TransparĂȘncia do voto
O presidente teme pela segurança dos ministros ao exporem o seu voto, mas a sociedade precisa saber o que ocorre nos tribunais, salvo as exceçÔes
O presidente Lula pode ter fundadas preocupaçÔes com a segurança dos ministros ao defender o sigilo dos votos na principal corte de justiça do paĂs, mas nĂŁo Ă© a melhor alternativa para sanar o grave problema que afeta nĂŁo apenas os ministros, mas tambĂ©m aos demais atores polĂticos do paĂs, vira e mexe molestados em restaurantes e aviĂ”es por algum incauto inconformado com o voto ou posição adotada pela vĂtima.
No podcast âConversa com o presidenteâ, apresentado pelo jornalista Marcos UchĂŽa, Lula disse que âse eu pudesse dar um conselho, Ă© o seguinte: a sociedade nĂŁo tem que saber como Ă© que vota um ministro da Suprema Corte. Sabe, eu acho que o cara tem que votar e ninguĂ©m precisa saber. Votou a maioria 5 a 4, 6 a 4, 3 a 2. NĂŁo precisa ninguĂ©m saber foi o UchĂŽa que votou, foi o Camilo que votou. AĂ cada um que perde fica com raiva, cada um que ganha fica felizâ, afirmou. Foi apenas um conselho mas, partindo do chefe do Governo, soa como uma recomendação a ser considerada O presidente, no entanto, nĂŁo explicitou como esse processo seria desenvolvido.
Seja numa sentença ou num voto em plenĂĄrio, a transparĂȘncia tornou-se uma necessidade ante o princĂpio dos atos pĂșblicos. O sigilo do voto foi adotado em votaçÔes nas quais, geralmente, o interesse coletivo estava apartado ou, em casos extremos, para impedir algum tipo de retaliação, mas Ă© necessĂĄrio conhecer o voto e os argumentos adotados, sobretudo por muitos deles – dependendo do resultado – se tornarem jurisprudĂȘncia para as demais cortes.
Ao fim e ao cabo, o sigilo, em vez da segurança, tornou-se um instrumento de barganha e de acordos por baixo dos panos ante a impossibilidade de provas. O Ășnico voto a ser mantido sob pleno sigilo Ă© o que leva o povo Ă s ruas para eleger seus dirigentes. E por pequenos detalhes, como para impedir a pressĂŁo de grupos sobre a comunidade, como nos tempos de enxada e voto, nos quais os coronĂ©is do campo definiam o voto de suas regiĂ”es e quebravam o sigilo para assegurar que a ordem foi respeitada.
Como o presidente nĂŁo desceu a detalhes, Ă© possĂvel crer que tenha defendido o sigilo do voto apenas em situaçÔes especiais e nĂŁo na rotina dos tribunais. O Tribunal do JĂșri, por exemplo, Ă© secreto por claras razĂ”es de segurança dos jurados e pode se enquadrar em situação especial. No mais, as sentenças e as audiĂȘncias sĂŁo pĂșblicas, respeitadas as exceçÔes como os casos de famĂlia e dos costumes.
A politização do Supremo Tribunal, em vez do voto aberto, foi a peça inicial para as pressĂ”es sobre os magistrados. Eles nĂŁo se expĂ”em apenas no voto, mas tambĂ©m nas opiniĂ”es, o que incomum nas demais instĂąncias. Vira e mexe, um ministro do STF se antecipa ao voto e emite algum tipo de opiniĂŁo, embora, em princĂpio, devesse falar apenas nos autos. Ademais, inclusive por omissĂŁo dos demais poderes, o JudiciĂĄrio e o MinistĂ©rio PĂșblico ganharam um papel mais assertivo, o que fez deles tambĂ©m alvo de protesto das ruas, ao contrĂĄrio de outros anos em que a maioria da população sequer conhecia a composição de tais casas.