O sentido da fé
O que é a fé ? A fé é um dom sobrenatural que Deus concede gratuitamente ao homem. Considerando que a livre iniciativa de Deus pede a livre resposta do homem, podemos entender que a fé é também um ato humano. Na fé, a inteligência e a vontade humanas cooperam com a graça divina. Para explicar isso, o grande mestre do universalismo filosófico e teológico, Santo Tomás de Aquino, assim definiu: Crer é um ato da inteligência que assente à verdade divina a mando da vontade movida por Deus através da graça. A fé é distinta da razão. No século XIX, o Concílio Vaticano I recordou que existem duas ordens de conhecimento, distintas não apenas pelo seu princípio, mas também pelo objeto. Pelo seu princípio, porque, se não conhecemos pela razão natural, no outro, fazemo-lo por meio da fé divina; pelo objeto, porque, além das verdades que a razão natural pode compreender, é-nos proposto ver os mistérios escondidos em Deus, que só podem ser conhecidos se nos forem revelados do Alto (Concílio Vaticano I: DF, IV). Esse mesmo Concílio explicou que ainda que a fé esteja acima da razão, não poderá jamais haver verdadeira desarmonia entre uma e outra, porquanto o mesmo Deus que revela os mistérios e infunde a fé, dotou o espírito humano da luz da razão (DF, IV parágrafo 3°).
No século IV, Santo Agostinho explicou que a fé, se não for pensada, nada é, ou seja, crer nada mais é senão pensar consentindo; todo o que crê pensa; crendo, pensa e pensando, crê. Se se tira o assentimento, tira-se a fé, pois, sem o assentimento, realmente não se crê (Santo Agostinho). No século XII, Santo Anselmo recordou que Fides quaerens intellectum(= a fé procura compreender). Assim, um conhecimento mais penetrante despertará por sua vez uma fé maior, cada vez mais ardente de amor. Mas o motivo de crer não é o fato de as verdades reveladas por Deus aparecerem como verdadeiras e inteligíveis à luz de nossa limitada razão natural. Aquele que crê crê por confiança na autoridade de Deus que revela e não pode nem enganar-se, nem enganar-nos. Segundo a famosa expressão de Santo Agostinho, intellige ut credas: crede, ut intelligas (= eu creio para compreender, e compreendo para melhor crer). Sem dúvida, as verdades da fé podem parecer obscuras à razão e à experiência humanas, mas a certeza dada pela luz divina é maior que a que é dada pela luz da razão natural (Santo Tomás de Aquino). Então, dez mil dificuldades não fazem uma única dúvida (dizia o memorável Cardeal Newman no século XIX).
Jesus Cristo afirma que a fé é necessária à salvação (Marcos 16,16). A fé já é o começo da vida eterna, porque ela nos faz degustar como por antecipação a alegria celeste. A Igreja Católica considera que a fé é um ato pessoal e ao mesmo tempo eclesial. A fé da Igreja precede, gera, sustenta e alimenta a fé dos fiéis. Por isso, a Igreja é Mater et Magistra, isto é, Mãe e Mestra de todos os crentes. Assim, no século III, São Cipriano pôde dizer que ninguém pode ter a Deus por Pai, que não tenha a Igreja por mãe. O ato de fé é por sua natureza voluntário. Por isso, a Igreja afirma que jamais é lícito a alguém levar os homens a abraçar a fé católica por coação, contra a própria consciência (Código de Direito Canônico, cân.748 § 2).