Disputa sem vencedores
O enfrentamento entre as instituições é um passo atrás para a democracia, mas é necessário o conhecimento mútuo dos limites das competências de cada poder
A assertividade do Supremo Tribunal Federal nos últimos anos, com ações interpretadas como além de sua competência e com contorno político, formou, ao curso dos anos, um distanciamento com os demais poderes – algumas vezes mais enfático, como nos quatro anos da gestão Bolsonaro, culminando com medidas partidas do Legislativo com o claro viés de reação.
A aprovação no Senado do projeto limitando decisões monocráticas dos magistrados dividiu o mundo jurídico. Uma parcela chamou a atenção para a “inconstitucionalidade” da medida, enquanto os demais consideram que ela está dentro dos limites estabelecidos pela Carta de 1988, isto é, não fere o que foi decidido pelo legislador constituinte.
A despeito de passar pelo Senado, não há, ainda, garantias de que a matéria avance, pois na Câmara, a partir do presidente Arthur Lira, não há a pressa implementada pelos senadores. O texto pode madurar nas gavetas da Casa por um bom período, dependendo das articulações que já estão em curso.
No entanto, a constitucionalidade do projeto tem espaço próprio de discussão, mas é necessário avaliar o dado político. Não é de hoje o Supremo tem ingressado em agenda de outros poderes, em ingerência que, de acordo com os críticos, desequilibra a necessária harmonia entre eles, mas é preciso ressaltar que muitas dessas medidas foram tomadas em decorrência da omissão dos próprios parlamentares. Ante o vácuo, o Judiciário se apresentou.
Esse embate, porém, não é bom para nenhuma das partes e leva a consequências preocupantes para a própria democracia. Fragilizar qualquer um dos poderes é um passo atrás, o que, por si só, deveria servir de alerta para os atores envolvidos. Desde a sua concepção, na primeira República, o Supremo tem sido colocado em xeque. As experiências pretéritas deveriam servir de referência para o debate que ora se desenvolve, já que, em vez de qualquer tipo de retaliação, é importante a construção conjunta de projetos que aperfeiçoem as instituições.
No cenário de enfrentamento, a opinião pública acaba entrando no clima. Tão logo os senadores aprovaram a rejeição às medidas monocráticas, pesquisadores da Genial/Quaest voltaram às ruas para aferir o sentimento popular. Sem surpresa, 66% concordam com a limitação das decisões monocráticas. Além disso 68% dos brasileiros concordam que ministros do STF deveriam ter mandatos fixos, talvez por desconhecer que já há a limitação de 75 anos.
O coordenador da pesquisa, Felipe Nunes, destacou que “é difícil saber se a população apoia essas medidas porque não confia no Supremo ou porque acha que há desbalanceamento na estrutura dos checks and balances do país”. No entanto, o desgaste na imagem da Côrte, que vem se acentuando no decorrer dos anos, contrasta com a aprovação da opinião pública a algumas decisões. Para 50% dos entrevistados, o Supremo está correto na condução dos julgamentos dos participantes dos atos de 8 de janeiro. 41%, por sua vez, acham que há exagero na decisão.
Ao fim e ao cabo, desgastar o Judiciário é ruim para o próprio país por criar um cenário em que todos perdem.