Em causa própria

Se não houver atenção das ruas, reformas aprovadas no Congresso terão fim único de beneficiar os políticos, especialmente os que hoje têm mandato


Por Tribuna

26/07/2017 às 07h30

Sem o aval da opinião pública, a instância política tenta, por meio de reformas na legislação eleitoral e política, conter os avanços da operação Lava Jato. Os sinais são claros, por exemplo, quando se ensaia uma proposta que amplia, de 15 dias para oito meses, o prazo – antes das eleições – em que os candidatos não poderão ser presos, salvo em flagrante delito. Trata-se de uma lei de endereço certo, mas seria ingênuo definir que o alvo seja apenas o ex-presidente Lula, condenado em primeira instância pelo juiz Sérgio Moro e principal candidato do PT à Presidência da República. A mudança alcança também outros players da política, uma vez que, a essa altura do campeonato, há mais políticos indiciados do que liberados para a disputa de 2018. Entre os cardeais estão o próprio presidente da República, Michel Temer, o senador Aécio Neves, um dos próceres do PSDB, e os dirigentes peemedebistas Renan Calheiros, Romero Jucá e Valdir Raupp, entre outros.

Mas a opinião pública deve ficar atenta também à reforma em curso no Congresso, que, para valer já no ano que vem, precisa ser aprovada até setembro. Entre as invencionices de causa própria está a criação do distritão, modelo pelo qual são eleitos os mais votados. Trata-se de uma aberração sem limites, por desidratar o papel dos partidos e beneficiar os candidatos mais ricos, que podem bancar suas próprias campanhas. O discurso nos bastidores é tratar-se de uma medida de prazo definido, valendo apenas para a próxima eleição. A questão é o timing: nem sempre o provisório da política é o provisório das ruas, havendo, pois, o risco de o distritão vir para ficar. Somente quatro países o adotam, entre eles o Afeganistão. E só.

A reforma política vem sendo discutida há anos, tendo passado por várias comissões especiais, mas nem por isso saiu do papel. Com os prazos se esgotando, deve ser aprovado apenas um clone, próprio para atender conveniências, em vez de atender uma demanda esperada pela população. O Congresso, como sempre, continua legislando em causa própria.

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