Aos 11 anos, soprano juiz-forana está em busca das grandes orquestras
Cantora lírica, Beatriz Guercio busca chamar a atenção de maestros como João Carlos Martins e André Rieu
Soprano aos 11 anos de idade, Beatriz Guercio tem encantado milhares de seguidores nas redes sociais e atingido públicos até mesmo internacionais. Com um repertório na música lírica em diversas línguas, a menina tem influenciado crianças pelo mundo todo e atraído olhares de integrantes de diversas orquestras. O talento, que vem desde os 5 anos, tem a possibilidade de atingir novos patamares em julho, quando Beatriz irá realizar seu terceiro recital em Campinas (SP), a convite da Associação Brasileira “Carlos Gomes” de Artistas Líricos (ABAL). Na mesma época, a cantora pode ter a oportunidade de ser ouvida pelo maestro João Carlos Martins, da Orquestra Bachiana Filarmônica SESI-SP, chegando cada vez mais perto do sonho de se inserir no universo das grandes apresentações líricas.

“Meu pai sempre colocava músicas líricas em casa e no carro para eu ouvir. Quando era menor, sempre quis cantar em orquestras, eu brincava com as minhas bonecas de cantar esse tipo de música”, conta Beatriz. Mesmo sem deixar de lado o gosto por músicas populares, como o pop americano, sua playlist favorita é realmente o clássico. “Gosto das cantoras Maria Callas, que foi a maior cantora da história, Sarah Brightman, que tem muita capacidade vocal e beleza na hora de interpretar as músicas, e a soprano brasileira Carmen Monarcha. Admiro o André Rieu porque ele viaja o mundo inteiro apresentando suas músicas alegres, dando oportunidade para muitos cantores. Além do João Carlos Martins, porque ele incentiva jovens talentos.”
Para aprimorar o talento e alimentar o sonho da menina, Beatriz iniciou nas aulas de canto aos 8 anos. Para ela, a facilidade de cantar é entendida como um dom. Sua extensão vocal atinge do Lá 2 ao Si 5, considerada muito abrangente para a faixa etária, podendo ampliar seu alcance à medida em que a voz for sendo trabalhada e as cordas vocais desenvolvidas. Mas, por conta da idade, a voz da cantora exige certos cuidados para evitar esforços excessivos, explica a professora e maestrina Patrícia Guimarães. “Tento não exigir muito volume agora, porque a caixa de ressonância dela é menor. Ela canta com microfone, mas é naturalmente lírica. Usamos a escola italiana, que trabalha mais com a voz da cabeça e usa o diafragma, que é o mais indicado para crianças”, destaca.
Entre tantas músicas que ensaia, sua favorita é a canção italiana “O mio babbino caro”, que interpretou em 2015 ao lado da Orquestra Sinfônica Mário Vieira, com regência do maestro Guto Cimino, no Cine-Theatro Central. Nos anos seguintes, ela interpretou ainda “Somewhere over the rainbow”, de Israel Kamakawiwo’ole, e “Les contes d’Hoffmann-Doll”, de Olympia de Offenbach. A cantora já tem seu repertório musical em cinco idiomas: português, italiano, inglês, latim e francês.
Segundo a professora, a facilidade de interpretar em diversas línguas acontece pela fácil percepção dos fonemas. “Ela tem um ouvido muito bom, o que é preciso para aprender línguas”, afirma Patrícia. O pai, Wilson, é descendente de italianos e também dá uma força. “Ele me ajuda na pronúncia de algumas músicas”, explica Beatriz. O próximo desafio será a língua alemã. “Mozart tinha 12 anos de idade quando compôs uma de suas obras, então quero muito que ela cante uma das áreas pela semelhança de idade”, diz a professora. Para o recital de julho, Beatriz vem ensaiando a “Melodia sentimental”, de Villa Lobos, compositor homenageado pela orquestra do maestro brasileiro João Carlos Martins.
Abrindo portas
Mas para uma criança se inserir na música lírica no Brasil não é nada fácil. Desde 2016, depois da primeira apresentação no Cine-Theatro Central em Juiz de Fora, a mãe Janine Guercio passou a enviar vídeos da filha para diversas orquestras. “Todos fecharam as portas. A primeira coisa que eles falaram era: não existe criança cantando lírico no Brasil, ou que não apoiavam crianças, só a partir dos 18 anos”, conta Janine. Até que em 2017, a menina foi reconhecida como soprano pela Associação Brasileira “Carlos Gomes” de Artistas Líricos. Para divulgar o talento de Beatriz, Janine também espalhou por rádios brasileiras uma versão da filha interpretando Ave Maria, do compositor Giulio Caccini. Hoje, a família batalha para chamar a atenção do maestro André Rieu, da Johann Strauss Orchestra.

“Quando ela começou a cantar, o que mais a incentivou foi assistir um vídeo de uma cantora holandesa que se apresentou com o André Rieu, e a Beatriz disse ‘se ela pode, eu também posso’. Então vimos que o maestro dá oportunidade para crianças fora do Brasil. Como ele possivelmente vem ao Brasil em turnê, começamos a entrar em contato, e quatro cantores do maestro começaram a seguir a Beatriz (nas redes sociais) e mandaram sugestões de música, falaram que ela tem chance, mas que precisa ser vista na mídia brasileira para justificar o convite dele ao palco.” O Instagram da cantora atinge mais de 11 mil seguidores, e, segundo a mãe, Beatriz é vista em cerca de 25 países, recebendo mensagens de incentivo de artistas da Rússia, Holanda, Espanha, Itália e Estados Unidos.
Para a maestrina Patrícia Guimarães, a resistência em incentivar essas crianças no Brasil tem muito a ver com a cultura do país. “A gente queria que o nosso país tivesse mais espaço para que meninos tão pequenos pudessem estudar. Na história da música, os corais de meninos cantores trabalham com técnica vocal bem segura. Acho que há falta de incentivo a esses espaços. Acredito também que existe um certo receio, porque é uma voz em formação, mas a voz é um instrumento como outro qualquer. Existe uma memória que o cérebro vai desenvolvendo, quando ela crescer, a técnica vai estar ali, é como aprender uma flauta, violão ou piano. A musculatura vai desenvolvendo, a voz pode mudar, mas a técnica continua. Se ela tem esse dom natural, tem que incentivar. Eu acredito que o André Rieu consiga olhar para ela e perceber um futuro de cantora.”