Governo de Minas anuncia ações para reduzir impactos da tarifa dos EUA nas exportações
Café mineiro fica fora da lista de exceções e setor deve ser um dos mais atingidos

Nesta quarta-feira (30), o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assinou decreto que amplia tarifas sobre exportações brasileiras. A nova medida acrescenta 40 pontos percentuais à cobrança atual, elevando a alíquota para 50%, com início previsto para a próxima quarta-feira (06).
A lista de exceções divulgada pelos EUA contempla 694 produtos, mas não incluiu o café, principal item exportado por Minas Gerais, que deverá ser afetado pela tarifa. Em resposta, o governador Romeu Zema reuniu cerca de 150 empresários na sede da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) para definir medidas emergenciais. A reunião contou com a participação da secretária de Estado de Desenvolvimento Econômico, Mila Corrêa da Costa, do secretário de Estado de Fazenda, Luiz Cláudio Gomes, do presidente do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), Gabriel Viégas Neto, e do presidente da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), Reynaldo Passanezi Filho.
Durante a reunião, o governador detalhou duas medidas iniciais para reduzir os efeitos da tarifa sobre os exportadores mineiros. A primeira é a monetização de créditos de ICMS acumulados pelas empresas, no valor total de R$ 100 milhões anuais. Segundo Zema, o acesso será simplificado para acelerar o socorro aos exportadores prejudicados.
A segunda medida é a criação de uma linha de crédito especial do BDMG no valor de R$ 200 milhões, com condições diferenciadas: taxa fixa de 0,9% ao mês, prazo de 60 meses para pagamento e carência de 12 meses. A instituição está finalizando os detalhes operacionais da linha, que deve ser disponibilizada nas próximas semanas.
O presidente do BDMG explicou que a prioridade será atender setores e empresas mais afetados. Já o secretário de Fazenda informou que acompanha a situação dos créditos acumulados e que ajustes poderão ser feitos se necessário.
Zema ressaltou que o governo estadual não tem poder para negociar tarifas diretamente com os Estados Unidos, competência exclusiva da União, mas afirmou que a administração estadual vai atuar para mitigar os impactos. Ele também destacou a importância da interlocução contínua com o setor produtivo e da busca por novos mercados para diversificar as exportações.
Exportações mineiras e setores atingidos
Os dados mais recentes mostram que Minas Gerais é o terceiro estado brasileiro em exportações para os Estados Unidos. Em 2024, as vendas externas somaram US$ 4,62 bilhões, considerando o valor FOB, que é o preço da mercadoria pronta para embarque ainda no Brasil. Entre os principais produtos exportados estão café e derivados, ferro fundido, ferro-ligas, transformadores elétricos, carnes bovinas congeladas e tubos de aço sem costura.
No caso do café, as exportações brasileiras para os Estados Unidos em 2024 atingiram quase US$ 2 bilhões, correspondendo a 16,7% do total embarcado. Deste valor, US$ 972.793.645 foram exportados por Minas Gerais. Em 2025, até o momento, o estado já exportou US$ 2,45 bilhões no valor FOB para o mercado norte-americano.
A Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham) calculou que os 694 produtos incluídos na lista de exceções correspondem a US$ 18,4 bilhões em exportações brasileiras no último período apurado, equivalente a 43,4% dos US$ 42,3 bilhões exportados pelo Brasil para os EUA em 2024. Isso significa que os demais 56,6% das exportações serão afetados pela nova tarifa, entre eles o café e outros produtos relevantes para Minas Gerais.
Hadad planeja novas negociações
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou na quinta-feira (31) que o governo brasileiro realizará uma nova rodada de negociações com os Estados Unidos para tratar da tarifa. Segundo ele, está prevista uma reunião com o secretário do Tesouro norte-americano, Scott Bessent, para apresentar a posição do Brasil e tentar reverter a sobretaxa.
“A assessoria do secretário Bessent fez contato conosco ontem e vai, finalmente, marcar a segunda conversa. Haverá agora uma rodada de negociações e vamos levar às autoridades americanas o nosso ponto de vista. Obviamente, vamos recorrer às instâncias devidas, tanto nos Estados Unidos quanto a organismos internacionais” afirmou Haddad, em entrevista na entrada do Ministério da Fazenda.
