Festival gastronômico movimenta Ibitipoca e Lima Duarte
Valorizando produtos regionais e seguindo o conceito de slowfood, festival Sabores da Serra reúne 16 opções entre os dias 20 e 22 de outubro
É fato conhecido e consumado o caso de amor dos juiz-foranos com a charmosa Ibitipoca Entre os dias 20 e 22 de outubro, pegar a estradinha e subia serra para o distrito mais pop de Lima Duarte terá vários – e deliciosos – atrativos a mais. No fim de semana, será realizada a primeira edição do Festival Gastronômico Sabores da Serra com restaurantes majoritariamente da vila – a única que foi realizada antes tinha mais estabelecimentos de Lima Duarte. O evento é uma realização da Rede Ibitipoca Turismo e Hospitalidade, em parceria com a Prefeitura de Lima Duarte, e terá como tema “Cio da terra, o ouro na mesa”.
Segundo a chef Ana Paula Esteves, diretora de eventos da Rede Ibitipoca e curadora do festival – além de mente pensante e mãos “executantes” por trás do incrível cardápio do Oliva Bistrô – , a temática remete ao conceito de “slowfood”, com uso de alimentos bons, justos e limpos, em contraposição à celeridade e pouca qualidade do fast food. “Nossa ideia é valorizar os produtores que trabalham com alimentos que não prejudicam a saúde do consumidor ou do trabalhador e também não cometem crueldade contra o meio ambiente”, diz ela. Produtos da região, como queijos, palmito de pupunha, ora-pro-nobis, cordeiro, frango caipira, porco, fubás, pinhão, flores comestíveis e as PANCs (plantas alimentícias não convencionais) estrelarão os pratos dos 16 estabelecimentos participantes.
Rolê gourmet
A convite do festival, a Tribuna aceitou a deliciosa “missão” de passar um fim de semana em Ibitipoca e conhecer a maioria dos pratos participantes do festival. Fomos recebidos na Pizzaria Serra Nostra, que tem uma atmosfera tão rústica quanto descolada. Durante o evento, servirá a mineiríssima pizza “Trio das Gerais”, que leva abobrinha orgânica, linguiça e torresmo. “Queria fazer algo que fosse a cara do estado, até tentamos fazer uma pizza de feijão tropeiro, que ficou saborosa, mas pesada para se comer à noite. São ingredientes bem mineiros, foi uma criação da equipe aqui do restaurante”, explica a cozinheira e pizzaiola Núbia Reis, sobre a surpreendente combinação de “toppings” montada sobre massa da casa com ingredientes vindos de agricultores da região. “A linguiça é fabricada aqui perto de Lima Duarte, o torresmo é da casa, e a abobrinha é 100% orgânica”, acrescenta Núbia.
Na manhã seguinte, fomos recebidos na pousada Pasto do Lambar , com uma mesa farta de pães de queijo quentinhos, manteiga e requeijão dos arredores (dica: são saborosíssimos e superbaratos na chegada de Lima Duarte, voltando de Ibitipoca), chazinhos da bela horta da Adriana Lima, a simpaticíssima proprietária, e a estrela: o rocambole da Gi. De poucas palavras, a moça que empresta o nome à iguaria diz só que é preciso ter cuidado com o ponto da massa de pão-de-ló. “Não pode ficar ressecada, senão ela quebra ao enrolar”, destaca a jovem cozinheira. De fato, a massa do rocambole é macia na medida, o recheio de doce de leite artesanal é farto, mas suave, famoso “doce que não é muito doce”, de cor clara e textura mais leve que o doce de colher. A finalização é feita com canela polvilhada. O café é aberto a visitantes não hospedados na pousada, e a fatia de rocambole, prato do festival, custa a bagatela de R$ 7. Vale torcer para encontrar Adriana, e bater um longo papo com a bióloga radicada em Ibitipoca há décadas.
