Insegurança afugenta frequentadores da Praça dos Três Poderes
Apesar de haver legislação que incentive parceria para cuidar das praças da cidade desde 2015, nenhuma delas foi “adotada” ainda. Shopping no entorno do Largo do Riachuelo demonstra interesse em colaborar com a melhoria da área, onde têm sido frequentes casos de furtos, roubos, prostituição, uso e tráfico de drogas
A Praça dos Três Poderes, também conhecida como Praça do Riachuelo, há tempos vem deixando de ser um espaço para convivência e recreação. Apesar de ser uma das principais praças da área central, traz marcas de abandono que afugentam os frequentadores e tornam o logradouro público um lugar de passagem, onde delitos são cometidos a qualquer hora. Ao mesmo tempo, por sua localização, a praça é referência para quem vem de fora e não consegue voltar para sua cidade natal, fazendo aumentar o número de moradores em situação de rua. O local compõe uma das 165 praças de Juiz de Fora que não foram adotadas, mesmo após a sanção da lei, em 2015, que propõe a parceria entre Município e sociedade para que esses lugares sejam cuidados e conservados.
A Tribuna analisou os Registros de Eventos de Defesa Social (Reds), de 1º de janeiro a 31 dezembro de 2017, e constatou que cerca de 70 ocorrências registradas neste período citam a Praça dos Três Poderes em seu histórico de descrição do fato. Com a análise, é possível perceber, em números, o que acontece no dia a dia, como uso e venda de entorpecentes, principalmente o crack, prostituição e casos de roubos e furtos. Também dá para perceber que o local é utilizado para venda de produtos furtados. Do total das ocorrências, pelo menos, oito são referentes ao tráfico de drogas, três a roubos, sete a furtos, uma de lesão corporal e sete de operações policiais que tiveram como objetivo combater a criminalidade. Os outros casos são referentes à localização de foragidos da justiça, averiguação de pessoa ou veículo suspeito, desobediência, receptação e ameaça.
Situação de degradação
O problema, percebido de forma aguda na Praça dos Três Poderes, não raro é encontrado em outras praças do Centro, como o Parque Halfeld, Antônio Carlos, Menelick de Carvalho e Praça da Estação, o que coloca esses locais entre as prioridades da Polícia Militar. A corporação tem adotado a medida de tolerância zero, com ações diárias, para devolver aos locais a tranquilidade de outrora. Todavia, a situação vai além do que pode fazer a PM e requer intervenções com viés social. No caso da Praça dos Três Poderes, que serve de reflexo para as outras praças da região central, não é de agora que essa situação de degradação é observada por quem trabalha ou mora no entorno. Conforme eles, os problemas são antigos e vêm piorando com o passar do tempo, ultrapassando os limites da praça, uma vez que se estendem para a vizinhança.
O aumento de pessoas em situação de rua ocupando esses espaços também merece atenção, deixando evidente a necessidade de iniciativas do Poder Público, com a finalidade de dar a elas uma chance de resgatarem a dignidade e uma nova chance de vida. São homens e mulheres e até crianças que passam o dia e a noite nas praças e, para viverem, acumulam cobertores, papelões, vasilhames e lixo. Até fezes podem ser encontradas ao redor. Fato que é visto de forma negativa para o restante da população, que passa a desejar a retirada dessas pessoas dos locais.
Registros até de homicídios nos últimos anos
Essa não é a primeira vez que a Praça dos Três Poderes é abordada em reportagens da Tribuna. Ao longo dos anos, o logradouro foi pauta de diversas matérias. A mais grave aconteceu em 2015, quando um adolescente, de 17 anos, foi baleado na cabeça, na Rua Jarbas de Lery Santos, em frente à praça. O crime aconteceu em 8 de junho, e a vítima não resistiu, falecendo cerca de sete horas depois. O fato chocou a população naquele ponto que é um dos mais movimentados da cidade. Em julho do ano passado, um morador em situação de rua foi esfaqueado no tórax na praça e, dois dias depois, três moradores na mesma situação ficaram feridos em uma briga. Naquela época, a Guarda Municipal, com apoio da Empav, fechou com cadeados os portões de acesso ao Monumento das Armas, com o objetivo de proteger o patrimônio da ação de vandalismo e do uso permanente por pessoas em situação de rua. Mas, atualmente, o local voltou a servir de moradia e ponto para encontros sexuais.
