Lei Maria da Penha, 11 anos depois

Ione Barbosa, Delegada da Especializada de Atendimento à Mulher


Por Tribuna

06/08/2017 às 06h00

Comecemos com uma hipótese. Imaginemos que, justamente amanhã, segunda-feira, dia 7 de agosto de 2017, a Tribuna de Minas resolvesse fazer uma enquete no Calçadão da Rua Halfeld.

A cada pessoa abordada seriam feitas duas perguntas bem objetivas. Primeira: você já ouviu falar ou sabe do que se trata a Lei Federal 11.340? Por óbvio que, à exceção dos operadores do direito ou de outros profissionais que no seu dia a dia lidam com a lei ou com a temática por ela tratada, poucos, pouquíssimos, quase ninguém saberia responder. Segunda pergunta: você já ouviu falar ou sabe do que se trata a Lei Maria da Penha? É de se acreditar que poucos não saberiam relacionar a lei – agora devidamente nomeada e identificada – com a defesa e a promoção das mulheres. Pois é, amanhã faz 11 anos que a “Maria da Penha” começou sua trajetória até ganhar a popularidade de que hoje desfruta.

Muita coisa há para dizer sobre a Lei Maria da Penha. Sem fazer concessões a um simplismo reducionista – mas tendo em conta os estritos limites de um artigo de opinião -, pensamos que o saldo é positivo. No horizonte da minha experiência profissional diária, como delegada de Polícia Civil, minha convicção é no sentido de que esta lei tem cumprido, adequadamente, o seu papel. É claro que há muito a fazer, consideradas sobretudo as várias políticas públicas que estão previstas em seu texto e que ainda precisam ser levadas a cabo. Considerado o generoso e desafiante projeto civilizatório traçado pela Carta da República – “construir uma sociedade justa, livre e solidária”-, a Lei Maria da Penha é instrumento de primeira utilidade e inescapável grandeza.

Seu grande mérito está no fato de que ela deu visibilidade ao fenômeno da violência contra as mulheres. Significa dizer que aquilo que antes era tido e havido como “assunto privado”, “briga de marido e mulher” ou “assunto que não é da conta de ninguém a não ser do casal” é agora considerado do interesse de todos. Sim, de todos, pois a ninguém é dado ficar indiferente ao sofrimento e à dor do seu semelhante. Dir-se-á que, no panorama da espécie humana, nada pode ser tão semelhante a um homem quanto uma mulher. De qualquer sorte, é preciso bradar a plenos pulmões contra esta enormidade: num perverso “ranking” de 83 países, o Brasil ocupa o quinto lugar entre aqueles onde mais se matam mulheres no mundo!

Assim, ao trazer para a esfera pública esta questão, a Lei Maria da Penha se apresentou como um instrumento indispensável para dar respostas, o quanto possível, eficazes na defesa e na promoção das mulheres. Com efeito, seu incontornável pressuposto ético-jurídico-político é o de que nós mulheres somos portadoras de uma essencial dignidade como pessoas humanas e, por via de consequência, somos titulares de direitos fundamentais. Temos, em síntese, aquilo que a genial Hannah Arendt denominou “o direito a ter direitos”.

É certo que os desafios são imensos. O cenário é desafiador. Retenhamos, bem por isso, a lição de Paulo Freire: “O futuro pode ser problemático, mas não inexorável”.

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