Tecnologia encurta distância entre idosos e familiares na quarentena
Juiz-foranos criam alternativas para manter contato com pessoas queridas durante a pandemia
O isolamento social tem causado uma avalanche de emoções e afetado, principalmente, a saúde mental das pessoas. No caso dos idosos, a falta de interação pode torná-los mais tristes e ansiosos. De acordo com a psicóloga Cleide Campos, o ideal é aprender novos hábitos para se manter ativo na quarentena e evitar a solidão. “Tentar manter a rotina diária ajuda a regular o relógio biológico e aumenta o bem-estar, proporcionando sensação de segurança e reduzindo o estresse e a ansiedade.”
Os meios de comunicação se tornaram, neste momento, grandes aliados. Além da televisão, as redes sociais estão servindo de apoio para muitos idosos, que conseguem, através do celular, se comunicar com filhos, netos e amigos. Este é o caso da aposentada Dalva Luzia de Almeida Domingues, 76, que passou a interagir com a família e os amigos pelos aplicativos de conversa, método também utilizado para falar com a neta que está em São Paulo. “Eu interajo muito com ela através de vídeo, a gente brinca com vários jogos. Vejo meu filho e minha nora, trocamos várias receitas. Eu gosto muito dos joguinhos on-line. A televisão também é minha companheira. Eu não vejo o dia passar.”
Já a aposentada Maria Helena de Oliveira, 70, que é religiosa, precisou se adaptar ao novo ritmo imposto pelas igrejas, que passaram a transmitir as atividades através das redes sociais e também pela televisão. “Nunca faltava às missas, sempre participava do ofertório e ajudava nos preparativos da celebração. Sinto muita falta dessa rotina. Sempre viajava para a Canção Nova e infelizmente tive que parar. Continuo assistindo pela televisão e evito ficar distante”, conta Maria Helena.
Além das redes sociais, praticar outras atividades pode ser um ponto positivo. A aposentada Aurora Maria, 88, avó de cinco netos e um bisneto, também se comunica através dos aplicativos de vídeos e aproveita seu tempo ocioso para fazer crochê. O hobby, que carrega ao longo dos anos, tem sido seu aliado neste momento. “O crochê me distrai, faço há muitos anos. Descobri com a minha filha que aprendeu na escola. É muito bom ter essa função, porque acaba me divertindo. Minhas netas adoram as toalhas que faço, sempre mostro para elas pelo celular. É um jeito que achei de manter a conversa em dia”, ressalta a aposentada.
Lares de idosos usam a tecnologia a seu favor
A tecnologia tem sido fundamental para estreitar os laços entre os residentes e seus familiares. No Lar dos Idosos Santa Luiza de Marilac, no Bairro Furtado de Menezes, Zona Sudeste de Juiz de Fora, as visitas e as saídas foram cortadas para evitar o contágio do vírus. Hoje, cerca de 28 idosos recebem tratamento diário dos funcionários. De acordo com a diretora geral, Sônia Elizabeth Perdigão Neves, os próprios cuidadores têm ajudado com a comunicação e emprestado os celulares para fazer as videoconferências. “A tecnologia, de fato, é nossa aliada neste momento. Quando é aniversário de algum idoso, fazemos videoconferência com as famílias. As aulas de educação física, que eram todas as segundas-feiras, estão sendo on-line. Oferecemos também cinema e brinquedoteca. Temos ocupado, pelo menos uma vez na semana, a cabeça deles com atividades virtuais para ajudá-los.”
Já a Pousada Maria Veiga, no Bairro Novo Horizonte, na Cidade Alta, em Juiz de Fora, além de criar protocolos de saúde, passou a trabalhar com a saúde psicológica dos idosos. Segundo o gestor da pousada, Henrique Honório, o primeiro passo foi comunicar aos idosos e a família sobre as mudanças. “Nós passamos a trabalhar intensamente com as atividades internas, para amenizar a saudade, por isso as chamadas de vídeo têm sido constantes. Proporcionar isso, nem que seja através do celular, é fundamental para que a família tenha certeza de que os idosos estejam bem.”
