Rolê ciclístico

– Parou por quê, Claudinho?

– Acho que tem algum problema aí na frente.

– Batida?

– Não, parece que… uai… acho que é corrida de bicicleta.

– Corrida de bicicleta? Na estrada? Você tá de onda c’a minha cara, né, Claudinho?

– Tô não, alá. Alá os caras passando, ó.

– Ah, pelamordedeus, corrida de bicicleta em estrada?! Domingo de manhã??? É muita falta do que fazer dessa gente.

– Márcia, é esporte, deixa os caras…

– Esporte é futebol, isso aí é palhaçada, palhaçada! Só no Brasil mesmo uma patetice dessa…

– E a Tour de France? Na França é bonito, né?

– Duvido que na França alguém fica entrevado no meio da estrada por causa de corrida de bicicleta. Deve ter N rotas de fuga lá. N! Palhaçada.

(Meia hora depois)

– Nossa senhora, eu vou matar esses desgraçados, matar! Faz alguma coisa Claudinho, mete a mão nessa buzina!

– E aí acontece o quê? O carro começa a levitar, passa por cima dos outros carros, dos caminhões, dos ônibus, dos ciclistas…

– Não, eu é que vou passar em cima dos ciclistas, eu vou passar e dar ré e passar de novo, esses patetas com essas roupinhas coloridas AI QUE ÓDIO!

– Ó.

– Ó o quê, ó o quê?!

– Acho que começou a andar lá na frente. Começou sim.

– Aleluia. Essa palhaçada, aff… mas… vai assim? Devagar assim?

– Parece que ainda tem uns ciclistas pra trás, tá vendo? A Polícia Rodoviária lá na frente, alá. Segurando o tráfego. Tão fazendo a segurança do pessoal das bicicletas.

– A gente vai ter que ir atrás desses retardatários? Desses retardados!? Não acredito nisso!!!

(20 minutos depois, a 20km/h)

– Olha isso, olha essas marmotas no acostamento, quase morrendo, pra quê que vem pra estrada GORDA, BUNDA GRANDE, HORROROSA!!!

– Não fala assim que ela pode te escutar, doida! Mesmo com o vidro fechado…

– Olha que velho, botando os bofes pra fora VAI PRA CASA TOMAR VIAGRA, SEU BROXA, BUNDA MURCHA!!!

– Pára, Márcia! Eles vão ouvir!

– É pra ouvir mesmo MARMOTA, TEM NADA PRA FAZER NÃO, VAI LAVAR UMA ROUPA! Olha que gordo nessa roupinha apertada ROLHA DE POÇO!!!

– Nossa senhora, Márcia… vai arrumar confusão aí e a gente vai ficar mais tempo agarrado nessa estrada.

– Ah, agora a culpa é minha?! Essa palhaçada…

– Acabou.

– O quê?!

– É a linha de chegada ali, ó. Liberou. Mas… o guarda… o quê que foi agora… parar?

(abre o vidro, recebe folheto do policial rodoviário, segue viagem)

– Me dá isso aí, Claudinho. Deixa eu ler essa porcaria. “Rolê Ciclístico 2018” tatá-tatá-tatá… “conscientizar ciclistas” palhaçada “criar empatia com a comunidade transeunte” que palhaçada “convivência harmoniosa com os motoristas”, que grande palhaçada, que palhaçada.

– …

– Você acha graça, né, Claudinho? Você acha graça.