No último dia 6, a alguns metros da praça, próximo ao cruzamento da Rua Benjamin Constant com a Roberto de Barros, um jovem, 22, foi morto a facadas. Segundo a PM, o crime aconteceu depois de a vítima ter ido a um bar com um amigo cobrar a devolução de um celular que teria sido furtado. O jovem foi atingido por cinco golpes, sendo quatro deles nas costas e outro no tórax. No último dia 8, uma mulher, 47, ficou ferida no rosto e precisou ser internada no HPS após sofrer agressão num assalto, durante a madrugada, na Rua Jarbas de Lery Santos. Ela teria sido rendida por três criminosos que roubaram sua bolsa, e um suspeito, 35, acabou preso em flagrante.
“Tem muita droga rolando na praça, brigas acontecendo durante o dia. Eu trabalho no shopping e, na hora do meu almoço, não posso sentar lá, porque, além da sujeira, tenho medo. Costumo sair da loja por volta das 19h30, e o local fica bem barra pesada”, diz uma vendedora, de 37 anos. O dono de uma lanchonete, 57, que tem o ponto no local há 13 anos, afirma: “Infelizmente, quem tem comércio aqui ao redor não tem sossego. Ocorrências de briga são constantes, e isso afasta as pessoas dessa região, o que prejudica muito o comércio. Para melhorar, é preciso uma limpeza, porque a praça está bem abandonada. Também é necessário que o setor de assistência social olhe por essas pessoas que ficam aqui o dia inteiro. A impressão que tenho é que, quando entramos lá, estamos invadindo o espaço deles, e isso inibe os frequentadores.”
“A polícia vem aqui direto, mas não adianta, porque a situação sempre volta logo depois que os policiais vão embora. É preciso policiamento fixo. Essa situação prejudica, sim, as nossas vendas, porque a área é tida como insegura”, avalia a vendedora de uma loja de vestuário feminino, 31. Ela ainda acrescenta: “Infelizmente, já vi adolescentes se prostituindo na praça. Elas costumam chegar por volta das 18h. Sempre trazem uma garrafa de vinho ou pinga. É uma tristeza!”. Uma estudante universitária, 23, que costuma pegar ônibus na Rua Jarbas de Lery Santos chama a atenção para os riscos aos pedestres. “O fato que considero grave é este ponto de ônibus na praça. Aqui, ficam crianças e idosos, e há brigas, frequentemente, o que leva essas pessoas a saírem correndo de medo. Muitas vezes, acabam entrando no meio dos carros, com risco de serem atropeladas.”
Venda ilegal
O comércio ilegal também tem sido foco de combate. Em 6 de janeiro deste ano, uma ação conjunta da Prefeitura com a Polícia Militar surpreendeu vendedores irregulares no local. Foram apreendidos o equivalente a dez sacos de materiais sem procedência. Entre eles, era possível identificar materiais elétricos (novos e usados), ferramentas, utensílios domésticos e eletrônicos. Na ocasião, a Secretaria de Atividades Urbanas (SAU) informou que esse tipo de atividade tinha a meta de coibir o comércio ambulante irregular na cidade, além de permitir acessibilidade e mobilidade da população.
Sujeira, fome, pobreza, prostituição e tráfico
Quem passa apressado pelas ruas Jarbas de Lery Santos, Benjamin Constant e pela Avenida Rio Branco ou ainda no cruzamento da Rua São Sebastião com Avenida Getúlio Vargas não consegue ver o que acontece dentro da Praça dos Três Poderes. Entretanto, é só parar por alguns instantes, com um olhar mais atento, para encontrar um cenário triste, de abandono, no qual homens, mulheres e crianças passam o dia convivendo com a sujeira, a fome, a pobreza, a prostituição, o tráfico de drogas e a violência.
