Patrimônios de Juiz de Fora sofrem com falta de manutenção e risco de deterioração
Tribuna registrou danos no telhado do Hotel Minas, pichação no Cine-Theatro Central, abandono das ruínas do Palacete Fellet, manchas pretas na torre da Praça da Estação e abandono no Solar dos Colucci

Os bens históricos de uma cidade são a referência a respeito do seu passado. Mas para um patrimônio tombado perdurar e continuar tendo um papel relevante ao longo dos anos, é preciso ter um alinhamento entre poder público, população e o setor privado. Em Juiz de Fora, há diversos pontos que, mesmo após terem passado pelo rigoroso processo de serem reconhecidos como parte da identidade cultural da cidade, sofrem com falta de manutenção, descaso e risco de deterioração. Para a última matéria da série Nosso Patrimônio, a Tribuna resolveu abordar os desafios relativos à preservação desses imóveis e registrou problemas na conservação de cartões-postais da cidade. Foram flagrados, neste mês de agosto, a situação do telhado do Hotel Minas, a pichação do Cine-Theatro Central, o abandono das ruínas do Palacete Fellet, as manchas pretas na torre da Praça da Estação e a deterioração do Solar dos Colucci.
Os desafios para preservação do patrimônio envolvem definir os papéis do poder público e da comunidade, além de considerar a ação que a especulação imobiliária pode desempenhar. É o que explica a professora de Arquitetura da Uniacademia, Mila Andreola, principalmente sobre os casos que se tornam mais problemáticos, em que há dificuldade de preservação mesmo após o tombamento, e não se forma uma cultura que respeite a importância desses espaços. “A relação dos proprietários particulares com o tombamento pode ser um pouco negativa. (…) O poder público é corresponsável pelo imóvel. O proprietário continua sendo responsável e precisa ter a manutenção diária do bem, arcando inclusive com os custos de uma reforma. Muitas vezes, a pessoa não tem condição de fazer isso ou consegue chegar a um acordo com o poder público.”
Por isso, ela também entende que o processo de tombamento precisa ser feito de uma maneira que, de fato, valorize os bens, deixando claro quais são os deveres e direitos do proprietário. “Temos como prerrogativa da Constituição de 1988 que a população atua junto com o poder público para a preservação do patrimônio, seja essa população composta pelos proprietários ou usuários da cidade”, afirma. Essa vigilância pode ser feita observando as irregularidades, como as citadas nesta matéria, fazendo a denúncia e a cobrança da fiscalização. O mais importante, em sua percepção, é o reforço de uma cultura educacional de valorização desses espaços, para que inclusive a população não pratique atos danosos (como é o caso da pichação) e ajude a coibi-los.
Papel da população

O professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) Marcos Olender também entende que ser cidadão é se reconhecer efetivamente nos territórios habitados, e é justamente por isso que é tão importante manter as referências histórico-visuais mesmo em contextos de desenvolvimento urbano e territorial. “A população é fundamental no zelar cotidiano dessas referências histórico-culturais, e até em pensar como preservação, porque são essas pessoas que convivem com esses bens que são suas referências.”
Para ele, isso está relacionado com a necessidade de um planejamento urbano responsável e com a qualidade de vida dentro das cidades — em uma realidade na qual as mudanças climáticas também têm afetado esses imóveis. “Estamos vivendo em uma cidade com o solo urbano em maior parte impermeabilizado, com uma verticalização sem planejamento e que provoca um sombreamento excessivo. Tudo isso também provoca o aumento desordenado da densidade demográfica e colabora com a continuidade das ameaças de agravo das mudanças climáticas”, diz. “Mas o caminho para reverter isso também pode estar alinhado a um cenário de preservação. A preservação do patrimônio auxilia na manutenção de áreas de respiro, melhor circulação do ar e da água e condições mais saudáveis de vida.”
Funalfa afirma que há projetos de conservação em andamento

Ao ser questionada pela Tribuna, a Fundação Cultural Alfredo Ferreira Lage (Funalfa) informou que o projeto de restauração do telhado do Hotel Minas já foi aprovado pelo Conselho Municipal de Proteção do Patrimônio Cultural (Comppac). Também afirmou que o Cine-Theatro Central já possui projeto de pintura em andamento, e a situação do Palacete Fellet segue em tramitação judicial. Já as manchas observadas na torre da Praça da Estação decorrem de poeira asfáltica e umidade, mas serão avaliadas em conjunto com a Defesa Civil.
Sobre o Solar dos Colucci, a Funalfa afirmou que a Santa Casa de Misericórdia é responsável pelo imóvel e já foi notificada diversas vezes sobre a conservação do imóvel. A reportagem entrou em contato com a assessoria da Santa Casa, mas não teve resposta até o fechamento desta edição.
Quanto à manutenção de bens tombados, a Funalfa esclareceu que “a responsabilidade primeira é sempre do proprietário do bem, cabendo ao poder público atuar na fiscalização, análise de projetos e orientações técnicas, bem como em eventuais parcerias e editais específicos para preservação”.
Tópicos: dia do patrimonio