AutomutilaĆ§Ć£o
āO ato consiste em machucar o corpo para suportar a dor da alma. Compreender a aĆ§Ć£o vai alĆ©m de simplesmente impedi-la de forma momentĆ¢neaā
Dados do MinistĆ©rio da SaĆŗde revelam que 20% dos jovens brasileiros jĆ” praticaram automutilaĆ§Ć£o, o equivalente a cerca de 14 milhƵes de pessoas. Durante os Ćŗltimos anos, esse nĆŗmero teve um crescimento considerĆ”vel, principalmente em funĆ§Ć£o do isolamento social gerado pela pandemia. Cada dia mais Ć© possĆvel observar relatos semelhantes nas escolas, motivados por bullying ou abuso familiar.
Por definiĆ§Ć£o Ć© o ato de cortar, queimar ou perfurar o corpo intencionalmente, sem intenĆ§Ć£o de cometer suicido. Atualmente, Ć© a segunda maior causa de mortalidade entre os jovens. Por mais extremo que seja, os cortem fazem parte de uma histĆ³ria sendo narrada. Em certos casos, se manifesta como um sintoma de borderline, transtorno de humor instĆ”vel, onde o indivĆduo nĆ£o tem total controle sobre suas aƧƵes.
O trauma Ć© decorrente de uma regressĆ£o nas etapas de desenvolvimento afetivo, ligada ao ambiente externo durante a infĆ¢ncia. A falta da figura acolhedora – suficientemente boa – Ć© uma falha do processo de amadurecimento psĆquico. Em uma visĆ£o Winnicottiana, essa condiĆ§Ć£o se manifesta de forma distintas, desde a psicopatia atĆ© a automutilaĆ§Ć£o. Para entender melhor o “porquĆŖ”, antes Ć© preciso descobrir o “quando”.
A origem dessa lacuna costuma ser um conflito interno, regido por uma agonia inimaginĆ”vel. Quando esta dor nĆ£o Ć© conversada e superada, ela se aloja dentro da mente, podendo ser o estopim de algo pior no futuro. De forma conturbada, se torna um mecanismo de defesa ao passar por dificuldades – em outras palavras, uma vĆ”lvula de escape. Ao escolher se mutilar, o indivĆduo busca superar aquilo que lhe aflige.
O ato consiste em machucar o corpo para suportar a dor da alma. Compreender a aĆ§Ć£o vai alĆ©m de simplesmente impedi-la de forma momentĆ¢nea. Ć embarcar em uma jornada interior e silenciosa, que trata o motivo alĆ©m do resultado. A dor Ć© natural da essĆŖncia humana, e trazer um olhar cauteloso sobre ela faz com que as entendemos e, assim, a superamos.