Sistema carcerário de Juiz de Fora registra mais de 40 casos de tuberculose
Conforme a Sejusp, há casos nas penitenciárias José Edson Cavalieri e Ariosvaldo Campos Pires, além do Ceresp
O sistema carcerário de Juiz de Fora tem 42 presos com tuberculose, conforme levantamento da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp), divulgado primeiramente pelo jornalista Matheus Brum e confirmado pela Tribuna. A penitenciária José Edson Cavalieri possui o maior número de registros, com 27 casos, seguida da Penitenciária Ariosvaldo Campos Pires, com 11 pessoas diagnosticadas com a doença, além de quatro ocorrências no Centro de Remanejamento do Sistema Prisional (Ceresp).
A reportagem voltou a questionar a Prefeitura de Juiz de Fora sobre a adesão à Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional (PNAISP), do Governo federal e aguarda um retorno. Em outubro de 2024, em matéria sobre as demandas de saúde no complexo penintenciário juiz-forano, a Administração Municipal afirmou que “não foi identificada a necessidade de aderir a esse plano, pois já existe cobertura para essa população, sem prejuízos”. O programa forneceria verba de incentivo e facilitaria o acesso à saúde no sistema prisional, com potencial para uma progressão do SUS na cidade como um todo.
![Sistema carcerário de Juiz de Fora registra mais de 40 casos de tuberculose 1 Presidi Penitenciaria ariosvaldo campos pires Felipe Couri](https://tribunademinas.com.br/wp-content/uploads/2024/10/Presidi_Penitenciaria-ariosvaldo-campos-pires-Felipe-Couri-700x467.jpg)
À Tribuna, a Sejusp informou como funciona o protocolo a partir do momento que um detento é diagnosticado com a doença. Em um primeiro momento, ele é avaliado pela equipe do Núcleo de Saúde da unidade prisional, que decide se há a necessidade de isolamento – pois, conforme frisa a pasta, após o terceiro dia de uso das medicações, não haveria mais risco de transmissão.
“Os parentes cadastrados como visitantes são avisados por servidores do setor de Serviço Social sobre a possibilidade de realização da visita. As visitas são orientadas, caso apresentem sintomas da doença, a procurar a rede de saúde mais próxima, pois o contato pode ter sido realizado antes do diagnóstico”, informou a Sejusp em nota. Quanto à segurança dos policiais penais, a informação prestada à reportagem é que eles são orientados a realizar procedimentos de segurança, como o uso de máscara e luvas.
Na perspectiva do médico infectologista Marcos Moura, membro da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), o sistema carcerário pode funcionar como uma encubadora da doença, uma vez que o ambiente fechado, com más condições de higiene, saneamento e com muitas pessoas no local, criam uma condição de insalubridade e, também, de transmissão da tuberculose. Conforme revelado em reportagem da Tribuna publicada na última semana, o Ceresp chegou a comportar 29 detentos em uma única cela em janeiro de 2025.
![Sistema carcerário de Juiz de Fora registra mais de 40 casos de tuberculose 2 Ceresp, instituição parte do sistema carcerário de Juiz de Fora. Foto de Fernando Priamo](https://tribunademinas.com.br/wp-content/uploads/2022/06/CERESP-fernando-priamo-700x467.jpg)
“Contaminam vários ao mesmo tempo”, diz médico sobre tuberculose nas penitenciárias
“Uma pessoa que tem tuberculose e tosse contamina vários ao mesmo tempo”, explica Moura, à medida que ressalta a importância da ventilação para impedir a transmissão da doença, que pode ser extremamente grave. “É muito importante que a pessoa que está tossindo seja isolada, porque quando ela tosse, elimina, além das gotículas, aerossóis que ficam muito tempo no ar. O ser humano pode se contaminar mesmo que a pessoa que seja um tossidor não esteja lá”, explica o médico sobre o processo de transmissão da doença.
Moura reforça, ainda, que os profissionais também passam a correr risco de infecção, uma vez que estão expostos a pessoas potencialmente contaminadas. Neste caso, é necessário fazer o uso de máscaras PPF2 ou N95. A reportagem perguntou à Sejusp qual tipo de Equipamento de Proteção Individual (EPI) está sendo utilizado pelos servidores do sistema carcerário, mas não obteve retorno até o momento de publicação desta matéria.
No processo de cuidar do paciente infectado há, ainda, os casos da tuberculose multirresistente – aquela que não é combatida com determinados medicamentos, uma vez que a bactéria cria resistência a eles e que, por isso, pode levar a doença a um nível de periculosidade maior e mais prolongado. Para o médico infectologista entrevistado pela Tribuna, a complicação da doença está ligada à falta de acolhimento da pessoa contaminada, seja pelo serviço público não enxergar a vulnerabilidade, ou pela pessoa estar acautelada, em situação de rua ou imunossuprimida pelo HIV. A tuberculose, que a princípio seria de atendimento da atenção primária, nesses casos, vai culminar na secundária e, até mesmo, na terciária, em casos cada vez mais complexos.
PJF recusou verba para saúde no sistema carcerário
O caso do sistema carcerário juiz-forano volta a chamar atenção sobre a recusa da PJF em aderir à Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional, programa que poderia garantir verba para a saúde no sistema carcerário, conforme matéria publicada em outubro do último ano. O executivo avaliou que não havia necessidade de credenciamento junto ao Governo federal.
A medida também poderia garantir uma progressão do SUS da cidade como um todo, uma vez que, com o controle de doenças como a tuberculose, HIV/AIDS e outras doenças causariam a diminuição de custos para problemas mais graves enviados ao Hospital de Pronto Socorro Dr. Mozart Teixeira (HPS). Com o PNAISP, Juiz de Fora poderia receber recursos federais mensais para compor o financiamento das redes de atenção à saúde de acautelados.
Debate internacional sobre doenças transmissíveis no sistema carcerário
O aumento da incidência da doença sobre os detentos de Juiz de Fora acontece no mesmo momento em que o país sediou a “reunião para catalisar a eliminação de doenças transmissíveis em contextos de privação de liberdade na América Latina”, em São Paulo. O evento, que ocorreu nos dias 12 e 13 de fevereiro, contou com a participação de outros 17 países da América Latina, bem como da Organização Pan Americana de Saúde (OPAS) e o Governo do Brasil, por meio do Ministério da Saúde (MS).
Acontece também, no próximo mês, a celebração do Dia Mundial de Combate à Tuberculose, data que busca desenvolver a conscientização das pessoas sobre a doença, uma causa que determinados setores da sociedade civil ainda lutam para propagar, sobretudo na proteção de pessoas em vulnerabilidade social, acauteladas e imunossuprimidas.
Tópicos: juiz de fora / sistema carcerário / tuberculose