Juiz determina transferĂȘncia de Adelio para Minas Gerais
DecisĂŁo foi tomada pelo juiz Dalton Igor Kita Conrado, da 5ÂȘ Vara Federal de Campo Grande, apĂłs pedido do MinistĂ©rio PĂșblico Federal
O juiz corregedor da PenitenciĂĄria Federal de Campo Grande (MS), Dalton Igor Kita Conrado, da 5ÂȘ Vara Federal de Campo Grande, autorizou, nesta segunda-feira (2), a transferĂȘncia de Adelio Bispo de Oliveira – responsĂĄvel pelo atentado ao presidente Jair Bolsonaro, ainda durante a campanha eleitoral – para hospital de custĂłdia e tratamento psiquiĂĄtrico no Estado de Minas Gerais. A informação foi confirmada pela 5ÂȘ Vara Federal Ă Tribuna. A transferĂȘncia foi requerida pelo MinistĂ©rio PĂșblico Federal (MPF) do Mato Grosso do Sul Ă corregedoria da unidade prisional em meio Ă s tratativas para a renovação da permanĂȘncia de Adelio no estabelecimento.
A solicitação de manutenção do acautelado no presĂdio foi realizada pela 3ÂȘ Vara Federal de Juiz de Fora, mas prontamente questionada tanto pela Defensoria PĂșblica da UniĂŁo (DPU), quanto pelo procurador da RepĂșblica Daniel Hailey Soares Emiliano. No entanto, o antigo advogado de Adelio e atual curador, Zanone Manuel de Oliveira JĂșnior, discorda da medida, uma vez que, no seu entendimento, o acautelado corre riscos fora do sistema penitenciĂĄrio federal, mesmo argumento sustentado pelo juiz Bruno Souza Savino. A transferĂȘncia pode levar Zanone a recorrer a cortes internacionais.
Em termos prĂĄticos, Conrado negou o pedido da 3ÂȘ Vara Federal de Juiz de Fora para renovar a permanĂȘncia de Adelio na PenitenciĂĄria Federal de Campo Grande. Na decisĂŁo, o magistrado deu um prazo de 30 dias para que o acautelado deixe a unidade prisional e retorne ao juĂzo de origem, isto Ă©, Ă prĂłpria 3ÂȘ Vara Federal de Juiz de Fora, Ă qual cabe a decisĂŁo sobre o destino do autor do atentado. Como o prazo de permanĂȘncia de Adelio na penitenciĂĄria estava em vias de encerrar, o juiz Bruno Souza Savino solicitou a sua renovação, uma vez que, no seu entendimento, a permanĂȘncia de Adelio no sistema penitenciĂĄrio federal garantiria a sua integridade fĂsica e, ainda, seria justificada pelo seu grau de periculosidade – Adelio manifestara a peritos oficiais o desejo de assassinar o presidente Bolsonaro e o ex-presidente Michel Temer.
Savino foi o responsĂĄvel por declarar Adelio inimputĂĄvel e condenĂĄ-lo ao cumprimento de medida de segurança por tempo indeterminado. Entretanto, a DPU, responsĂĄvel pela defesa de Adelio desde dezembro Ășltimo, postulou o imediato retorno de Adelio a Minas Gerais para internação em estabelecimento adequado. Conforme a DPU, a PenitenciĂĄria Federal de Campo Grande nĂŁo tem estrutura adequada para executar a medida de segurança, ou seja, oferecer a Adelio as condiçÔes necessĂĄrias para tratĂĄ-lo do transtorno mental delirante persistente.
Ă Tribuna, a DPU confirmou, em nota, a posição contrĂĄria Ă manutenção de Adelio no sistema penitenciĂĄrio federal. “A DPU/Campo Grande, com base em informaçÔes prestadas pela direção da PenitenciĂĄria Federal de Campo Grande no sentido de que a unidade prisional nĂŁo conta com estrutura adequada para a manutenção do sentenciado em cumprimento de medida de internação imposta judicialmente, manifestou-se contrĂĄria Ă prorrogação da sua permanĂȘncia no local, requerendo o seu retorno Ă Minas Gerais, de modo a ser acolhido em estabelecimento apropriado onde receba o tratamento de saĂșde de que necessita, nos termos da lei”, assegurou.
