Entrevista com Ana Carolina, cantora

Em Juiz de Fora, ela se descobriu cantora e se decidiu pelos palcos. Na cidade em que nasceu, Ana Carolina encontrou parceiros, formou seu gosto e seu público. Dos bares, encontrou a força que a impulsionou para cantar para plateias maiores. Em 1999, logo após sair de casa, viu sua voz ecoar na TV, na novela global “Andando nas nuvens”. A voz que saía da “Garganta” de Ana Carolina ganhou o país e o mundo. Ao longo de seus 15 nos de carreira, lançou dez álbuns, seis DVDs e vendeu mais de cinco milhões de discos. A dona da voz grave e extensão impressionante tornou-se gigante. Tanto que, em tempos de crise no mercado fonográfico, a artista lança o registro ao vivo de seu último trabalho, “#AC”, em álbum duplo e DVD.
“Talvez seja o melhor show da minha vida”, comenta a cantora no vídeo em que relata os bastidores da superprodução. Eletrônico e sem baterias, o disco ganha o palco com a ajuda de uma equipe de DJs, num cenário onde são reproduzidos vídeos criados pela cineasta Monique Gardenberg, que também dirige o espetáculo.
Após longos anos, Ana Carolina retorna a um palco de sua terra natal, na próxima sexta, às 22h, trazendo na bagagem o supershow, no qual revisita sucessos como “Pra rua me levar” e novos hits como “Pole dance”. Em entrevista à Tribuna, a cantora, aos 40 anos, se diz mais amadurecida e bastante ansiosa pelo regresso. Ao voltar, traz, também, o imenso respeito que conquistou com o público e com seus pares, que fizeram de sua casa uma espécie de templo da música, onde saraus históricos têm acontecido. Traz a emoção do contato com as raízes e com aqueles que alimentaram e fortaleceram o caule, como o músico Adilson Santos, segundo ela, um de seus muitos heróis.
Tribuna – Como é regressar a um palco de Juiz de Fora depois de tanto tempo?
Ana Carolina – É muito bom levar esse show. Nesse DVD, coloquei as canções de maior importância da carreira e duas outras que são novas em minha voz, como “Coração selvagem” e “Fire”. Foi uma trajetória longa e de muito sucesso. Sinto-me uma pessoa muito realizada e vitoriosa. Trago Juiz de Fora dentro de mim. Sempre me recordo das coisas que aconteceram em minha vida no tempo em que morei aí, e foi um bom tempo, afinal de contas, fui para o Rio de Janeiro com 24 anos. Aprendi a tocar aí, toquei na noite. De todo o meu repertório, para canções como “Garganta”, “Retrato em branco e preto” e “Beatriz”, que fazem parte de minha trajetória, inventei minha interpretação na cidade. Até hoje tenho amigos do Granbery, da noite e meus familiares. Nesse show, só da minha parte são cem convidados (risos).
– A casa onde mora hoje tem um pouco de sua casa aqui…
– Tem muito verde do lado, tem uma mata. Lembro-me muito de Juiz de Fora, do verde da cidade, dos lugares onde morei. Não queria morar perto do mar, adoro estar no Jardim Botânico.
– Qual é a sua relação com a cidade?
– Já fui inúmeras vezes a Juiz de Fora. Já passei Natal, uma semaninha, e estou muito contente em levar esse show. Levo a banda toda, cenários, tudo o que tenho feito desde a estreia. E isso é mais que merecido, até porque, essa é a minha cidade.
– E como essas facetas têm dialogado?
– É bom fazer várias coisas, porque dá um respiro entre um trabalho e outro e uma coisa alimenta a outra. Se fiz aquela canção, porque não mostrar a imagem que pensei ao escrever aquela letra? É uma coisa que fica muito autocentrada e controlada, mas, ao mesmo tempo, fica muito verdadeira.
– Na sua carreira, conseguiu, como poucos, equilibrar-se entre muitos perfis de público e espaço.
– O bom é fazer tudo o que quero. No “#AC” de estúdio, de onde saiu esse novo álbum ao vivo, tem uma parceria minha com o Guinga, “Leveza de valsa”, que depois fiz um videoclipe. É uma música supersofisticada, complicada, que está nesse disco, que também é popular. Esse trabalho tem canções que tocam na rádio e outras que não, são mais estranhas. A ideia é criar. Faz parte do criador ir fazendo sem a preocupação se as coisas vão chegar a um grande público ou não. Minha sorte é que, na maioria das vezes, chega a esse grande público que compreende. Fico muito contente por ter um disco com a participação do Chico Buarque, que é um cara supergeneroso e aceitou participar de “Resposta da Rita”, um pedido da (Maria) Bethânia muito importante para minha carreira, e, ao mesmo tempo, ter música na novela. Isso tudo faz parte do que sou.
– Ao longo de sua trajetória, conquistou muito respeito no meio e se firmou no mercado. Tem noção desse lugar que ocupa?
– Tenho noção até onde controlo, de onde comecei e até aonde cheguei. Mas quando chega o sucesso e a estabilização da carreira, parece que não é preciso fazer nada, mas é justamente aí que é preciso manter um trabalho conquistado com suor. Mais do que nunca, estou num momento maduro da minha carreira, com a ideia de melhorar cada vez mais.
– Muita coisa mudou desde que saiu da cidade?
– Percebo que sou uma pessoa que não desisto nunca, de nada. Sou insistente, persistente e levo tudo muito a fundo. Era uma menina sonhadora, que saiu de Juiz de Fora para o mundo. Quando cheguei ao Rio para lançar um disco, se ninguém tivesse me contratado, estaria cantando ainda. Não é só porque o sucesso chegou que continuei. Continuaria mesmo sem sucesso algum. Estaria tocando em bar até hoje, com muito orgulho. A questão é o amor pela música e pela feitura dela. Toda pessoa que cria canções tem prazer pelo artesanato de fazer, de pegar o papel e escrever a letra, tocar no violão. Isso jamais perdi.
– E isso surgiu como?
– Da menina que ouviu música pela primeira vez, adorou e disse: “Quero fazer isso”. Essa menina mantenho viva dentro de mim.
– Mas tinha referências para isso dentro de casa?
– Minha avó e minha tia eram cantoras. Pessoas na família tocavam instrumentos, como piano, violão, e acho que, daí, vim com isso. Na família do meu pai, de Belo Horizonte, também havia essa relação com a música.
– Hoje sua casa é um ponto de encontro da música no Rio de Janeiro.
– Muita gente legal já passou por lá. Já recebi, tocando piano lá, John Legend. Dos últimos, Preta Gil, Maria Gadú, Mart’nália e até Norah Jones. Muita gente. É uma alegria de viver esses encontros para compor, festejar a música, tocar violão. É o momento em que travamos parcerias, mostramos músicas inéditas para outros. Nunca vou parar.
ana carolina
Sexta, 22h
Las Rocca (Av. Deusdedit
Salgado 2400)