No dia 25 de janeiro, estive na Praça dos Três Poderes, pela primeira vez para esta reportagem. Lá, fiquei por três horas, mas nem precisava tanto. Em menos de cinco minutos depois de chegar, presenciei uma briga, envolvendo um homem e duas mulheres. Eles entraram em conflito por causa de um celular. O homem aplicou um golpe de gravata contra uma das mulheres, enquanto a outra gritava, suplicando para que a amiga fosse liberada. O homem tomou o celular da mão da agredida e jogou o aparelho no chão, espatifando-o. Algumas pessoas que estavam ao redor do trio em confronto começaram a correr, com medo de serem atingidas de alguma forma, outras nem deram conta da situação.
Cerca de 20 minutos depois, uma viatura da Polícia Militar estacionou, com giroflex ligado, mas o trio já havia desaparecido. Em 2010, já havia estado no Riachuelo com o olhar de repórter para mostrar a realidade do lugar, que, naquela época, já tinha problemas relacionados à insegurança. Todavia, a situação era mais velada. Atualmente, os problemas pioraram e acontecem às claras.
É só dar atenção àquele universo, que parece ser paralelo e ter suas próprias leis, para ver o consumo de bebida alcoólica e de cigarros de maconha feitos abertamente entre os que passam o dia na praça. A maconha é passada de um para outro, assim como a bebida, numa pequena garrafa de plástico, provavelmente cachaça, que pode ser adquirida no comércio num valor bem baixo. A prostituição também acontece de forma escancarada.
Naquele dia, três mulheres circulavam entre os grupos masculinos ou faziam abordagens a homens sozinhos. Elas se apresentavam de forma sensual, bolsa a tiracolo e sempre com uma garrafa na mão com líquido transparente. O custo mínimo do programa sexual é de R$ 3, como uma deles chegou a dizer em voz alta, no meio da praça. Constatar o que acontece ali, não é fácil para um juiz-forano como eu, que, quando criança, já se encantou com as águas do chafariz, que hoje não pode ser mais admirado pelos olhares que buscam seu jato de água.
PM objetiva devolver praça para famílias
De acordo com o comandante da 30ª Companhia da Polícia Militar, responsável pela segurança da região central, capitão Alexandre Barbosa Antunes, a atuação de policiais nas praças é uma diretriz do comando da Polícia Militar. Dentro da medida de tolerância zero, ações têm sido realizadas diariamente para dar segurança a esses espaços públicos. “O objetivo é devolver a praça para as famílias, porque achamos um absurdo elas não poderem ser usufruídas por famílias e por crianças”, ressalta o capitão, acrescentando que, só este ano, já foram efetuadas 20 prisões nas praças da região central. “As principais prisões são em decorrência de uso e tráfico de drogas e receptação, principalmente, na Praça dos Três Poderes, porque lá já foram identificadas algumas pessoas que comercializam produtos de procedência duvidosa.”
Segundo o comandante, as ações contam com equipes motorizadas em viaturas ou motocicletas, além da base móvel, que atua, principalmente, no Parque Halfeld e no Calçadão. Já as praças dos Três Poderes, Antônio Carlos, Menelick de Carvalho e da Estação são priorizadas pelo grupamento de motocicletas. Os locais também podem contar com a presença fixa de policiais, mas isso depende de dias e horários. “Agimos ainda na Três Poderes em conjunto com a fiscalização da Prefeitura, porque há presença de comércio ilegal. Quem não tiver licença para vender, tem os produtos apreendidos dentro dessa ideia de tolerância zero”, afirma o capitão.
Câmeras
Atualmente, Praça dos Três Poderes, Parque Halfeld e Antônio Carlos contam com monitoramento de câmeras. “A equipe do Olho Vivo, constantemente, tem nos empenhado, porque as câmeras conseguem flagrar o uso e o tráfico de entorpecentes”, afirma capitão Alexandre. Conforme o oficial, as pessoas que fazem tráfico na praça têm, como modus operandi, não deixar a droga com elas. O entorpecente fica em canteiros e nas proximidades do logradouro como forma de despistar o flagrante. “Inclusive temos uma reincidência de prisões das mesmas pessoas diversas vezes. Elas são presas e, depois de um tempo, estão na rua novamente sujeitas à nova prisão.”