O CĂłdigo Penal determina que a medida de segurança de internação deve ser executada em hospital de custĂłdia e tratamento psiquiĂĄtrico, ou, caso contrĂĄrio, em outro estabelecimento adequado. Logo, a DPU sustentou que Adelio tem direito a ser internado em local onde possa ser submetido a tratamento mĂ©dico adequado. “Ademais, a Recomendação do Conselho Nacional de Justiça 35/2015 prevĂȘ que a polĂtica antimanicomial a ser executada pelo JudiciĂĄrio deve ser norteada pela permissĂŁo para que o tratamento, sempre que possĂvel, ocorra sem que o paciente se afaste do meio social em que vive, visando sempre Ă manutenção dos laços familiares.” A famĂlia de Adelio reside em Montes Claros, no Norte de Minas, a cerca de 1.390 quilĂŽmetros de Campo Grande.
Questionado sobre as condiçÔes oferecidas pelas unidades prisionais, o Departamento PenitenciĂĄrio Nacional (Depen) afirmou que o sistema penitenciĂĄrio federal possui serviço de saĂșde organizado apenas no nĂvel de atenção bĂĄsica ou primĂĄria, ou seja, para “atendimentos bĂĄsicos, iniciais, voltados Ă prevenção de doenças e solução de possĂveis casos de agravos”. “(…) A atenção bĂĄsica Ă© entendida como o primeiro nĂvel da atenção Ă saĂșde no SUS, que se orienta por todos os princĂpios do sistema, inclusive a integralidade, mas emprega tecnologia de baixa densidade. Portanto, fica claro que (…) os procedimentos realizados diretamente em seus serviços nĂŁo esgotam as necessidades dos usuĂĄrios do SUS. Assim, atendimentos de mĂ©dia e alta complexidade em saĂșde, por meio de açÔes e serviços cuja complexidade da assistĂȘncia na prĂĄtica clĂnica demande a disponibilidade de profissionais especializados e a utilização de recursos tecnolĂłgicos, para o apoio diagnĂłstico e tratamento, sĂŁo prestados em articulação com os hospitais”, reitera, em nota, o ĂłrgĂŁo. De acordo com o Depen, todas as penitenciĂĄrias federais apresentam a mesma estrutura, e, portanto, ofereceriam as mesmas condiçÔes para Adelio.
Diante da petição da DPU contrĂĄria Ă prorrogação da permanĂȘncia de Adelio na PenitenciĂĄria Federal de Campo Grande, o procurador Daniel Hailey Soares Emiliano, lotado na Procuradoria da RepĂșblica de Coxim (MS), solicitou Ă corregedoria da unidade prisional, a rejeição da permanĂȘncia de Adelio em Campo Grande. Conforme os esclarecimentos do Depen, Emiliano concluiu que “nĂŁo existem unidades no sistema penitenciĂĄrio federal dotadas de estrutura para execução de medida de segurança”.
“A medida de segurança nĂŁo Ă© pena; ela visa, sim, a promover o pertinente tratamento ao inimputĂĄvel, de modo a curar ou ao menos minorar os efeitos da doença mental que o aflige. No caso especĂfico da medida de internação, reservada a casos mais graves, ela afastarĂĄ o inimputĂĄvel do convĂvio social enquanto ele for considerado um risco para a sociedade. DaĂ a importĂąncia de o inimputĂĄvel ser acolhido em instituição apropriada, dotada de pessoal qualificado no tratamento de transtornos mentais e com condiçÔes de avaliar, por meio de exame de cessação de periculosidade (…), se, quando e como ele poderĂĄ retomar o seu convĂvio em sociedade”, argumenta, no parecer, o procurador.
