Supremo na berlinda
Nova legislatura do Senado pode colocar em votação projeto que estabelece tempo de mandato dos ministros do STF, acabando com a vitaliciedade do cargo
Passados os efeitos da eleição desta quarta-feira, na qual estarão em jogo a presidência da Câmara Federal e do Senado Federal, o Congresso inicia a sua agenda de 2023 sob a perspectiva de um novo cenário político. O primeiro será a nova formatação das duas casas. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva terá um Legislativo mais hostil ao seu mandato, resultado das eleições de outubro do ano passado, quando a direita elegeu um de seus maiores contingentes. Não terá um céu de brigadeiro, a despeito das muitas intenções que demonstrou já neste primeiro mês de mandato.
O Senado Federal deverá ser o polo de maior resistência, mas sua pauta terá outras questões polêmicas em torno do outro lado da Praça dos Três Poderes. Se não houver contratempos, deverá entrar em pauta um projeto que estabelece tempo de duração do mandato dos ministros do Supremo Tribunal Federal. Hoje ele é vitalício, mas, diante dos muitos enfrentamentos dos últimos quatro anos, uma expressiva parcela da população entende que é preciso definir prazos, que podem ser de sete ou oito anos, como relata em sua coluna, em “O Globo”, o jornalista Elio Gaspari. Ele aponta até para a possibilidade de renovação do mandato dos ministros por um novo período de mesma duração.
A questão passa, necessariamente, pela relação do STF com o Congresso, pois, sem a garantia da vitaliciedade, hoje prevista em lei, os ministros estariam também à mercê do jogo político, que, em tese, deveria passar distante do Judiciário. E isso é um problema, embora tenha sido o próprio Supremo a abrir as portas para a política quando tornou-se uma casa assertiva em questões políticas, atuando além da sua competência em algumas demandas.
Togas e política não são novidade. O escritor Felipe Recondo, no seu livro “Tanques e togas – o STF e a ditadura militar”, mostra momentos turbulentos da Corte em situações críticas, como a própria queda de João Goulart, que inaugurou o ciclo militar que durou até 1985. “Os atos de exceção deram lugar a prisões políticas, cassações de mandato, censura, desaparecimento e mortes. A própria garantia de vitaliciedade dos magistrados do STF foi suspensa: três ministros foram afastados à força, e dois anteciparam suas aposentadorias”, destaca o autor.
Em 1977, o então presidente Ernesto Geisel, ao não obter maioria para aprovar a reforma do Judiciário, colocou o Congresso em recesso por 14 dias. Nesse período, não só fez a reforma como criou a figura do “senador biônico”: um terço do Senado seria indicado pelo Governo. Em Minas, o contemplado foi o senador Murilo Badaró.
Os tempos são outros, mas o STF continua no olho do furacão, o que pode acelerar a votação no Senado.
Colocar o Judiciário sob pressão, porém, não é um dado histórico só no Brasil. O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, quer fazer o mesmo, mas enfrenta resistência da população. Milhares de israelenses foram às ruas nos últimos dias em protesto. Aqui, se houver a mudança, a iniciativa será do Legislativo.
A eleição da Mesa Diretora será emblemática. Se for reeleito, o senador Rodrigo Pacheco pode adiar a matéria. Caso contrário, o assunto andará mais rapidamente.