O capitão explica que o que acontece nessas praças não é apenas uma questão de polícia, mas de intervenções sociais, uma vez que a presença de moradores em situação de rua é grande na Praça dos Três Poderes e Antônio Carlos. “Por mais que façamos buscas pessoais, essa questão foge da nossa atuação”, argumenta. Para quem deixou de frequentar as praças devido ao medo, a solução seria a implantação de pontos fixos de policiamento nesses locais. Todavia, o capitão explica que a medida não bastaria para sanar a situação. “Se colocarmos um ponto fixo, resolvo a questão daquela praça, e o problema migra para outra região. O posto fixo exige uma estrutura, tecnologia e é preciso fazer a segurança desse ponto fixo, o que acaba restringindo a atuação daquele policial que fica no posto. Com o patrulhamento de moto ou viatura, consigo ter um raio maior de patrulhamento, já que a PM não tem condições de ficar o tempo todo num único ponto. A base móvel pode ser instalada onde o problema está, e ele pode ser acompanhado, pois pode migrar para as portas de colégio, por exemplo”, explica.
Prefeitura abordou 268 pessoas na praça em 2017
No que diz respeito ao que cabe ao Executivo Municipal desempenhar na Praça dos Três Poderes, a Prefeitura informa que a Secretaria de Desenvolvimento Social, através da equipe de Abordagem Social, desloca-se de três a quatro vezes por dia até o local para abordar as pessoas que ali se encontram. Porém, conforme a administração, “a resistência é grande e, muitas vezes, elas não aceitam ir para as unidades que a Prefeitura disponibiliza”. A assessoria da PJF ainda esclarece que a Praça do Riachuelo é um local central e, por isso, referência para migrantes. A eles, além dos serviços de refeição diária, pernoite e acompanhamentos (Centro Pop, Núcleo do Cidadão de Rua, Casa de Passagem para Mulheres e Casa da Cidadania), são oferecidas as passagens para retorno a suas cidades. Em 2017, foram abordadas 268 pessoas diferentes na praça. A mesma pessoa pode ser abordada várias vezes.
A Prefeitura também informa que as secretarias de Desenvolvimento Social, de Atividades Urbanas, Demlurb, Guarda Municipal, Abordagem Social e Polícia Militar realizam ação conjunta duas a três vezes por mês para recolhimento dos objetos em excesso e orientação junto às pessoas em situação de rua que ali se encontram. No entanto, as ações não podem ter caráter coercitivo, uma vez que os cidadãos não podem ser retirados do local contra a sua vontade. A Abordagem Social é um serviço que está à disposição do cidadão e pode ser solicitada por meio do telefone 3690-7770. Já a Guarda Municipal reforça que o apoio da população é importante porque, caso se depare com situações ilícitas, poderá acionar os órgãos competentes de segurança pública.
Lei para adoção de praças sem adesão no município
Em 10 de dezembro de 2015, uma lei foi sancionada pela Prefeitura com a propósito de incitar a participação da sociedade civil na manutenção e nos cuidados de praças públicas, de esportes e áreas verdes. A Lei Complementar 34, de autoria do então vereador Chico Evangelista, coloca a Administração Municipal e população como parceiros em ações em prol desses espaços de convivência por meio de adoção, excluindo a participação de empresas poluidoras. Todavia, desde a sanção, nenhuma das cerca de 165 praças de Juiz de Fora foi adotada ou está em processo de adoção, conforme informação da Secretaria de Planejamento e Gestão (Seplag).
Segundo a lei, a adoção será permitida a entidades da sociedade civil, associações de moradores e pessoas jurídicas, sem resultar em prejuízo para a Administração Municipal, à qual é resguardado o direito de instalar equipamentos ou quaisquer itens de interesse do Município. Aos adotantes, caberá a responsabilidade de execução de projetos, preservação e manutenção, além do desenvolvimento de programas referentes ao uso. O convênio ainda estabelece a concessão ou permissão de uso para explorar atividade de lanchonete, conforme padronização estabelecida pelo Poder Público.