‘Adelio corre riscos de ser assassinado’
Zanone Manuel de Oliveira JĂșnior, hoje curador de Adelio Bispo, defendia a manutenção de autor do atentado no sistema penitenciĂĄrio federal, uma vez que, conforme entende, ele corre riscos de ser assassinado. “Antes do parecer do MPF, eu jĂĄ havia peticionado falando que sou absolutamente contra (a transferĂȘncia). Adelio corre riscos de ser assassinado. Em um primeiro momento, ele foi ameaçado, agredido no sistema prisional estadual (em Juiz de Fora). Acho que os Ăąnimos estĂŁo ainda muito acirrados no cenĂĄrio polĂtico brasileiro. HĂĄ muitos correligionĂĄrios, simpatizantes da direita, extremados. Eles nĂŁo estĂŁo preparados para diĂĄlogo algum. E acredito que o Adelio vĂĄ sofrer alguma espĂ©cie de retaliação.” Conforme Zanone disse Ă Tribuna antes da decisĂŁo da 5ÂȘ Vara Federal de Campo Grande, caso Adelio fosse, de fato, transferido para um hospital de custĂłdia, ele recorreria a cortes internacionais por meio de nova petição.
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Questionado sobre a manifestação do Depen acerca da ausĂȘncia de condiçÔes ideais do sistema penitenciĂĄrio federal para oferecer tratamento psiquiĂĄtrico a Adelio, Zanone discordou. Para ele, o ideal seria que a Justiça Federal esperasse a prĂłxima perĂcia de cessação de periculosidade, que, conforme a sentença do juiz Bruno Souza Savino, deve acontecer atĂ© julho de 2022. “O sistema penitenciĂĄrio federal tem sim condiçÔes para tratĂĄ-lo. O meu psiquiatra e a minha psicĂłloga, ou seja, os mĂ©dicos atestaram que a espĂ©cie, a modalidade de tratamento destinada a zelar esta enfermidade mental pode ser realizada no interior do estabelecimento do sistema prisional federal. E hĂĄ quanto tempo o Adelio estĂĄ lĂĄ? Mais de ano. NĂŁo houve problema algum.” Embora tenha inicialmente rejeitado o tratamento para o transtorno mental delirante persistente, Adelio estĂĄ, agora, mais receptivo, segundo Zanone. “Da Ășltima vez que o meu psiquiatra esteve lĂĄ, ele disse que o Adelio jĂĄ estava mais receptivo ao tratamento. Eu, pessoalmente, nĂŁo visualizei, mas isso me foi reportado pelo psiquiatra Hewdy Lobo.”
Mudança de defesa
Desde dezembro Ășltimo, a Defensoria PĂșblica da UniĂŁo (DPU) Ă© responsĂĄvel pela defesa de Adelio Bispo de Oliveira apĂłs desejo do prĂłprio curatelado manifestado em carta de prĂłprio punho. Como o Ășnico processo envolvendo Adelio transitou em julgado, a DPU Ă© responsĂĄvel, em termos prĂĄticos, em acompanhar a execução penal de cumprimento de medida de segurança e os seus desdobramentos. De acordo com Zanone e confirmado pela DPU, ele ratificou a mudança de defesa.”Quando a DPU teve o primeiro contato com o Adelio, ela nos contactou informando (a sua vontade), sĂł que eu, particularmente, nĂŁo me opus. (…) A execução vai correr em Campo Grande e nĂłs estamos em Minas Gerais. EntĂŁo, o Adelio precisa de uma DPU que acompanhe pari passu os prontuĂĄrios mĂ©dicos. Esses prontuĂĄrios sĂŁo aportados no presĂdio federal. Para a DPU, que estĂĄ lotada em Campo Grande, Ă© muito mais fĂĄcil ter acesso Ă documentação e socorrer o Adelio em alguma emergĂȘncia.”