O almoço foi uma prévia de um dos eventos paralelos do festival, os festins gastronômicos. Um deles será realizado no Oliva Bistrô, chefiado por Ana Paula Esteves, que receberá o chef da Maxi Pão de Juiz de Fora , Beto Zaiden. “A ideia dos festins é trabalhar com parceiros nossos e utilizar ingredientes de produtores que reforcem o conceito de slowfood, pelo qual sou apaixonada. Existem agricultores que trabalham com ele e nem sabem, como o Sr Arnaldo, de Barra Grande (MG), nosso fornecedor de palmito de pupunha”, explica Ana Paula. Sr. Arnaldo pode ficar descansado e orgulhoso, seu insumo é muito bem aproveitado no cardápio do festim, que terá duas opções de entrada, duas de prato principal e duas de sobremesa, com harmonização.
Experimentamos, de entrada, o colorido ‘carpaccio’ de pupunha, fatiado em finíssimas rodelas, com pesto de manjericão, ‘confit’ de tomatinho-cereja, mini brotos e sementes de abóbora tostadas. No principal, conhecemos a “massa” de pupunha, um ‘tortellini’ puxado em azeite de carvão com cogumelos tostados e alho negro, que faz até os mais céticos sobre o palmito pagarem a língua diante do sabor marcante, mas delicado do prato minuciosamente montado. Vamos confessar: também demos uma beliscada na outra opção (feliz escolha), o pernil de cordeiro acompanhado de redução de vinho com goiabada, cuscuz de milho crioula e legumes braseados.
Fechamos o menu cheios de mineiridade, com o arroz doce com especiarias e lascas de coco, adoçado com doce de leite de fogão a lenha, servido em leito de abacaxi grelhado. O festim do Oliva será realizado no dia 21, em dois horários, das 14h às 18h e das 20h às 22h30. Dica: Se puder, opte pelo dia e aprecie a belíssima vista do deque do restaurante, tomando uma boa taça de vinho – e aproveitando a harmonização e a presença do sommelier Daniel Siqueira, da Miolo, que baterá um papo com os convidados. Outro restaurante que também fará um festim, nos dias 21 e 22, é o Via Venetto, com cardápios diversos para cada data, comandados pelos chefs Rodolfo Mayer (Angatu – Tiradentes) e Flávio Trombino (Xapuri – Belo Horizonte). Para ambos os eventos paralelos, é preciso fazer reserva: (32) 98411-8240.
Segue o baile
A noite de sábado terminou no Ibitilua, bem no coração do arraial, com porçãozinha de jiló empanado, crocante e fatiado fininho, servido com geleia de manga com pimenta, criação da Jussara Reis, que comanda o bar. ” É uma receita da minha mãe, Delma, tem que fritar no óleo bem quente, e o amarguinho do jiló some, achei que tinha a cara do festival”, diz ela. Ainda no sábado à noite, fomos recebidos pela adorável Nathalie Borges, a Naná, do Café da Villa Tapiocaria (que fica no ‘shopping’ da vila), com dois pratos no evento: tapioca de frango cremoso com requeijão e queijo da região e a “Dona Moela”, moelinha suculenta à moda mineira, servida com vinagrete de jiló cru marinado em suco de laranja e limão da terra, tomate, cebola e cheiro-verde (definitivamente merece o título de “dona”). “O vinagrete é a grande estrela deste prato, apesar de a moela ser uma carne que o brasileiro gosta mito. Estudo e pesquiso, cozinhar pra mim é uma arte, e aqui em Ibitipoca vesti essa camisa definitivamente”, diz Naná, artista plástica por formação e cozinheira desde que se mudou para a vila, há dez anos.
O domingo começou farto, no Armazém do Sabor, que serve café da manhã de hotel para qualquer turista a R$ 20. “Era uma demanda daqui de Ibitipoca, porque muita gente fica em casas alugadas e não tem onde tomar café da manhã”, explica a proprietária Jane Coimbra. Durante o evento, a casa abrirá as portas também durante a noite, no habitual tom de fartura com seu prato “Mariinha, Conceição e Zé Pequeno”, que não provamos mas tem um pouco de tudo: caldo de abóbora com “queijim” de pipoca, massa artesanal com ragu e raspas de pinhão e brigadeiro de banana com ora-pro-nobis cristalizado. O tour gastronômico seguiu até os Quitutes da Beth, onde a referida mantém a tradição de sua avó de fazer pão de canela, iguaria símbolo de Ibitipoca. “Fomos as primeiras a fazer para vender e no festival entraremos com o de chocolate e café e o pão de cebola com queijo e tomate seco”, conta Beth, que já passou o conhecimento da técnica para a filha Júlia, de 19 anos, que, conectada, faz as redes sociais da empresa familiar e os contatos, mas não nega o DNA. “Aprendi a fazer os pães, ajudo a minha mãe e, se precisar, faço sozinha”, diz, sem pestanejar.
