Escola de Juiz de Fora completa 70 anos como referência em educação inclusiva
Escola Estadual Maria das Dores de Souza mantém ensino de jovens e adultos com deficiência e amplia atuação com centros de capacitação e equipe multiprofissional

A Escola Estadual Maria das Dores de Souza completou 70 anos de existência. Desde que a primeira diretora (que hoje dá nome à instituição) assumiu o cargo, o espaço funciona com um foco: proporcionar a experiência de ensino completa para os alunos de educação inclusiva. Para fazer isso, é claro, foi preciso de um esforço contínuo em busca de conhecimento, investimento e capacitação para atender aos estudantes, principalmente em épocas em que pessoas com deficiência ainda eram mais marginalizadas dentro da sociedade. Ao longo de toda essa história, também as necessidades do público se alteraram e surgiram demandas por novas adaptações para que a escola continuasse tendo a mesma relevância para toda Juiz de Fora. No aniversário deste ano, o corpo docente conta à Tribuna como o foco no ensino de jovens e adultos alterou as perspectivas e de que forma os centros de capacitação dão extensão e continuidade a esse legado.
Durante as primeiras décadas de funcionamento, o espaço tinha o foco em crianças e adolescentes em idade de escolarização que convivessem com deficiências, e chegou a ter cerca de 700 alunos matriculados. Mas, a partir da Lei de Inclusão, regulamentada em 2015, todas as crianças e adolescentes passaram a ter direito de estudar em escolas regulares, que devem garantir acessibilidade e apoio especializado quando necessário – valorizando, inclusive, a convivência escolar e quebrando barreiras pedagógicas. Como explica o diretor escolar Wupp Derbotoli, esse foi um momento de mudança na abordagem da escola. “Com a lei, que é fundamental para os meninos em idade de escolarização, continuamos o funcionamento como EJA, para quem é mais velho e ficou sem escolarização”, explica.

Atualmente, a escola oferece turmas de Ensino Fundamental a partir dos 15 anos de idade e de Ensino Médio a partir dos 18 anos, somando 110 alunos com deficiências intelectuais. São apenas 23 escolas como essa em todo o estado. “Nossa demanda de alunos é demanda de porta, porque nossos alunos não estão na idade de escolarização”, explica o diretor. Esse, pra ele, é um dos principais desafios, porque apesar de existir um público grande que pode se beneficiar do ensino oferecido pela escola, nem todos sabem do funcionamento. “É muito bacana, porque temos alunos de idades variadas, entre 40 e 60 anos, por exemplo. Temos uma turma que está sendo alfabetizada agora, aprendendo a escrever o nome pela primeira vez. Trabalhamos com um público que, em um passado muito recente, era marginalizado. Muitos dos nossos alunos também são oriundos dos antigos manicômios e, às vezes, entraram nessas instituições muito crianças”, explica Wupp.
Além desses alunos, a escola também tem trabalhado com outras frentes: o Centro de Referência de Educação Inclusiva (CREI), que trabalha exclusivamente com formação dos professores da rede do estado; o Centro de Atendimento aos Surdos (CAS), que está em fase de implementação e vai atender à comunidade surda de Juiz de Fora e região; e ainda a equipe multiprofissional, que é composta por fisioterapeuta, assistente social, psicóloga e fonoaudióloga, com todos dando suporte para a rede através do serviço de apoio à inclusão (SAI). Para Ari Campos, fisioterapeuta que já trabalha no local há 22 anos, é esse cuidado que envolve tantas frentes e que se preocupa com a qualidade de vida do aluno que realmente faz a diferença. “A gente vê a mudança no rosto dos alunos que chegam aqui. Temos ex-alunos que hoje estão trabalhando e que se conheceram aqui e se casaram, por exemplo (…) Só a forma de cortar o papel já é uma mudança que importa pra gente”, diz.
Conhecimento e acolhimento

Se duas palavras pudessem descrever o que o corpo docente acredita que é o diferencial da instituição, certamente seriam conhecimento e acolhimento. É o que a coordenadora do CREI, Mariane Oliveira, acredita que é “o ideal para o ensino de toda pessoa com deficiência”. Atualmente, são 136 bolsistas da rede se capacitando através de um dos cursos oferecidos, com demanda que continua crescendo e todos os profissionais da escola já têm a formação em educação especial.
Da mesma forma, a psicóloga Tainara Almeida acredita que esse alinhamento entre os setores traz muitos benefícios, que começam a ser vistos inclusive na interação dos alunos entre eles e na procura pelas oficinas pedagógicas, que lá são oferecidas no contraturno da escolarização deles, com atividades de artesanato, informática e culinária. “Eles chegam aqui e precisam se acostumar a ter uma rotina toda diferente. Esse trabalho engloba a interação social, que muitos aqui não tinham. É um cuidado com a saúde mental como um todo”, diz.
Mudanças para a vida
O que se aprende dentro da Escola Estadual Maria das Dores de Souza, no entanto, está longe de ficar restrito ao espaço de ensino. Os efeitos são sentidos para muito além do muro das escolas, como percebe o diretor. “Qualquer ganho pedagógico ou de autonomia para esses meninos é muito substancial, seja para eles próprios ou para as famílias. Vemos casos de alunos que passam a se alimentar sozinhos, tomar banho sozinhos, aprendem a dar um troco ou pegar um ônibus. É realmente um universo que se abre”, conta Wupp.
Também é o que percebe Priscila Silva, especialista em educação da escola, que vê de perto a importância em promover os alunos como protagonistas ao longo de toda essa história. ”Valorizamos os alunos. Tentamos ao máximo ver o que eles precisam, as habilidades que eles têm e as suas vivências para desenvolver as atividades pedagógicas. Queremos que o conhecimento seja útil para o dia a dia deles”, diz.