Celular seguro?
Iniciativa do Governo federal demonstra preocupação com usuários, mas responsabilização de plataformas ainda é desafio
Desde que os telefones móveis foram convertidos em telefones inteligentes, os onipresentes smartphones passaram a concentrar quase que a totalidade de nossas informações pessoais, transformando-se também em ferramentas essenciais no nosso dia a dia. A proeminência dos aparelhos celulares se faz presente tanto no entretenimento quanto nas transações bancárias, nos relacionamentos pessoais e nos serviços públicos.
O programa Celular Seguro, lançado pelo Governo federal no último dia 19, é uma demonstração de como esses dispositivos cumprem função central em nosso cotidiano. O objetivo fulcral da iniciativa é combater o roubo e o furto de aparelhos celulares e aplicativos digitais no país, através do site e do aplicativo disponibilizados pelo Governo.
Segundo informações do Ministério da Justiça e Segurança Pública repassadas à Agência Brasil, na primeira semana de funcionamento, 3.896 aparelhos roubados, furtados, perdidos ou extraviados foram bloqueados através do programa. Até a tarde de terça-feira (26), 513.098 usuários registraram seus números para ter a possibilidade de, em caso de necessidade, bloquear remotamente seus aparelhos.
Funciona assim: o usuário que cadastrar seu número no Celular Seguro pode indicar pessoas que ficam autorizadas a fazer os bloqueios em seu nome. Assim, caso você tenha seu aparelho roubado, pode pedir a alguém de confiança, devidamente cadastrado, que faça o bloqueio para você, protegendo assim os seus dados. Ou você mesmo pode bloquear o smartphone no site celularseguro.mj.gov.br, a partir de um computador ou de outro celular.
Há quem critique a iniciativa do Governo federal e veja nela mais uma forma de controle do Estado sobre nossos dados pessoais. Mas há também que se levar em conta o aumento do número de celulares furtados e roubados no país: em 2022, quase um milhão (999.223) de ocorrências desse tipo foram registradas no país, um aumento de 16,6% em relação a 2021, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. A medida do Ministério da Justiça é, pois, uma iniciativa de combate aos efeitos dessa modalidade de crime, que são o acesso indevido a dados pessoais como fotos, e-mail, documentos digitais e dados bancários.
E é justamente nesses efeitos, que a priori independem do roubo do telefone, que o Estado tropeça em sua iniciativa. Ora, os golpes virtuais, como hackeamento de contas bancárias e de perfis de redes sociais, deixam os usuários absolutamente à mercê de criminosos que se especializam cada vez mais nesses atos ilícitos. Na tentativa de reaver recursos perdidos em golpes cibernéticos ou mesmo o controle sobre sua vida on-line, os cidadãos frequentemente se veem abandonados à própria sorte, sem ter a quem recorrer, pois é também modesta a autoridade do Estado sobre as plataformas digitais.
Se é louvável a tentativa do Governo federal de dar ferramentas à população para proteger seus dados em caso de furto e roubo de celulares, é preciso que seja exigido também das grandes plataformas um maior comprometimento com a proteção dos dados de seus usuários. Se não houver maior integração entre esses atores – a saber: Estado, plataformas digitais, sistema bancário -, será apenas paliativa uma iniciativa como esta do Celular Seguro.