Professor de dança é indiciado por estupro e induzimento ao suicídio de enteados
Suspeito já está preso. A mãe das vítimas também foi indiciada por estupro de vulnerável por omissão, já que não teria protegido a filha dos abusos supostamente ocorridos dentro de casa
A Polícia Civil concluiu nesta sexta-feira (9) o caso macabro e perverso envolvendo um professor de dança de salão, 46 anos, suspeito de induzir um adolescente de 17 anos ao suicídio e ainda estuprar de forma contínua a irmã dele, 12. Os dois são filhos de uma mulher, 48, com quem ele manteria um relacionamento há cerca de quatro anos, logo depois da morte do marido dela, oficial do Exército. A delegada Ione Barbosa informou que o homem teve a prisão temporária convertida em preventiva pela Justiça e vai responder pelos dois crimes, cujas penas somadas podem chegar a 27 anos de reclusão. Segundo ela, a mãe das vítimas também foi indiciada por estupro de vulnerável por omissão, já que ela não trabalharia fora e, mesmo assim, não teria protegido a filha dos abusos supostamente ocorridos dentro da própria casa. A mulher ainda está em liberdade.
O inquérito foi finalizado com quase 800 páginas. As investigações da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher avançaram com vídeos recuperados pela perícia no celular do suspeito. As imagens mostram o jovem, antes da sua morte ocorrida em junho de 2017, sendo obrigado, possivelmente pelo padrasto, a dançar nu e de forma promíscua, com foco em sua parte genital. Após o adolescente cair do terraço da residência onde a família morava, no Nova Era, Zona Norte, em suposto suicídio, o telefone do suspeito ainda foi usado para gravar o corpo dele costurado após a necropsia, realçando, novamente, os órgãos sexuais.
“Esse menino estava sendo submetido a constrangimentos, a vexames. O investigado simplesmente o filmava dançando nu e ria, incentivava. Mas dava para ver que o adolescente não estava feliz fazendo aquilo, o olhar dele era triste”, comentou a delegada. Ela reforçou a sordidez do vídeo feito com a vítima morta. “Ele gravou um adolescente que havia acabado de se suicidar, dando ênfase ao órgão genital. O que há de se pensar?”
Persuasão
Para Ione, não restam dúvidas de que o suspeito tinha um enorme poder de persuasão sobre o clã, já que, apesar das evidências, a mulher e a menina continuam a defendê-lo de todas as acusações. “Chega a chocar como a mãe e a filha falam bem dele.” Há suspeita, ainda, de que todos eram dopados com remédios e até entorpecentes, sendo que o adolescente chegou a ser internado para tratamento de desintoxicação de drogas, mas foi retirado antes do término do tratamento. Já um terceiro filho, que é o mais velho, conseguiu sair de casa assim que completou 18 anos. “Ele foi embora no aniversário e inclusive dormiu três dias na rua”, disse a policial.
Segundo ela, a defesa do professor já entrou com vários pedidos de habeas corpus e alega que o homem não era companheiro da viúva de militar, mas apenas um amigo da família. Fotos dele com outra mulher foram usadas para sustentar o argumento. Ao mesmo tempo, a polícia obteve no celular do investigado fotografias da mãe das vítimas em situações íntimas. “Eles simulam uma amizade quando, na verdade, ficou bem caracterizado que a relação era bem mais que isso.”
Investigações começam com denúncia anônima
“Tudo começou com denúncia anônima. Disseram que a família estava em cárcere privado, que o homem agredia a todos e estuprava a menina”, relembrou a delegada Ione Barbosa, sobre as investigações iniciadas quatro dias após o suicídio de um adolescente, 17, em junho de 2017, que culminaram na captura do professor de dança, 46, em 18 de dezembro do ano passado. Ele chegou a ser solto um mês depois pelo fim da prisão temporária, mas retornou ao Ceresp após cinco dias, permanecendo detido na unidade prisional preventivamente e à disposição da Justiça.
O suspeito teria conhecido a mãe das vítimas em uma aula de dança de salão e ido morar com ela. A Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher apurou que o investigado dormia com a enteada de 12 anos quase todas as noites. Quando ele foi intimado, no entanto, negou as acusações e alegou proteger a família. A polícia submeteu a menina a exame de corpo de delito para detectar o abuso e, conforme a delegada, foi comprovado que ela não era virgem há um tempo. Mesmo assim, a garota teria sido coagida a fazer um vídeo afirmando que quem a estuprava eram os irmãos e um tio. Da mesma forma, o adolescente morto teria sido forçado a fazer declarações sobre seus hábitos e preferências sexuais, como se fosse uma justificativa para o suicídio e uma defesa prévia para o professor.
Feitiço
Em uma espécie de “o feitiço virou contra o feiticeiro”, a polícia conseguiu recuperar, do mesmo celular usado para gravar as tais afirmações das vítimas, vídeos comprometedores deletados pelo suspeito. “Ele não quis entregar o telefone na hora, mas acabou trazendo no dia seguinte com tudo apagado. Mandei para a perícia e consegui resgatar”, contou Ione. Ainda durante a apuração, a delegada ouviu vários parentes da família, que vieram do Rio de Janeiro. “Eles nem foram chamados para o enterro do adolescente. Não teve nem velório.” O jovem havia estudado em uma instituição militar de ensino, e alunos também prestaram depoimento. “Disseram que os dois irmãos eram tranquilos e amigos”, informou a delegada, concluindo que o comportamento do adolescente teria mudado após a chegada do professor à família.
Também chamou a atenção, segundo ela, o fato de vizinhos relatarem o costume de a casa ter constantemente, à noite, a TV ligada em um volume muito alto. Além disso, policiais militares que atenderam a ocorrência de suicídio destacaram a falta de sensibilidade do suspeito. “Todos quatro foram uníssonos em falar em relação à frieza que ele tratava a situação. E a mãe o tempo todo se omitia, dizendo que deveriam falar era com o investigado.”
Ione reforçou que a chegada do professor desestruturou a família, e os filhos pararam de frequentar a escola. “Ele tinha um poder muito grande sobre todos, o domínio total.” Ela destacou que a prisão preventiva, por prazo indeterminado, é necessária para manter a integridade dos envolvidos, lembrando que uma das vítimas já está morta. O caso pode ir à júri popular porque a indução ao suicídio, prevista no artigo 122 do Código Penal, é crime contra a vida. “Os depoimentos de familiares são, inclusive, no sentido de que não houve suicídio. Não conseguimos comprovar o homicídio, mas mantenho o entendimento que tive desde o início, quando pedi a prisão dele. Ele é um risco para a sociedade e não pode voltar para esta casa. Se ele não atentou contra a vida do adolescente, no mínimo, o induziu ao suicídio.”