Ando pra lá e pra cá em busca de um assunto para a crônica desta semana. Tento fazê-la surgir de uma folha seca virada pelo vento no quintal crepitante nesses dias sem chuva. Olhando pela janela do carro, busco nas calçadas e postes alguma pista. Aguço os ouvidos na fila do supermercado, perscruto as gôndolas multicoloridas. Faço graça com as moças da quitanda da Marilândia, buscando na boca delas uma frase, uma palavra que dê partida nesse velho motor. Às vezes dou sorte. Hoje, não. Uma cerveja enquanto preparo o macarrão do almoço talvez me abra o apetite e, quem sabe, as ideias. Nada feito.
O domingo avança e a hora de sentar ao computador já vai passando por mim. Assisto a um filme horripilante. Dali nada se salva, nem o menino que morre tentando salvar a irmãzinha cega. Uma hora e quarenta e cinco minutos se foram. É preciso terminar o serviço antes do Fla-Flu, pois a depender do resultado do clássico, a crônica pode sair demasiado amarga ou excessivamente efusiva. Abro um livro. Depois outro. Faço café. Nada vem.
Vou às notícias. É tarifaço de Trump, assassinatos em Gaza, Bolsonaro incorporando novo adereço ao lookinho. No Mato Grosso do Sul, um boi cai na piscina. Na Sibéria, o que cai é um avião: o pai entregou a direção da aeronave ao filho de 15 anos. Clico no link e descubro que o fato aconteceu em 1994. Indignado por ter caído no click bait, desisto das notícias. Não resta sombra de dúvidas: sou um trabalhador braçal. Se eu quiser que essa crônica saia, e saia antes do Fla-Flu que se avizinha, é bom começar a digitar alguma coisa. E seja o que Deus quiser.