‘Si vis pacem, para bellum’
“Afinal, qual reconstrução de país pode existir sem gente viva ou com gente viva chorando seus mortos?”
Provérbio em latim. Pode ser traduzido como “se quer paz, prepare-se para a guerra”, atribuída ao autor romano Flávio Vegécio.
Observo o lava a jato em frente, a casa de rações, o sobradinho ao lado e o seu morador, um idoso que passa seus dias sentado na varanda observando a rua, e penso: no final de tudo isso, será que estaremos por aqui? Como será essa paisagem daqui a alguns meses? Lembro-me de que mês passado estava com a ideia fixa de comprar um carro, e agora me pergunto: “Para que carro, se todos morreremos?”. Assumo, o alarmismo tem sido um visitante frequente nesses últimos dias…
Nas redes sociais, vejo um rosário sendo desfiado com todos os impropérios cometidos e proferidos pelo chefe do Poder Executivo Federal, cujo nome vou poupá-los de ler. Chovem áudios e vídeos, com teorias da conspiração que apontam supostos culpados, de um suposto “doutor fulano”, que é chefe do hospital de não sei onde, dizendo que tá tranquilo, que tá favorável, até gente que propõe o uso de pomada minâncora para a cura da Covid-19.
Há um mês, estávamos em clima pós-carnaval, observando a China e seu sofrimento ao longe. Como se ela estivesse em um HD externo da Terra, bloqueado por um firewall sanitário. Mas, como diria minha avó, “a coisa veio vindo e chegou”.
E chegou, derrubando vidas, conceitos, relações e, principalmente, certezas.
Hoje, temos nossas vidas, em grande parte, sob a responsabilidade de profissionais que há pouco eram subvalorizados financeira e socialmente: motofretistas, higienizadores, repositores de supermercados, auxiliares de enfermagem, pequenos agricultores, coletores de lixo, agentes de saúde, entre tantos outros… Pergunto, será que estes não estão nos “jogando na cara” que suas atividades merecem muito mais do que recebem?
Cá em Banânia, a economia, com o seu nano PIB, fruto de um modelo de neoliberalismo ultrapassado, já estava à beira do precipício. E o presidente, com toda a sua já conhecida estupidez, segue mostrando que seu único objetivo é a obtenção de um palanque para as próximas eleições, deixando parte do povo boquiaberto e sem liderança. Economia não é um valor que se opõe à saúde.
Afinal, qual reconstrução de país pode existir sem gente viva ou com gente viva chorando seus mortos? Mesmo com imagens de pilhas de caixões e de caminhões-necrotérios, a plateia aplaude ensandecida os discursos vazios de que a economia não pode parar. O que falta para que seus olhos sejam abertos, um defunto no quarto ao lado?
E os pobres, já acostumados ao descaso do Poder público, o que se está fazendo pela saúde e pela manutenção de sua sobrevivência? Como se enfrenta uma doença, cujo combate se baseia no isolamento social e na higiene, quando se vive em um cômodo com uma aglomeração familiar ou quando não se tem nem água potável?
O que devemos valorizar daqui para a frente diante da constatação da nossa fragilidade e de que pandemias matam muito mais aos pobres, mas que não escolhem ninguém pelos critérios de classe, cor da pele, saldo bancário e de corrente ideológica?
Creio que esta crise humanitária seja em certa medida um episódio pedagógico, no sentido de que podemos e devemos revisar nossos conceitos e preconceitos. E reavaliar em que mundo queremos viver.
Fiquem em casa, não cocem o rosto, lavem as mãos e nunca acreditem nas palavras de alguém que não estudou muito sobre o assunto que está falando. Nunca!