“Falta divulgação para que haja adesão ao projeto, porque a lei é muito boa. Ao tocar neste assunto novamente, talvez haja o despertar de pessoas interessadas na adoção”, avalia o ex-vereador Chico Evangelista. “Nosso objetivo era fazer com que pessoas e empresas interessadas pudessem aderir, para devolver esses locais a seus frequentadores, porque, com a adoção, as praças serão cuidadas, conservadas, e, com a ocupação, as famílias vão voltar a usufruir, pois a presença das pessoas vai trazer uma sensação de segurança”.
No último dia 8, a Tribuna publicou matéria, mostrando as precárias condições de praças de várias regiões de Juiz de Fora. A reportagem mostrou a denúncia de moradores, evidenciando a falta de estrutura de brinquedos e problemas como buracos, rachaduras, acúmulo de lixo e mato alto, entre outros. A equipe percorreu sete praças das regiões Sul, Norte, Leste e Central e confirmou o estado de abandono dos logradouros.
Sobre a Lei Complementar 34, a Secretaria de Planejamento e Gestão explica que, para garantia de sua melhor aplicação, sua regulamentação deve apresentar elementos com maior potencial de fortalecimento da parceria entre os agentes públicos e privados. Para tal, conforme apontou a pasta, “criou-se o grupo conduzido pela Secretaria de Planejamento e Gestão, através da sua Subsecretaria de Planejamento do Território, com a interface entre as diversas secretarias e com as atividades já desenvolvidas em praças públicas através de outras modalidades de concessões e contratos.” O trabalho desse grupo identifica quais os mecanismos possíveis para a modalidade de adoção com exploração comercial e quais as ações de conservação, manutenção, urbanização e construção de equipamentos estarão em consonância com a adoção voluntária e virão a promover maior bem-estar dos usuários.
Shopping quer fazer parceria para melhorar infraestrutura
No que se refere à Praça dos Três Poderes, o Condomínio do Edifício Santa Cruz Shopping, que fica em frente ao local, tem interesse em contribuir com o Poder Público. Segundo o administrador do shopping, Luciano Sobrinho, cartas foram encaminhadas ao prefeito Bruno Siqueira (MDB) e às secretarias de Obras e de Desenvolvimento Social, cobrando soluções e oferecendo apoio. Na carta mais antiga, datada de 17 de janeiro de 2017, o administrador relata que a praça “está tomada por pessoas em situação de rua, se tornando um ponto fixo de usuários de drogas, além de existir um comércio informal de objetos usados (…). A praça se tornou um dormitório e lavanderia dessas pessoas, afastando nossos clientes e a população do entorno pelo mau cheiro e sujeira, colocando em risco a integridade física de passantes e diminuindo consideravelmente o fluxo de clientes do Santa Cruz Shopping e de seu entorno”. Outras cartas com teor parecido como o descrito foram encaminhas à Prefeituras nas datas de 11 de julho de 2017, 13 de setembro de 2017 e 17 de janeiro de 2018.
“Neste momento, há, na minha mesa, uma carta de um de nossos lojistas que foi encaminhada à Prefeitura, na qual ele relata problemas existentes na Praça dos Três Poderes. Ele conta que, desde 1991, está no local e nunca passou por uma época tão difícil quanto a atual. Ele relata que a filha dele não pode passar pela praça para ir ao caixa de uma agência bancária, na Avenida dos Andradas, porque, quando ela sai para depositar, às vezes, é perseguida e abordada por alguns que cometem atos obscenos contra ela. Não é mais uma situação constrangedora, já é uma situação de insegurança”, afirma Luciano. Na tentativa de contribuir com o melhoramento da praça, ele afirma que já foram adquiridos quatro refletores de luz para doação e instalação no local. “Mas dependemos de uma autorização da Prefeitura para que possamos fazer alguma coisa, como ajudar na pintura do local, na melhora do gradilho, evitando a questão da invasão ao Monumento das Armas. Todavia, estamos sem apoio. Já encaminhamos cartas para a Prefeitura, mas não recebemos resposta. Ninguém nos procurou. Desde 2017 estamos tentando ajudar. Na nossa opinião, uma boa iluminação, pode ajudar muito durante o período da noite”, ressalta o administrador.
