A exploração do bolso alheio
“Menos gente pagando mais caro acaba dando mais lucro, incluindo menos mão de obra. Quem não pode pagar que se dane”
Um dia desses eu ouvi numa fila de caixa de supermercado um cidadão dizer que Lula e Bolsonaro dão no mesmo, porque, no final, os ricos continuarão ricos e os pobres continuarão lascados. Aí ele completou: “Eu tenho medo é dos donos de supermercados, padarias, açougues, que são os que tacam a mão direto nos nossos bolsos, seja lá quem for o presidente”. Falou e disse. A dança dos preços demonstra um cenário atual de forte especulação, em que o objetivo é lucrar o máximo possível.
No dia 7 de março, fui surpreendido num hortifrúti com o quilo do mamão custando R$ 12,99 (absurdo!), registrando um aumento de R$ 1 sobre o preço de quatro dias atrás. No dia 15, mais um aumento de R$ 1. Nos dois casos, pesquisei em mais quatro estabelecimentos no Centro da cidade, onde resido. Adivinhem: todos com o mesmo aumento e o mesmo preço, nas duas datas, numa inequívoca formação de cartel. Essa prática pode ocorrer com itens pequenos, como um simples mamão, até produtos industriais, por exemplo. Por impedir a livre concorrência, o que subjuga o consumidor, participar de cartel é crime e pode dar cadeia.
É importante observar que, para o dono de qualquer um desses estabelecimentos, de qualquer ramo de negócio, que especula com o preço dos seus produtos, não interessa quantas pessoas entram na sua loja durante o expediente, se o número de compradores diminui com os preços altos, mas sim o resultado do caixa no final do dia. Menos gente pagando mais caro acaba dando mais lucro, incluindo menos mão de obra. Quem não pode pagar que se dane. O mecanismo é esse.
Resultado: levantamento realizado pela CNDL e pelo SPC no final de 2022 aponta que 65,53 milhões de brasileiros que ralam no dia a dia estão com o “nome sujo”. O sujeito é explorado até não lhe sobrar um tostão, se endividar todo, ficar no aperto e no final ser envergonhado na lista negra dos maus pagadores.
Sem fugir do tema, vale citar o famigerado cheque especial. A pessoa rola a dívida, às vezes, pagando juros mensais altíssimos durante anos, de repente perde o emprego e não pode mais empurrar com a barriga. Daí a pouco o banco lhe apresenta uma dívida astronomicamente maior do que o principal. Um valor de R$ 2 mil, R$ 3 mil, vira R$ 15 mil. Se somarmos os juros pagos durante todo o tempo, que superam em muito o principal, mais o correntista exposto na lista negra do SPC e do Serasa, o resultado revela a truculência do negócio. A mais pura e escandalosa agiotagem.
Vale citar Cioran: “Que maldição o atingiu para que, ao final do seu desenvolvimento, [o Ocidente] só tenha produzido esses homens de negócios, esses comerciantes, esses trapaceiros de olhar nulo e sorriso atrofiado que se encontram por toda parte, tanto na Itália quanto na França, tanto na Inglaterra quanto na Alemanha? É essa gentalha o resultado de uma civilização tão delicada, tão complexa? Talvez seja preciso passar por isso, pela abjeção, para poder imaginar outro gênero de homens”. Faltou citar o Brasil, Cioran.
No mais, como é que um trabalhador pode viver dignamente em meio a tanta exploração ganhando um salário miserável de R$ 1.320 por mês?