Juiz-foranos relatam problemas para doar sangue no Hemominas
Redução no horário de atendimento, aumento do tempo de espera e diminuição do lanche fornecido têm incomodado doadores
A redução do horário de atendimento no Hemominas e o consequente aumento do tempo de espera dos doadores têm causado insatisfação aos voluntários da instituição. Os problemas estruturais e a precarização do apoio às pessoas que precisam de um lanche reforçado após a coleta, mas que têm recebido apenas biscoito e água, têm dificultado a realização dos procedimentos. Segundo o Sindicato dos Trabalhadores da Saúde de Minas Gerais (Sind-Saúde MG), a situação já tem impactado a coleta de sangue, fator que pode levar à diminuição dos estoques estratégicos da unidade, prejudicando um serviço essencial que atende a 27 cidades da região.
Atualmente, o atendimento à população tem sido feito apenas no turno da manhã, entre 7h e meio-dia, de segunda a sábado. Até a alteração, em agosto, a instituição atendia das 7h às 17h nos dias úteis e das 7h às 11h aos sábados. Com isso, a carga horária de atendimento, que era de 54 horas semanais, foi reduzida para 30 horas por semana, para receber doação de sangue e realizar cadastro de medula. A alteração, segundo a coordenação do Hemocentro, ocorreu devido à queda no número de profissionais que trabalham na unidade.
Diretor estadual do SindSaúde-MG e também servidor da unidade, Fabiano Ponciano avalia que a mudança no horário impactou na coleta e no estoque de sangue da unidade. “Se pegarmos os dados de coleta, referentes a tempo de atendimento de uma ficha para outra, da época anterior à mudança, e de agosto pra cá, vamos verificar que aumentou o tempo de espera. Além disso, o estoque reduziu bastante. Foram implementados alguns postos de coleta, e com isso melhorou um pouco, mas ainda está faltando sangue”. Conforme o diretor do sindicato, a unidade não tem conseguido manter o estoque estratégico com margem de segurança. “Precisamos manter o estoque porque o Hemocentro de Juiz de Fora tem, entre agência e assistência, 58 contratos”, pontua.

Demora no atendimento e falta de assistência
Os doadores relatam terem sentido o impacto das mudanças e consideram que houve precarização no atendimento. A autônoma e doadora voluntária Tatiana Déde observou grande número de pessoas aguardando o procedimento nas últimas duas vezes em que esteve na instituição. “Na penúltima vez que fui doar, acabei desistindo, apesar de já ter feito a triagem e o lanche. Estava demorando muito e não pude esperar mais tempo”. Segundo ela, após a redução do horário de atendimento, a sala de espera do Hemocentro tem ficado lotada. “As pessoas têm de esperar bastante tempo. Dessa última vez que doei, aguardei por quase três horas”, conta.
O mesmo problema foi constatado pela profissional de marketing Milca Gouveia Andrade. Ela conta que o marido organizou um mutirão para doação no último dia 15, mas muitas pessoas enfrentaram problemas para fazer a doação. “Minha sogra fez uma cirurgia e precisou de sangue. Então muitas pessoas estiveram na unidade”. Segundo ela, como muitas pessoas foram doar sangue na data, com a redução do horário, a concentração e a demora para atendimento fizeram com que muitos passassem mal. “Lá não tem estrutura para muita gente, pessoas passaram mal, algumas desmaiaram. Só ofereceram bolacha com água, e não tem assistência para as pessoas porque a fila é enorme”, disse.
Milca também acredita que a redução no horário de atendimento pode levar as pessoas a desistirem de doar. “O horário de doação ficou muito restrito. Quem trabalha, muitas vezes, não consegue sair do emprego para ir lá. Só quem passa pela situação vê como está a estrutura do lugar, infelizmente, muito precária.”
Lanche reduzido
A falta de um lanche reforçado também é um problema para os voluntários. De acordo com os relatos, o lanche anteriormente servido na unidade era composto por pão ou brioche, biscoito, doce, ovo cozido ou fruta e suco. No entanto, agora estariam sendo distribuídos biscoitos do tipo água e sal e água. “Quero ressaltar que eu não vou doar para comer. O doador precisa ir ao Hemominas já alimentado. Mas o lanche servido é para ser um reforço para a pessoa que acabou de doar não passar mal. Sou doadora há 20 anos e nunca tinha observado a situação da forma que está. A estrutura está muito precária”, expõe Tatiana Déde.
