Sentindo como Kandinsky


Por MARISA LOURES

22/10/2015 às 08h35- Atualizada 28/10/2015 às 16h17

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Crianças da Escola Municipal Cosette de Alencar têm liberdade para criar durante as aulas semanais (Foto: Leonardo Costa)

Deficiente visual total, Adair Maciel Júnior, de 13 anos, recria Kandinsky a partir do que ele sente. “Tento imaginar algumas linhas e traçá-las. Sei que a obra dele começa com um ponto”, conta o menino, um dos 30 alunos participantes do projeto “Arte inclusão”, desenvolvido na Escola Municipal Cosette de Alencar e que integra a 7ª Mostra Estudantil de Arte e 11ª Mostra do Professor Também Faz Arte. Em cartaz a partir desta quinta, no Centro Cultural Bernardo Mascarenhas, a iniciativa segue até 10 de novembro com artes visuais, dança, música, apresentação de vídeos, literatura, contação de história e teatro.

Quando a Tribuna chegou à Cosette de Alencar, parte dessa turminha de artistas estava reunida em torno de uma mesa criando. Os trabalhos que ocuparão as paredes de uma das galerias estavam expostos no corredor, acompanhados do nome do autor em braille. Nas telas, saltava aos olhos uma profusão de cores e formas. A arte-educadora Rosana Nasser Barra, responsável pelo projeto – que atende, também, crianças e adolescentes com algum tipo de deficiência, entre as intelectuais e as relacionadas à visão -, foi enfática ao explicar o que em Kandinsky atraiu a atenção da garotada. “A questão da falta de limites para criar. Kandinsk usava as formas de uma maneira muito livre e buscava expressar mais os sentimentos e as emoções do que retratar a realidade através de uma obra figurativa”, diz ela, acompanhada pelos olhares atentos de seus pupilos.
Seguindo à risca os ensinamentos da professora, o pequeno Breno Silva Canalli, de 10 anos, logo deu demonstrações de que aprendeu tudo o que lhe foi ensinado e falou como um veterano na pintura. “Usei cores claras e vivas, como vermelho, verde, azul, preto e amarelo. Fiz o que eu sentia, assim como Kandinsk fazia”, dispara o menino. Mas o que você sentiu, Breno? “Muita alegria e felicidade”, revela ele, que, em seguida, saiu aos pulos por ter dado a entrevista. “Consegui falar, não esqueci nada.” Ao lado, quem também estava ansiosa para falar como gente grande era a pequena Maria Clara Almeida Santos, 10 anos.

“Faço todos os meus trabalhos com muito carinho, porque adoro aula de artes. No Dia das Crianças, pedi de presente um caderno de desenho e uma caixa de lápis de cor”, diz a garota, que também aprendeu a lição com o mestre do abstracionismo. “Senti felicidade e conforto ao criar”, sentencia. Um pouco mais tímida, Raphaela Ribas, de 13 anos, arrisca a dizer que não precisou de inspiração para fazer sua obra. “Algumas partes eu fui inventando, mas sabia que o Kandinsk ia pintando de ponto em ponto”, diz a menina.

Arte com amigos

Segundo Rosana, a ideia de recriar trabalhos de nomes conhecidos da arte é antiga. “Procuramos adequar a obra à necessidade do aluno. Com quem tem deficiência visual, por exemplo, fazemos atividades com textura. Escolhemos um artista famoso e trabalhamos tudo em relevo. Já recriamos Tarsila do Amaral, Portinari e Beatriz Milhazes”, comenta ela, orgulhosa dos resultados positivos da empreitada. É de seus alunos a adaptação do “Mônica Lisa”, quadro todo em relevo, que fez parte da exposição “História em quadrões”, organizada pelo cartunista e ilustrador Mauricio de Souza, no Museu de Arte Murilo Mendes. A ideia é que os visitantes pudessem sentir e tocar as texturas.
“Nosso sonho é tornar todas as obras dos museus de Juiz de Fora também acessíveis aos nossos alunos. Isso tudo começou porque levávamos as crianças ao museus, descrevíamos as cores, as formas, as pinturas, mas elas também queriam, através do tato, perceber, mesmo sem ver”, assevera a professora. Seu trabalho com o “Arte inclusão” não é oferecido como disciplina obrigatória, e qualquer tipo de resistência logo se desfaz de forma natural. “Eles vão educando o olhar através do fazer, e o crescimento é mágico”. E você sabe o que significa “Arte inclusão”, Breno? “Arte com amigos.”

Teatro, dança, literatura e discussão
Antes da abertura da exposição dos trabalhos de artes visuais e literatura da “Mostra professor também faz arte”, a partir das18h30 desta quinta-feira, os professores inscritos levarão para a Sala de Encenação Flávio Márcio, do CCBM, uma performance especial de dança, música e teatro. Já entre os dias 26 e 28 de outubro, os alunos que participarão da “Mostra estudantil de arte” apresentarão, alternadamente, das 8h às 10h e das 14h às 16h, números de dança, música, teatro e vídeo. Também dentro da Mostra do Professor, ocorre, de 3 a 5 de novembro, o “6º Ciclo de Palestras: Docência e Experiência Estética”. Os encontros serão realizados no Centro de Formação do Professor, e os interessados em participar podem efetuar a inscrição em www.eventioz.com.br/e/pjf.

 

7ª MOSTRA ESTUDANTIL DE ARTE

MOSTRA PROFESSOR TAMBÉM FAZ ARTE

Abertura nesta quinta-feira, às 18h30. De terça a sexta-feira, das 9h às 21h, sábados e domingos, das 10h às 18h. Até 10 de novembro

CCBM
(Av. Getúlio Vargas 200 – Centro)

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