Faltam lideranças
A ausência de interlocutores gabaritados deixa os partidos sem referência tanto para o diálogo quanto para o trabalho de oposição
Os primeiros ensaios do futuro Governo Bolsonaro e da oposição, especialmente do Partido dos Trabalhadores, indicam que o Congresso será um polo de tensão permanente ante o pouco interesse pelo diálogo de ambos os lados. Ao mesmo tempo em que ministros da próxima gestão apontam para o jogo duro, os adversários de outubro seguem o mesmo tom, bastando ver as recentes declarações da presidente do PT, Gleisi Hoffmann, que levantou a bandeira do enfrentamento em vez de, pelo menos, refluir suas ações até que as fronteiras sejam definidas.
Em momentos como esse é que fica claro como o Brasil é árido em lideranças. Na ditadura, mesmo com resistência, Ulysses Guimarães se encontrou com o general Ernesto Geisel, gesto criticado por alguns pares, mas emblemático para o início da descompressão política. Hoje não há Ulysses ou Tancredos para pacificar o debate e estabelecer que a democracia implica, necessariamente, o contraditório. Os atuais atores, além do despreparo intelectual e político, se comparados aos velhos parlamentares da resistência, insistem em colocar em campo suas idiossincrasias em vez de procurar o diálogo.
E é com esse cenário de enfrentamento que o país parte para 2019, quando será inaugurada a nova gestão. Os arroubos vistos nas redes sociais são fruto do silêncio dos líderes, que, em vez de acenarem para um país que saiu das urnas e parte para o seu futuro, insistem em ficar calados ou colocar o tacape como instrumento de negociação. Nenhum dos lados faz a sua parte. O futuro superministro Paulo Guedes diz que vai resolver o problema da indústria a despeito dos industriais, como se fossem esses os responsáveis pelo cenário caótico que se registra nas contas do Governo. Penaliza o carteiro pelo conteúdo da carta e não sinaliza para a busca do entendimento, mostrando que vai atuar de cima para baixo, sem ouvir os segmentos diretamente interessados.
É possível que esse clima ainda seja remanescente da campanha – a mais polarizada na história recente do país -, mas, passada a primeira semana, é hora de se colocar a discussão na mesa do bom senso, em vez de insistir num país dividido, do nós contra eles, forjado, paradoxalmente, pela oposição, que agora, em seu segmento mais visível, não se mostra aberta ao diálogo, preferindo, em vez disso, firmar posição. Que o faça, pois uma oposição firme é necessária à democracia, mas sem sectarismo.