A inclusão dos transgêneros no espaço acadêmico


Por BRUNO CARLOS MEDEIROS, JORNALISTA E ESCRITOR

18/12/2015 às 07h00- Atualizada 18/12/2015 às 09h02

Nada parece menos factível, em tempos de discórdias acirradas e aparentemente irreconciliáveis, do que a constatação de que evoluímos em nossas relações interindividuais – a passos modestos, é verdade, mas de contribuição expressiva ao seu desenvolvimento. Mesmo as mais recentes das mutações dos vínculos sociais, que se adaptam conforme o contexto, contrariando as impressões, corroboram com a ideia de que os ganhos nunca arrefeceram e que um cenário marcado por alteridade plena, mesmo que ainda restrito às utopias, torna-se cada vez menos longínquo. Na década de 1960, como amostra, não se vislumbrava conjuntura futura na qual as mulheres alcançariam cargos do topo da hierarquia das grandes empresas. Acima do esperneio dos que consideram justo o cenário menos favorável a elas, a realidade atual é produto das transformações sociais conquistadas com o correr do tempo.

Aos poucos, espera-se que o senso comum acate o genuíno sentido do conceito de democracia, que, em contraste com a concepção conveniente de que muitos se valem para impor seus desideratos segregacionistas, não é uma forma de governo que serve aos devaneios da maioria, mas um veículo de efetivação das liberdades individuais.

Os homossexuais, outrora condenados a um cotidiano que, em nome de sua aceitação na comunidade, impunha que a expressão de sua individualidade estivesse inserida nos parâmetros abonados pelo senso comum, hoje gozam de um notável rol de direitos – o Estado garante, pois, o que parte dos brasileiros ainda resiste em admitir, e tal desvantagem na massa de apoios não o esmoreceu de cumprir com o seu papel de proporcionar que os direitos humanos contemplem a todos, indistintamente. Trata-se de assegurar um ambiente em que as liberdades são, quando não em conflito com as dos demais, absolutas. E transexuais e travestis estão incorporados a essas garantias. É pertinente ressaltar que a transgeneridade, em paridade com as inclinações formadoras de nossa personalidade, é uma condição, não um distúrbio – pouco do que foge dos padrões preestabelecidos faz jus a rótulos desonrosos ou representa patologias a que se devem remediar.

É nesta toada que a UFJF, em consonância com resolução de órgão da Secretaria de Direitos Humanos, estabeleceu que a utilização dos banheiros da universidade deve satisfazer o gênero com que o indivíduo se identifica. Em outras palavras, indivíduos cuja aparência não mais reflita o que sua biologia determina podem optar por se adequarem ao primeiro. A hipótese de constrangimento evocada pelos opositores à medida desconsidera o embaraço que acomete seres transgêneros ao compartilhar os sanitários com representantes do sexo no qual não se reconhecem – e com recíproca verdadeira -, justo os mais propensos a menosprezá-los.

O valor desta decisão será reconhecido, mas apenas com a colaboração do tempo. Os que se desvirtuam do fluxo rumo à efetivação de um ambiente de inclusão de todos os que compõem a raça humana, única e indissociável, não formam grupos isolados, e processos de assimilação das reformas de paradigma podem ser traumáticos e laboriosos. É o grande desafio. Mas a mudança é esteio dos desdobramentos que a história nos narra: é ela quem sempre acaba assumindo o comando da razão.

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