Como anda a nossa humanidade?
“Não é difícil constatar que existe, de modo geral, uma ignorância do que foram os anos de chumbo”
Marcos Araújo, jornalista
“Não é difícil constatar que existe, de modo geral, uma ignorância do que foram os anos de chumbo”
É assustadora a reação contrária a estudantes que buscam, de forma consciente, trazer à tona o debate sobre o que foi a ditadura militar no Brasil, e o que ela ainda representa para a sociedade atual. Com a proposta de mudar nomes de ruas de Juiz de Fora que homenageiam presidentes ditadores, esses adolescentes e seu professor serviram de alvo para ataques raivosos na internet, espaço no qual, cada vez mais, perde-se o medo de deixar a máscara cair.
Congraçar-se ou não com a ideia desses alunos é um direito de cada um, afinal, é isso que tanto preza a democracia. Mas, deixando-se de lado discursos polarizados, é preciso reconhecer que a proposição tem valor pelo fato de tirar do silêncio um assunto que deixou cicatrizes.
Não é difícil constatar que existe, de modo geral, uma ignorância do que foram os anos de chumbo – época da história brasileira marcada por abusos de poder, torturas, diminuição dos direitos dos cidadãos, censura e cassação de partidos políticos. A culpa dessa falta de conhecimento pode ser explicada pelo parco debate público acerca da questão.
Estudiosos do tema ressaltam que esse obscurantismo tem ligação com o próprio processo de transição para a democracia no país, assinalado pela Lei da Anistia, que perdoou políticos e militantes de esquerda e também militares apontados como torturadores. O foco principal seria virar os olhos para o passado, a fim de mirar o futuro.
A consequência desse efeito “borracha” calcado no apagamento foi a escassa produção de discursos públicos sobre a ditadura, que abriu caminho para a construção de uma memória utópica a seu respeito, negligenciando a violência cometida pelo Estado. Não é raro encontrar nos comentários nas redes sociais a visão de ausência de corrupção naquele período, porém já existem estudos que mostram o vínculo entre empreiteiras e o governo militar. É o futuro repetindo o passado!
É preciso lembrar para não esquecer, posto que as novas gerações tendem a perder o que já passou. Se antes a ditadura era considerada um assunto tabu, quanto mais o tempo avança deixando traumas invisíveis, mais ela ganha adeptos, que passaram a mostrar a cara e a voz depois das manifestações de rua de 2013, do impeachment da Dilma, da eleição do Trump e da concentração de ideias em extremos opostos. É bom lembrar que atrás da defesa anticorrupção há a transgressão de direitos. Ao eleger a corrupção o maior dos males, esquece-se que ainda há pessoas perdendo a vida por causa da pobreza e da fome.
Assim, é fundamental se perguntar sobre como anda a nossa humanidade. O projeto dos estudantes de substituir nomes de ruas chama a atenção para isso. Quando nos é proposto pensar sobre o regime autoritário, não dá para perder de vista os fatos, que falam por si. Houve violência por parte do Estado, o que coloca toda essa discussão acima da abordagem de direita e esquerda, uma vez que não é possível haver negociação quando há a violação de direitos humanos.