Ainda sobre novos procedimentos, a pousada introduziu em suas dependências o protocolo da “visita por vidro”, que possibilita ao idoso ver seus familiares, para amenizar a saudade. Os encontros são agendados e assistidos por um colaborador da pousada, cada idoso tem direito a um por semana. De acordo com Henrique, serão cinco visitas diárias, com limite de cinco minutos para cada residente.
“Fazemos um intervalo de cinco minutos a cada visita, a fim de evitar aglomeração na entrada da pousada. Dentro desse intervalo, realizamos a desinfecção do vidro e o manejo do próximo residente a receber a visita. Além disso, os visitantes devem vir de roupas limpas e direto de sua residência, evitando a contaminação no caminho”, pontua o gestor.
UFJF elabora estudo com pessoas acima dos 60
A Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), em parceria com a Universidade Católica de Brasília (UCB), propôs um estudo com os idosos (pessoas com 60 anos ou mais) para entender o comportamento desta faixa etária em meio à pandemia. De acordo com o professor do Departamento de Psicologia da UFJF, Altemir Barbosa, pesquisar sobre os idosos em tempos de graves crises pode gerar conhecimentos muito importantes. “Podemos aprender com a experiência deles, pois já passaram por situações análogas. A gripe espanhola, por exemplo, teve um ápice no final da segunda década do século passado. Só idosos centenários vivenciaram esta pandemia. Todavia, muitos têm memórias de relatos de pais e/ou avós sobre esta gravíssima crise em saúde”, destaca Altemir.
O estudo abrange tanto os aspectos que podem mostrar possíveis problemas causados ou agravados pela pandemia quanto os pontos fortes. Segundo Altemir, a intenção é compreender alguns aspectos psicológicos. “Os idosos são um grupo heterogêneo, uma etapa do curso de vida bastante ampla, que inclui indivíduos com características muito distintas. É preciso superar o estereótipo do idoso com problemas cognitivos e dificuldades de locomoção apoiado em uma bengala. Este perfil não corresponde à maioria dos idosos. Muitos têm características diametralmente opostas a essas” diz.
Na pesquisa, qualquer idoso que consiga ler e que saiba usar um equipamento tecnológico pode participar. Se tiver dificuldade com essa tecnologia e/ou de leitura, a pessoa pode, logo no início, informar um número de telefone celular, e alguém da equipe fará a entrevista. É importante que somente aqueles que têm dificuldade optem por isso. De acordo com o professor, não precisa ser brasileiro para fazer parte da pesquisa. Há, inclusive, uma equipe coletando dados em Portugal.
Já aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, o estudo é de responsabilidade dos cursos de graduação e pós-graduação em Psicologia da UFJF. Os interessados em participar podem escolher entre responder o questionário por telefone ou de forma on-line.
Apoio familiar é fundamental
De acordo com o IBGE, há aproximadamente 28 milhões de idosos no Brasil, o que representa 13% da população do país. Este percentual tende a dobrar nas próximas décadas, segundo a Projeção da População, divulgada em 2018. Na pandemia da Covid-19, os idosos foram considerados grupos de risco e, de acordo com abordagem feita pela ONU, pessoas com 80 anos ou mais têm uma mortalidade cinco vezes maior do que a mortalidade global. Nesse caso, os cuidados com a saúde dos idosos precisam ser redobrados.
Segundo a psicóloga Cleide Campos, o apoio dos familiares neste momento é fundamental. “Permanecer conectado às pessoas significativas é importante. Há várias opções de aplicativos para fazer chamada de vídeo. O modelo tradicional de telefonar também é bem-vindo. Tome cuidado para não infantilizar o idoso, porque isso pode afetar sua autoestima.”
Por serem mais vulneráveis ao isolamento, os idosos não devem ser tratados como invisíveis ou inúteis. Essa parcela da população, muitas vezes, é esquecida e abandonada, por isso a empatia social é muito importante. Além da Covid-19, a faixa etária segue sofrendo com outras enfermidades físicas e psíquicas.
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