 11 anos como repórter fotográfica. Foi premiada em dois concursos nacionais de fotografia, o Prêmio Vladimir Herzog e o Grande Prêmio Ayrton Senna de Jornalismo.

Apesar de considerar difícil se autodefinir, afirma que a sua fotografia é “curiosa o tempo todo”. “Quando você trabalha com a imagem, a sua comunicação chega a alguém. Eu lembro uma história em que eu estava na rua e tinha um gari que me gritou pelo nome e falou: ‘Adorei a sua foto de hoje na Tribuna!’. Você tem uma comunicação que é sua, que você vai construindo, e acho que é uma coisa que acontece muito sem você perceber.”

Já Pietro Carriço, bisneto do pioneiro na área na cidade, o fotógrafo e cineasta, João Carriço, aborda a fotografia pela visão de universitário. Estudante de jornalismo na UFJF, ele iniciou na área por meio de uma câmera antiga da família. “Eu sempre gostei muito de cinema, de fotografia, mas era só um espectador. Até que eu comecei a fazer meus primeiros registros e ficavam muito malfeitos, mas foi um início que me fez ficar mais interessado na área.”

 

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Ao longo de sua carreira na fotografia, Gleice registrou diferentes momentos sensíveis da realidade juiz-forana (Foto: Leonardo Costa / Tribuna de Minas)

Consoante a essa trajetória, Gleice defende a humildade no aprender. “É importante a simplicidade do caminho, não querer chegar rápido nos lugares. Fotografar não é sobre o equipamento. Todas as épocas têm uma tecnologia, e todas as épocas têm as grandes fotografias. Então, não é o equipamento: é o olhar. Você só vai precisar de um bom equipamento depois que o seu olhar já estiver atento.”

Para Pietro, que registra momentos em seu Instagram desde 2022, o contato com a área se deu pelas vivências. “Na fotografia de rua, sempre gostei de movimento: pegar um lugar, uma fatia de uma vista ou de um horário do dia. A ideia é ser uma coisa mundana, não ter um espetáculo, mas ter alguma coisa ali. Acho que, às vezes, as pessoas têm a visão da fotografia como o belo: o céu bonito, o carro bonito, a paisagem bonita. Mas não precisa ser necessariamente belo. Tem muita coisa que não é necessariamente ‘bela’ pra quem vê, mas que pra quem tira, tem uma beleza, uma visão por trás”.

Gleice aborda a importância dos celulares e defende que é positivo que as pessoas tenham acesso ao aparelho, pois assim, elas podem contar suas histórias e vivências únicas. “A gente está tendo essa volta da fotografia manual dentro do celular e isso é muito positivo”, diz.

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Entusiasta do cinema e da fotografia, Pietro pretende seguir na área de mestrado e doutorado, com foco em pesquisa (Foto: Leonardo Costa / Tribuna de Minas)

Pietro discorre que seu bisavô sabia que a arte não tem graça se só uma parte da população tem acesso. Ele destaca que é quando todos conseguem ter acesso que ela faz sentido e que a maior herança que ele leva de seu bisavô é de que a arte e qualquer expressão autoral, não precisa estar num lugar elitizado para existir. Dessa maneira, o universitário defende que o celular existe para dar uma entrada para as pessoas que querem fotografar e que ter esse direito é importante. 

“A fotografia é muito sobre memória. O Dia Mundial da Fotografia é uma convenção para que a gente lembre. É muito bom a gente resgatar esse passado para saber o que estava acontecendo, mas também não dá pra viver só de nostalgia e saudosismo, temos que ter a consciência do presente”, menciona Pietro. “A gente precisa ter uma data para lembrar, mas não é a data, e sim a oportunidade de colocar o assunto em evidência. Nunca se discute a fotografia em si, então esses momentos permitem que as reflexões ocorram”, complementa Gleice.

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Capa da Tribuna de Minas em edição de 2002, um dos registros 'mais sensíveis e emocionantes' de Gleice retrata rebelião de presos no Ceresp (Foto: Gleice Lisboa)

*Estagiária sob supervisão da editora Gracielle Nocelli

 

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