Filantrópicos denunciam atraso e defasagem nos pagamentos
Com o objetivo de denunciar os problemas financeiros pelos quais os hospitais filantrópicos de Minas Gerais estão passando, a Santa Casa de Misericórdia de Juiz de Fora e a Associação Feminina de Prevenção e Combate ao Câncer (Ascomcer) participaram de uma ação coletiva durante essa sexta-feira (26). Faixas pretas foram anexadas às fachadas das instituições, representando o luto pela “morte” dos hospitais mineiros, caso os problemas não sejam solucionados. Proposta pela Federação das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos do estado (Federassantas), a ação aconteceu em diversas cidades e tem como foco conscientizar a população sobre a possibilidade de fechamento das instituições. A estimativa da federação é de que a dívida do Governo de Minas chegue a R$ 250 milhões com os 128 hospitais filantrópicos do estado.
Na Ascomcer, onde são atendidos seis mil pacientes por mês, a defasagem dos valores pagos pelo SUS chega a 60% do valor dos procedimentos. “Não temos problema de falta de repasse do SUS atualmente, mas os valores estão tão defasados que não conseguimos arcar com nossos compromissos. Desde 2008 não há reajuste, então o mesmo valor que recebíamos para realizar um procedimento há quase dez anos, recebemos agora”, explica a presidente da Ascomcer, Alessandra Sampaio. Segundo ela, a Ascomcer acaba arcando com os déficits. “O preço dos medicamentos aumentou 58%, e os funcionários também tiveram seus salários reajustados, mas nós não recebemos nenhum ajuste nos valores dos procedimentos. Só conseguimos manter o equilíbrio financeiro porque a sociedade nos apoia muito.”
Para o diretor-secretário da Santa Casa de Misericórdia, Padre José Leles da Silva, sem a parceria do Estado não há como continuar o atendimento à população. “Essas instituições fazem uma aliança com o Poder Público. Elas dão assistência e, em contrapartida, o Estado propõe isenção de alguns impostos. Mas para cada R$ 1 de imposto que o governo dá, a instituição gasta quase R$ 6 com custos, e isso está nos deixando em uma situação muito complicada. A saúde financeira das filantrópicas está muito debilitada. Estamos chegando a um ponto em que não temos mais fôlego para suportar o peso dessa carga”, lamenta.
De acordo com dados da Federassantas, falta dinheiro para a compra de materiais básicos como medicamentos, material de limpeza, macas, máquinas de raio-X e para pagar os funcionários e profissionais de saúde. O problema é agravado ainda mais porque, além de não pagar os valores totais para custear os procedimentos, muitos hospitais chegam a receber os repasses com cerca de três meses de atraso. Segundo a presidente da federação, Kátia Rocha, a população tem de ser informada sobre a situação. “Os hospitais filantrópicos são tratados como se não fosse necessário encará-los com seriedade, principalmente o financiamento de suas atividades. Nenhum hospital público no Brasil consegue funcionar hoje tão somente com o repasse da tabela do SUS. Como estamos vendo que há uma paralisia por parte da gestão pública, estamos buscando a população, pois no dia em que o cidadão tiver noção de seus direitos, o desmantelamento vai acabar.” Kátia informou que a federação pode acionar a Justiça para pressionar o Estado a divulgar um cronograma de repasses.
Governo reconhece dívida
Procurada pela Tribuna, a Secretaria de Estado de Saúde reconheceu, por meio de nota, que existem débitos junto aos municípios, mas não explicitou valores e afirmou que alguns deles são advindos de governos anteriores, mas afirmou que “tem trabalhado incessantemente junto à Secretaria de Fazenda para que a situação seja regularizada o quanto antes, considerando a disponibilidade financeira.” A secretaria afirmou ainda que “o financiador da rede hospitalar é o Ministério da Saúde, e que recebe o recurso federal e repassa aos municípios, que não são plenos, mediante comprovação de produção.”
‘Hospitais públicos não darão conta’
Conforme a Federassantas, 70% das internações do SUS são feitas nos hospitais filantrópicos. Somente no ano passado, as instituições de Minas Gerais realizaram 800 mil internações, 320 mil cirurgias e 1,5 milhão de tratamentos contra o câncer. Apesar disso, os hospitais recebem R$ 11 para atender um paciente em uma consulta de urgência, valor considerado insuficiente para arcar com os custos. Com a crescente penalização dos hospitais e os consequentes fechamentos, a população pode acabar desassistida. “Os hospitais públicos recebem verbas duas vezes maiores que os filantrópicos, e, ainda assim, temos a clara demonstração de que esse dinheiro é insuficiente. Muitas pessoas utilizam o argumento de que os filantrópicos não pagam impostos, mas deveria ser investido neles justamente porque se ele é desonerado da carga tributária, seu custo final é menor. Quando promovemos essa ação, estamos defendendo a própria sociedade, porque se 70% do atendimento é feito nessas instituições, se essa rede ruir, os hospitais públicos não darão conta dos atendimentos”, presidente da federação Kátia Rocha.
A Secretaria de Saúde se posicionou por meio de nota e concordou que o fechamento de hospitais filantrópicos impacta o atendimento na região. A pasta ainda informou que se solidariza com a Santa Casa e a Ascomcer, “por entender que estas entidades são fundamentais para o sistema de Saúde da cidade e efetiva assistência à população.”