O ministro disse que, embora a decisão norte-americana tenha considerado alguns argumentos apresentados pelo governo brasileiro, ainda há necessidade de ajustes. Segundo ele, a medida atinge setores que não deveriam estar sendo afetados e que têm casos considerados dramáticos.
“Estamos em um ponto de partida mais tabulado do que se imaginava, mas longe do ponto de chegada. Há muita injustiça nas medidas que foram anunciadas ontem. Há correções a serem feitas, há setores afetados que não precisariam estar sendo atingidos. Alguns casos são dramáticos e deveriam ser revistos imediatamente”, completou.
Posicionamento de entidades
Café espera abrir margem para negociação
A Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic) considerou positivo o adiamento da vigência da tarifa para a próxima quarta-feira (06). A entidade avaliou que esse prazo adicional é importante para ampliar as negociações diplomáticas e destacou que a lista de exceções, mesmo sem incluir o café, mostra margem para futuras tratativas.
Já a Associação Brasileira de Cafés Especiais (BSCA) manifestou preocupação, ressaltando que os Estados Unidos são o principal mercado consumidor de cafés especiais do Brasil. Atualmente, cerca de 2 milhões de sacas desse produto são exportadas para aquele país, com receita anual superior a US$ 550 milhões. A entidade alerta que a taxação pode impactar toda a cadeia produtiva dos cafés de qualidade e pede diálogo para evitar perdas econômicas e sociais, preservando empregos e a parceria construída entre os dois países ao longo de décadas.
Carne bovina teme viabilidade econômica das exportações
Os Estados Unidos são o segundo maior mercado da carne bovina brasileira. Em 2024, foram exportadas 532 mil toneladas do produto, gerando receita de US$ 1,6 bilhão. A Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec) informou que a nova tarifa, somada à alíquota já existente de 26,4%, elevará a carga tributária total a mais de 76%, colocando em risco a viabilidade econômica das exportações.
A entidade explicou que, em 2024, foram enviadas 229 mil toneladas de carne bovina para os Estados Unidos e que havia expectativa de chegar a 400 mil toneladas em 2025. A Abiec declarou que mantém diálogo com as autoridades e defendeu a preservação do fluxo comercial com os EUA, que enfrentam atualmente o menor ciclo pecuário dos últimos 80 anos.
25% do minério será afetado pela tarifa
O Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) avaliou que 25% das exportações minerais brasileiras para os Estados Unidos serão afetadas pela tarifa. A ausência de produtos como caulim, cobre, manganês, vanádio, bauxita e algumas pedras e rochas ornamentais na lista de exceções preocupa o setor. Em 2024, as exportações minerais brasileiras para o mercado norte-americano somaram US$ 1,53 bilhão, equivalente a 4% do total do setor, sendo que 75% deste valor estão protegidos pelas exceções.
Setor madeireiro teme desemprego em massa
Já a Associação Brasileira da Indústria de Madeira Processada Mecanicamente (Abimci) alertou que a tarifa de 50% ameaça diretamente 180 mil empregos no setor, já responsável por destinar cerca de metade da produção nacional ao mercado norte-americano. A entidade informou que, mesmo antes da vigência da medida, empresas já enfrentam cancelamento de contratos, devolução de cargas, suspensão de atividades e concessão de férias coletivas.
Indústria descarta retaliações
A Confederação Nacional da Indústria (CNI), por sua vez, afirmou que a medida preocupa porque compromete cadeias produtivas, reduz a produção, ameaça empregos e investimentos e pode prejudicar contratos de longo prazo. A entidade defende o diálogo e descarta retaliações.
Plástico afirma efeitos na cadeia produtiva
A Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast) destacou que os efeitos da tarifa serão amplos e duradouros, afetando não apenas as exportações de produtos plásticos, mas toda a cadeia industrial que utiliza o plástico como insumo. Segundo a entidade, o material está presente em 95% do que é produzido no Brasil, incluindo embalagens de alimentos, componentes automotivos, sistemas de irrigação e logística. O presidente do conselho da Abiplast, José Ricardo Roriz, reforçou a necessidade de uma política externa pragmática e neutra para proteger os interesses brasileiros.
*Estagiária sob supervisão da editora Mariana Floriano