Como resposta ao pleito do Santa Cruz Shopping, a Prefeitura informa que o assunto chegou à Administração Municipal por meio de documento protocolado no JF Informação à Secretaria de Governo e foi despachado para os órgãos competentes para que sejam analisadas a viabilidade de cada uma das propostas apresentadas pelo shopping. Uma reunião sobre o tema foi agendada para as próximas semanas com o setor elétrico e de iluminação da Empav e outros órgãos da Prefeitura.
Nesta quinta-feira (15), soldados do Exército estiveram na Praça dos Três Poderes, onde deram início a uma limpeza no local. Segundo o chefe de comunicação social da 4ª Brigada de Infantaria Leve (Montanha), coronel Malbatan Leal, a intervenção no logradouro é em razão da preparação para a cerimônia que comemora a tomada de Monte Castelo, para homenagear os pracinhas que lutaram durante a 2ª Guerra Mundial, no próximo dia 21. O militar afirmou que o local receberá limpeza e pintura, mas destacou que a praça é um patrimônio do Município e que a responsabilidade é da Prefeitura.
‘Cidade de muros é um perigo’
De acordo com o sociólogo e cientista político Moisés Augusto Gonçalves, doutor em sociologia e atual professor do Cefet, no município de Curvelo (MG), quando se pensa nas praças, é preciso ter em mente que se trata de um espaço público, coletivo e para todos, onde deve ser considerado o conjunto dos direitos dos cidadãos. Ela enfatiza que esses logradouros devem ser cuidados pelo Poder Público, sem deixar de lado parcerias com a sociedade para que esses locais sejam ocupados e se tornem, de fato, lugar de encontro. O sociólogo também pondera que a solução para os problemas das praças tem a ver com algo que ultrapassa a situação local. “É preciso pensar que esses indivíduos que chamamos de “perigosos” ocupam a praça por quê? Por que nos causam medo e terror? Porque ali há drogas, há armas, que é o final de uma corrente que remete a uma necessidade de buscar os elos da solução que se quer resolver. Vamos pensar nas cracolândias em diversos lugares do Brasil. Há um clamor público, que resulta na repressão, o que faz esse fenômeno migrar e se pulverizar, o que é mais grave, pois contribui para uma multiplicação do problema, criando minicracolândias em diversos lugares”, avalia.
Moisés destaca a necessidade de pensar a responsabilidade do Estado e do mercado que lucra muito com a insegurança. “Não só o mercado dos ilícitos, como o tráfico de drogas, mas o mercado da segurança privada. Diante do medo e da insegurança, podemos caminhar para uma cidade de muros, o que é um perigo”, alerta. Conforme ele, quando se combate só o imediato, as causas são esquecidas. “Caminhamos para que tenhamos as zonas verdes, como em Bagdá (no Iraque), que era para proteger, mas não resolve. Ou então começamos a ter os enclaves fortificados, como aponta (a pesquisadora) Teresa Caldeira, e o restante fica ao Deus dará. É preciso pensar globalmente e saber que a responsabilidade é de cada um de nós”.
Teresa Caldeira é uma pesquisadora que tem experiência na área de Antropologia, com ênfase em Antropologia Urbana. Para ela, nas últimas décadas, a proliferação de enclaves fortificados vem criando um novo modelo de segregação espacial e transformando a qualidade da vida pública em muitas cidades ao redor do mundo. Conforme ela, os enclaves fortificados são espaços privatizados, fechados e monitorados para residência,
consumo, lazer ou trabalho. Esses espaços encontram no medo da violência uma de suas principais justificativas e vêm atraindo cada vez mais aqueles que preferem abandonar a tradicional esfera pública das ruas para os pobres, os “marginais” e os sem-teto. Os enclaves, na visão dela, são responsáveis por gerar cidades fragmentadas em que é difícil manter os princípios básicos de livre circulação e abertura dos espaços públicos que serviram de fundamento para a estruturação das cidades modernas.