Pragmatismo da política
Projeto da reforma tributária só foi aprovado por conta das ações e concessões, sem as quais o país ficaria outros trinta anos com um regime tributário próprio de um manicômio
A histórica aprovação da reforma tributária – tema que perpassa os governos pelo menos nos últimos trinta anos – foi uma clara demonstração de pragmatismo das partes envolvidas, já que, sem conversa e concessões republicanas, era impossível avançar. Os partidos apresentaram a conta e o Governo bancou. O quórum de aprovação é a prova desse processo. Governistas e oposição estiveram na mesma trincheira, afastando o viés ideológico da votação. O PL, do ex-presidente Jair Bolsonaro, entregou pelo menos vinte votos a despeito das recomendações do líder que, no mesmo dia, tinha defendido o voto contra durante um evento marcado pelo constrangimento ante a cobrança direta ao governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, este a favor do projeto.
O texto segue para o Senado e não tem data para ser votado, já que o Congresso entra em recesso, mas é provável que até o fim do ano haja um desfecho. Os senadores conhecem melhor a realidade de seus estados, uma vez que muitos deles já os dirigiram. Daí, espera-se poucas mudanças no texto, sem risco de inviabilização. Mas será preciso conversar.
Se há uma constatação tirada dessa votação foi o pragmatismo do Centrão. O partido, que até o fim do ano passado estava no palanque do ex-presidente Bolsonaro, foi um dos principais fiadores de um projeto que – mesmo tendo iniciado em outras gestões – terá a chancela do presidente Lula (PT). Capitaneados pelo presidente da Câmara, Arthur Lira, os partidos entregaram votos mais do que necessários para consolidação da reforma.
Os aliados de Lira apresentaram suas demandas e tiveram resposta, sobretudo em liberação de emendas, mas, pelo histórico do grupo, ainda haverá outras, sobretudo por haver novos projetos de relevância na pauta de votação.
O Centrão, certamente, vai pedir mais ministérios ou postos estratégicos. O grupo já controla várias pastas, mas está de olho em estatais e empresas como a Embratur e os Correios, que são caros para seus pleitos eleitorais.
Formado nas trincheiras de São Bernardo, quando comandava greves enfrentando os barões do setor metalúrgico, o presidente Lula sabe gerenciar tais enfrentamentos, como ficou claro na reforma. Só não admite negociar com a faca no peito. O Centrão, também formado por profissionais da política, entendeu o recado e foi para a mesa de negociação. E como negócio bom é bom para os dois lados, a matéria passou.
A reforma é uma necessidade para o país. Adversário do presidente Lula, o governador Romeu Zema (Novo) deu a senha. Nas suas redes sociais destacou que “a alteração tributária brasileira no Congresso Nacional é um pequeno passo para resolver o manicômio fiscal que o brasileiro que trabalha, produz e paga impostos enfrenta. Independente do Governo da ocasião, o Brasil precisa de união e ainda tem muito que melhorar”.
Num cenário internacional instável, o país precisa se arrumar para os muitos desafios que a economia mundial vai apresentar. Hoje, como bem destacou o governador de Minas, é impossível fazer previsões no cenário anterior à reforma. Por isso, também tem razão em acentuar que ainda há muito a ser feito.