Conforme a doadora, que esteve na unidade no dia 27 de dezembro, outras adversidades dificultaram o procedimento de quem foi doar sangue. “A água do bebedouro, disponibilizada para os voluntários, estava morna. Não dava para beber, porque estamos em um período de muito calor. Com isso, muitas pessoas ficaram desidratadas e passaram mal. No período da manhã, em que fiquei aguardando para doar, cinco pessoas passaram mal devido a essas circunstâncias.”
Na avaliação do diretor do SindSaúde-MG, Fabiano Ponciano, a redução no lanche servido tem causado impacto. De acordo com ele, houve aumento no número de pessoas com reação durante o atendimento. “Aumentou o número de pessoas que passam mal, o que é até esperado. O calor é intenso, tem pouca hidratação, o lanche está reduzido. Alguns criticam quando reclamamos da diminuição do lanche, dizem que a pessoa deve ir alimentada de casa, e deve mesmo. Mas muitos não entendem a motivação da nossa reclamação. É um cuidado com aqueles que estão doando. Se alguém acha que pode doar quase meio litro de sangue e ficar sem um reforço (na alimentação) está enganado. Muito gente passa mal.”
Instituição nega impacto no número de doações
Em nota encaminhada à Tribuna, a Fundação Hemominas explica que a alteração do horário de funcionamento “foi realizada de forma estudada e estruturada e não impactou nas metas da unidade”. No posicionamento, a Fundação informa ainda que foram elaboradas medidas alternativas para se assegurar os estoques de sangue, como “coletas externas e instalação de Postos Avançados de Coleta em Leopoldina, Muriaé e Barbacena, coleta externa semanal em Cataguases e no Hospital Cristiano Varela”.
Segundo a instituição, tais providências têm se mostrado efetivas, “uma vez que no período de 1º de agosto de 2018 a 30 de novembro de 2019, a média de cadastramento de doadores foi semelhante a dos anos anteriores. As dificuldades relativas à manutenção dos estoques referem-se a tipos sanguíneos específicos e situações pontuais e mostram-se presentes em toda a rede.”
Sobre os atrasos e demora no atendimento relatados pelos doadores, a Fundação afirma que, com “relação ao atendimento aos pacientes no ambulatório, o critério observado é a marcação prévia de horários, sendo que eventuais atrasos podem ocorrer devido à complexidade clínica. A instituição está atenta, trabalhando de forma a reduzir o tempo de espera e garantir o atendimento a todos os pacientes agendados.”
Com relação à reclamação da doadora Tatiana Déde, sobre a água disponibilizada nos bebedouros, a Fundação Hemominas informa ainda que “não há registro da necessidade de manutenção nos bebedouros da unidade, que funcionam normalmente”. De acordo com a instituição, o que poderia ter ocorrido “é que o aumento na procura por hidratação, devido ao calor, pode ocasionar a demora no resfriamento da água”.
Em referência à reclamação de redução do lanche, a Fundação Hemominas informa que “houve a regularização do fornecimento da maior parte dos itens que compõem o lanche do doador e que, até o final da próxima semana, o fornecimento de todos os itens será normalizado no Hemocentro Regional de Juiz de Fora”. A instituição, no entanto, não informou por qual razão a redução teria acontecido.
Cirurgias eletivas
Em novembro do ano passado, o Hemocentro de Juiz de Fora enviou comunicado aos hospitais conveniados da região orientando a suspensão temporária de cirurgias eletivas. Segundo a Fundação Hemominas, à época, a medida se deu em virtude da queda dos estoques de sangue do grupo sanguíneo O (positivo e negativo). A interrupção, no entanto, foi suspensa. De acordo com a fundação, o episódio foi o único em 2019.
Ainda em nota, a instituição esclarece que a suspensão foi em relação aos pacientes com o tipo sanguíneo. O (positivo e negativo). “A suspensão não se deu de forma generalizada, mas pontual, sendo reestabelecidos os procedimentos após dois dias. No momento da suspensão, toda a Fundação Hemominas enfrentava problemas com estoque, e a unidade de Juiz de Fora passou ainda por curta paralisação de parte dos servidores em razão de greve, o que justificou a medida. Não tivemos até o presente momento qualquer outra situação que demandasse tal medida.”