O que é a filosofia
Segundo afirma Evandro Ghedin, em seu livro “Ensino da filosofia no ensino médio”, o processo que torna possível o conteúdo da filosofia é o filosofar. Kant, considerado um dos maiores filósofos de todos os tempos, já dizia isso. A filosofia não pode ser ensinada, ela deve ser vivida, experenciada. Só é possível apreender os temas abordados pela filosofia filosofando, refletindo. É dessa maneira que o aluno irá se apropriar minimamente da cultura filosófica. Não tem outra maneira.
Não é como na matemática em que eu decoro fórmulas para resolver uma equação. A filosofia sem o filosofar é morta, não serve para nada. Mas como o professor de filosofia ensina os seus alunos a filosofarem? A resposta chega a ser ridícula, de tão óbvia. Uma criança aprende a andar andando. Ensina-se a filosofar filosofando. E só filosofamos quando nos libertamos de nossos preconceitos, de nossas crenças, quando aprendemos a ouvir. Escrever e dizer o que pensamos vem depois.
O filósofo Luiz Felipe Pondé, em um artigo publicado na “Folha de S.Paulo”, “Filosofar como os antigos” (segunda-feira, 16 de março de 2015), diz que o mais importante na filosofia – ao contrário do que muita gente pensa – não é decorar nomes, conceitos e períodos históricos. Para Pondé – e também para mim, sempre pensei dessa forma -, a filosofia sempre foi mais do campo da experiência do que da teoria. O professor de filosofia deve viver a filosofia, senti-la, só dessa maneira é que ele irá fomentar os seus alunos.
Os verdadeiros filósofos – Tales, Heráclito, Pitágoras, Parmênides, etc. – viveram a filosofia, só depois teorizaram. Penso que é essa experiência que o professor de filosofia deve proporcionar aos seus alunos do ensino médio. Evandro Ghedin entende que o filosofar é o exercício de pensamento, isto é, o exercício da reflexão, do dialogar consigo mesmo e com os autores ao longo da história da filosofia. Para mim, o diálogo – nem que seja consigo mesmo – é a palavra-chave do filosofar, só tendo posse dele que conseguimos fazer filosofia. Só por meio do diálogo que conseguimos construir conhecimento. A investigação dialógica, segundo o professor Juarez Gomes Sofiste, em seu livro “Sócrates e o ensino da filosofia”, é o que possibilita colocar em ação o filosofar (p. 98). Sofiste afirma que o caminho mais propício para a humanização do humano são a investigação e o diálogo. O método socrático é garantia de liberdade intelectual e construção coletiva de conhecimentos (conforme Sofiste, pp. 98-99).
Mas o diálogo por si só é insuficiente, é necessário problematizar questões, é necessário ter criatividade. Ela é o caminho para solucionar as questões que foram problematizadas. O conteúdo será apreendido na relação entre a disciplina filosofia, seus conteúdos e o filosofar. O pensamento de determinado filósofo será “ensinado” por meio do próprio pensar. Penso que os alunos, depois da exposição do conteúdo, devem ser levados a pensar, por exemplo: por que Albert Camus entendia que a relação do homem com o mundo é absurda? Será isso verdade? Se você não concorda com ele, apresente argumentos. Há mesmo essa contradição? O aluno deve entender o pensamento de determinado filósofo, mas, também, deve ter abertura para poder criticá-lo, mostrar o seu ponto de vista. Isso é filosofia!
Ao filosofar, a criatividade dos alunos – e a do próprio professor – deve ser estimulada, pois a filosofia, conforme afirma Ghedin (“Ensino de filosofia no ensino médio”, p. 88), é um constante processo de criação. Cria-se sobre a criação de outras pessoas, isto é, pensa-se em cima do pensamento de outras pessoas. Ninguém é absolutamente original, mas sempre há espaço para pequenas inovações, para soluções – não inteiramente – novas. No dia em que matarem a criatividade, não existirá mais a filosofia e, consequentemente, não existirão mais filósofos.
Vivemos em um mundo conteudista. Um mundo onde o mais inteligente é aquele que tem a cabeça mais cheia. Um oceano de conteúdos – muitos deles inúteis -, é de que os jovens necessitam para serem aprovados nas universidades ou em concursos públicos. A preocupação exacerbada com o conteúdo, afirma Ghedin, é o que torna o processo de ensino de filosofia cada vez mais problemático. Na investigação dialógica, afirma Sofiste (pp. 99-100), o conteúdo não se reduz ao conceito, isto é, o conteúdo não se reduz à cultura filosófica.