Viva, a pandemia acabou!

Por Nara Vidal

Viva! Acabou. Estamos salvos, ufa. Um alívio.

Nem acredito. Que horror. Não estamos entre os milhares de mortos, precisamos comemorar.

Vamos à praia. Está lotada de sobreviventes, gente que quer viver a vida com toda a intensidade que merece ser vivida.

Vamos voltar a frequentar os bares, cheios de gente à procura de amor, cheios de promessa de um futuro sem doenças, um saco essa coisa de pandemia, estragou todos os nossos planos. Mas agora passou e vamos correr atrás do tempo perdido. E quanto tempo perdemos, hein? Todo mundo preso em casa durante meses, quanto sacrifício. Não vejo a hora de voltar para a praia. Ainda bem que a pandemia acabou agora que o verão está chegando. Ninguém ia suportar ficar em casa com ventilador, ar condicionado e a praia lá, nestes trópicos. Não, não ia dar. A gente toma cuidado. A gente vai de máscara, mas chega lá a gente tira porque imagina marca de sol de máscara na cara? Aí não rola.

E tem ainda o Natal. Imagina passar o Natal trancafiado?

Se as coisas não se resolveram depois do Natal e tudo piorar como dizem os pessimistas, aí a gente volta a se isolar, mas no Natal não, e pior, Ano Novo. Gente, imagina se trancar no réveillon. Que deprê. Não, depois a gente vê isso do vírus, mas agora a gente vai viver, né, porque ninguém é de ferro. Deixa passar o Natal, o réveillon e o carnaval. Aí, a gente faz tudo direitinho, mas sabe como é, o Brasil só pega no tranco mesmo depois de fevereiro. Afinal, aqui estamos e isso é motivo suficiente para dar uma espairecida. Já que a gente não pode ficar pegando avião, então vamos para praia, vamos fazer festinha e vamos planejar o carnaval. Lá na Europa as coisas estão começando a se normalizar, que eu sei. Tá, tudo bem que eles levaram super a sério essa coisa do confinamento. Soube de gente que ficou seis meses sem fazer as unhas, sem ter uma faxineira para a casa, pensa! Mas na Europa também não tem vacina ainda, não e eles já estão saindo, as crianças começaram a escola. Ficam falando que no Brasil tudo foi mal feito e que o feito pela metade é não feito por inteiro. Mas, sei lá, acho que a gente tá cansado dessa conversa de morte e agora, queremos é viver.

Qual o nome do Ministro da Saúde mesmo?

Um dos piores sintomas da falta de leitura e educação no nosso país é ter que explicar ironia, sarcasmo. É frustrante ter que colocar uma nota num texto dizendo que é para o leitor olhar aquele texto com ironia. Apesar de ser um sinal de falta de leitura, interpretação de texto, é importante que a gente se explique. Então, deixo aqui meu sentimento de pêsames aos mais de cento e vinte mil mortos e suas famílias. O deboche contra o povo brasileiro parece, como a pandemia, não ter fim.

Nara Vidal

Nara Vidal

Nara Vidal é escritora. Nascida em Guarani, Zona da Mata mineira, em 1974, há quase duas décadas vive em Londres. É autora de mais de uma dezena de títulos, a maioria deles publicados em português. Dentre eles, os infanto-juvenis "Dagoberto" (Rona Editora) e "Pindorama de Sucupira" (Penninha Edições), os de contos "Lugar comum" (Passavento) e "A loucura dos outros" (Reformatório), e o romance "Sorte" (Moinhos), premiado com o terceiro lugar no Oceanos de 2019.

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