Sem carnaval
O carnaval foi desaconselhado formalmente. Como medida de segurança, o que não soa muito bem aos ouvidos, mas parte de uma decisão que parece ter sido muito pensada e muito acertada. Não é razoável cancelar a maior festa popular do país, sem que se tenha um bom motivo. Porém, a esta altura, está bem claro que o objetivo é salvar vidas, impedir que as taxas de transmissão do coronavírus aumentem e, com essa configuração, a folia vai ter que esperar.
Mesmo ciente de que esse é o caminho mais seguro, no íntimo, aumenta um pouco a chateação acumulada. Nas conversas com amigos próximos nos últimos meses, havia sempre a ideia de que o carnaval era tudo o que precisávamos para lavar a alma: ir para as ruas, viver novamente a alegria do encontro, do abraço, da festa. É triste perceber, no entanto, que ainda não há segurança para que isso aconteça.
Não é só isso, insistir em fazer algo para comemorar que cause aglomerações, mesmo que de maneira escondida, reservada, pode ser o maior risco que corremos no momento. Ainda há muitas pessoas que insistem em fazer grandes eventos, achando que ninguém vai ver, que ninguém vai ficar sabendo, que para determinados grupos não há riscos. Com essa conduta, ameaçam a vida das pessoas que precisam trabalhar, de seus familiares, de quem não teve a oportunidade de se isolar e, até mesmo, de quem cumpriu o esforço e está há meses trancado em casa.
As festas de fim de ano foram uma amostra triste do que pode acontecer, caso não tenhamos a consciência de respeitar o distanciamento social. Todos os dias somos expostos ao assombro dos dados dos boletins epidemiológicos. Eles alertam de maneira clara sobre o perigo de continuar ignorando os protocolos de combate ao vírus.
Ninguém vai dizer que está fácil aguentar essa distância toda, que está prestes a completar um ano. O nosso cansaço generalizado e a insatisfação, entretanto, não devem nos levar a abrir concessões. Infelizmente, ainda não é hora. A vacina ainda não chegou para todo mundo, ainda leva um tempo para que estejamos devidamente imunizados. As fantasias, o brilho, as brincadeiras e os abraços vão precisar continuar guardados, lastimavelmente.
Se o desânimo ocorrer, ainda podemos ter acesso a um pouco do calor do carnaval, que permanece na letra dos sambas e das marchinhas que podem ser ouvidas na internet, na cervejinha do fim de semana, numa ligação com cada um no seu canto. Se fizer bem, vale até usar algum adereço, pintar a cara, que seja. Não resolve o impasse, mas ajuda a aliviar um pouco a tensão. Quando finalmente for possível voltar a fazer folia nas ruas, quatro dias será muito pouco para colocar a energia em dia. Até lá, o que vale é cuidar de si para cuidar de todos.
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