O almoço foi em um dos estabelecimentos pioneiros em Ibitipoca, parada obrigatória de qualquer um que passe pelo arraial, o Cleusa’s Bar, aberto há mais de 20 anos e o primeiro restaurante da charmosa Ibitipoca. No festival gastronômico, Cleusa Oliveira, proprietária e cozinheira de mão cheia, servirá o prato “Sabor Mineiro”, feito com purê de pinhão e escalopinho com redução de vinho, acompanhado por salada tropical e arroz branco. “Quis que fosse simples, mineiro, mas com toque especial. Sempre cozinhei bem, mas depois que fiz o curso técnico do Senac, fui conhecendo mais ingredientes e aperfeiçoando minha técnica”, conta Cleusa, boa de papo e de fogão.
Mais tarde, foi hora de conhecer a Casa da Roça, que entra no Sabores da Serra com o “pão de queijo tropeiro”, feito com queijo artesanal e recheado com ragu de lombro e chutney de abóbora, uma perdição. O espaço é administrado pelo simpático casal Adriana Ferreira e Alexandre Silva, juiz-foranos formados pela Cândido Tostes que se mudaram para Ibitipoca há pouco mais de um mês. “Já amávamos aqui, e foi a realização de um sonho. Participar do festival é mais um passo no senso de comunidade que estamos vivenciando aqui”, conta Adriana, enquanto nos apresenta outras delícias da casa, como o chutney de pimentão com pimenta (picante na medida) e o bolo indiano com farinha de rosca, toque de canela e doce de leite artesanal (de laticínio, esse povo entende mesmo, acredite).
Apesar de termos nos fartado na serra, não haveria tempo hábil de conhecer todos os participantes, que podem ser conferidos no site redeibitipoca.com/saboresdaserra e no Facebook do evento, facebook.com/festivalsaboresdaserra. Além dos 12 participantes de Ibitipoca, quatro de Lima Duarte marcam presença, inclusive o “Casinhas Turismo Rural”, com o simples, mas inesquecível doce de leite com queijo de minas, ambos feitos em pequena escala, artesanalmente, com receita de família, provado e aprovado por nós. Compre um pote e um queijo, no mínimo.
Além dos restaurantes
O festival será aberto com o “Deguste”, às 18h, na Escola Municipal Padre Carlos, com degustação de pequenas porções a cargo do chef Laudinei Tadeu do Carmo, do Senac de Barbacena. Paralelamente, será realizada a Feira de Produtos Regionais, na praça da Igreja Matriz, com expositores de linguiça de cordeiro, queijos, doce de leite, palmito de pupunha, cachaça, pães, quitutes e cervejas artesanais, vinhos da Miolo, além de ‘foodtrucks’ variados. (Provamos a linguiça de cordeiro do Sítio do Urucum, de Lima Duarte, saborosa, carnuda e imperdível).
Ainda na feira, o chef juiz-forano Mateus Abdo oferecerá um cordeiro orgânico no fogo de chão, em parceria com os produtores do Sítio Urucum. Também participando do evento, Caíque Fonseca, que chefia a Das Haus Comedoria, fará uma “Cozinha Show” ao vivo, apresentando a ‘paella’ mineira e ‘paella’ alemã. A feira vai até domingo, dia 22, e também terá programação cultural. A feira “Alegrias de Quintal”, encontro idealizado por um grupo de pequenos produtores da região, que reúne orgânicos, mudas, quitutes mineiros, biscoitos e doces, também participará do Festival Gastronômico, em seu próprio local, na estrada entre a vila e o parque. A agenda ainda inclui oficinias, limitadas a 20 participantes, nos temas “Gastronomia sustentável”, “Preparo de massas e molhos”, “Drinques” e “Harmonizações com vinho”. As inscrições são gratuitas.