Cedo para saber
Colocar em pauta a eleição de 2026, quando há um pleito municipal no meio do caminho, produz um cenário irreal ante a imponderabilidade da política
Com o país ainda discutindo os cem primeiros dias do Governo Lula, prestes a se completarem, vários institutos já foram à rua atestar o sentimento público para 2026. Na instância política, as discussões também ocorrem com frequência envolvendo os atores do próximo pleito presidencial, como se a sucessão estivesse logo ali. O professor e cientista político Rubem Barboza considera tais ações uma temeridade, com sérios riscos de erro por conta do espaço que ainda há no meio desse caminho. Os números são irreais, e chega a ser uma irresponsabilidade traçar cenários com tamanha antecedência.
Ele tem razão nas suas observações, mas a reeleição mudou o olhar das ruas, e a internet tornou-se um território de avaliações diárias que acabam colocando pleitos de quatro em quatro anos numa agenda que deveria contemplar, prioritariamente, o que vai ocorrer na eleição seguinte. E esta só vai acontecer em 2024, num ano que vem que ainda está distante, já que os atuais mandatos municipais saíram há três meses de sua metade.
As especulações fazem parte da rotina, mas, de fato, como aponta o professor, podem comprometer projetos. Os políticos, forçados pela necessária discussão em torno da sucessão, mal tomam posse e já estão de olho no próximo mandato. Com isso, antecipam conversas que bem poderiam ser adiadas. O exemplo mais claro envolve o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-presidente Jair Bolsonaro, os dois principais antagonistas.
Todas as conversas eleitorais os colocam no tabuleiro político sem levar em conta o imponderável. O atual dirigente está com 76 anos e pode estar fora do pleito de 2026 por conta do próprio tempo. Seu antecessor ainda está sob risco de uma ação de inelegibilidade pelos próximos oito anos. Com eles no páreo, o jogo é um. Sem eles, muda tudo.
Rubem ainda alerta para a terceira via, já colocada em discussão por meio de pesquisa, cuja conclusão apontou o interesse da maioria pelo caminho do meio. Mas que meio é esse? Os nomes colocados em questão podem, assim como Lula e Bolsonaro, não ser os principais atores daqui a quatro anos. Para ilustrar o comentário – leia na coluna Painel, ao lado – ele recorre ao ex-governador de Minas Magalhães Pinto, quando compara a política a uma nuvem: a cada dia está num lugar.
Os personagens centrais da pesquisa são os governadores de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo); de São Paulo, Tarcísio de Freitas (PL), e do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB). Também na bolsa de aposta está a ministra Simone Tebet, cujo desempenho na última eleição superou todas as expectativas, a despeito do comportamento dúbio do MDB, seu partido, com alguns de seus representantes instalados no palanque de Jair Bolsonaro.
Todos estão à mercê do próprio desempenho à frente de seus governos. Tarcísio vive a crise existencial de alocar-se no campo mais moderado da direita sem abrir mão do bolsonarismo. Zema vive situação idêntica, buscando espaço no cenário nacional para tornar-se um player nas eleições de 2026. O governador Eduardo Leite tem problemas da mesma ordem. Na primeira tentativa, desincompatibilizou-se do cargo e acabou ficando para trás na prévia do PSDB. Voltou ao Governo, quando quebrou a velha tradição gaúcha de não reeleger governadores, mas ainda vive o dilema de desconhecer como será o PSDB que terá a sua direção no segundo semestre do ano.
Falar da política com tamanha antecedência pode ter efeitos distintos. Um deles é colocar o atual mandato sob a obrigação de fazer uma agenda já voltada para a reeleição – o que se tornou rotina – ou forçar os demais atores a atuarem no campo da oposição, torcendo para o fracasso do gestor nacional, o que é uma causa injusta, quando o país carece de mais unidade – sem abrir mão das diferenças – para enfrentar o seu destino, ora totalmente incerto.