Bares e restaurantes têm desafio de se adaptar à nova dinâmica de atendimento

Setor passa por adequações após retomada de serviços presenciais, a fim de reconquistar clientes e evitar novas interrupções das atividades


Por Leticya Bernadete

27/09/2020 às 07h00

Tomar uma cerveja com os amigos aos finais de semana não será mais como antes – pelo menos enquanto durar a pandemia do coronavírus. Desde 29 de agosto, o consumo interno nos bares voltou a ser permitido em Juiz de Fora, mas com restrições severas, que vão desde redução no horário de funcionamento ao distanciamento de mesas. Agora, o setor, como um todo, incluindo restaurantes, busca reconquistar a confiança dos clientes, ao passo que reforça os protocolos de segurança a fim de evitar regressão no programa Minas Consciente, em que Juiz de Fora se encontra, atualmente, na onda amarela.

O decreto municipal 14.068 detalha as regras para reabertura dos bares na cidade, autorizados a funcionar com recebimento de público para consumo interno de 10h às 22h todos os dias da semana, desde que mantenham espaçamento de dois metros entre as mesas. No entanto, ficam proibidos quaisquer tipos de entretenimento e ocupação superior a 50% de sua capacidade.

No caso dos restaurantes, os mesmos estavam autorizados a funcionar desde o início da pandemia, desde que fosse respeitada a distância entre as mesas, mas devendo priorizar a entrega em domicílio. Com algumas mudanças estabelecidas pelo Comitê Municipal de Prevenção e Enfrentamento à Covid-19, os estabelecimentos também passaram a ter como regra a limitação de 50% da capacidade. O funcionamento permitido é de segunda a domingo, das 11h às 15h e das 18h às 22h, inclusive com comercialização de bebidas alcoólicas para os consumidores que estiverem no espaço.

Reinvenção do atendimento

Desde o início da pandemia até o final de agosto, o Varanda Restô Beer atuou somente com o serviço de delivery, que já demandava protocolos de higienização reforçados, entretanto, neste intervalo de tempo, o estabelecimento buscou se atentar e adaptar às medidas de segurança para a eventual retomada do serviço presencial. De acordo com a proprietária, Angélica Costa, o Varanda mantém um espaço próprio para recebimento de mercadorias e limpeza das mesmas. Agora, com o retorno do atendimento interno, as práticas de segurança foram ampliadas, com os distanciamentos e a disponibilização de álcool em gel por todo o espaço, por exemplo.

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No Varanda Restô Beer, práticas de segurança foram intensificadas (Foto: Fernando Priamo)

Além disso, os funcionários passaram por treinamento oferecido pelo Sebrae. “Com isso, nós conseguimos que tivesse uma sinergia em torno da nossa equipe, de conscientização sobre o que seria esse retorno. Apesar de ter trabalhado com delivery, nós ficamos quase seis meses sem funcionar com atendimento ao público direto”, conta Angélica. “Estamos nos reinventando até no atendimento para manter um trabalho legal e estamos tendo um movimento relativamente bom para esse retorno.”

O principal desafio da retomada do atendimento é a conscientização dos clientes, de acordo com a proprietária do Varanda Restô Beer. Isto porque, além das restrições de horário, o estabelecimento também buscou limitar a quantidade de pessoas por mesa: no máximo, quatro clientes, ou até seis se forem integrantes da mesma família. “Está sendo um desafio limitar o atendimento. O pessoal ficou tanto tempo sem sair e, agora, todo mundo está querendo sair, mas temos que ter essa consciência de que nada vai ser normal por enquanto”, exemplifica.

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No Birosca, foram disponibilizados produtos para higienização dos clientes (Foto: Fernando Priamo)

Resistência

No bar e restaurante Birosca, há também dificuldades com a resistência de algumas pessoas em seguir as novas normas, entretanto, grande parte da clientela tem se adaptado e colaborado para o funcionamento devido do estabelecimento, de acordo com uma das sócias do espaço, Marcela Jannuzzi. “A maioria tem ajudado muito e tem estado até mais à vontade de ficar no bar, porque está vendo que estamos tomando muito cuidado”, conta. “Ter esse feedback é muito importante, porque estamos tentando ao máximo nos adaptar, e se a pessoa, que está com medo e tomando seus cuidados em casa, sai e se sente à vontade, é porque estamos fazendo certo”, avalia.

Seguindo as orientações e os protocolos de saúde do Município, o Birosca fez as adaptações de distanciamento e disponibilização de produtos para higienização, além de ter limitado o número de clientes por mesa a fim de evitar aglomerações. Outras adequações no atendimento foram adotadas como ao servir pratos que antes eram oferecidos no modelo de self service. “Agora é uma pessoa paramentada, com face shield e luva, que fica servindo cada um dos clientes. Também tem uma demarcação no chão para que eles não ultrapassem e cheguem perto do buffet.”

Cuidado redobrado

No Trem da Terra, o cuidado e a atenção com a limpeza estão redobrados, desde em relação ao espaço e aos utensílios de cozinha, como também com as máquinas de cartão. O distanciamento é mantido não só nas mesas, mas no próprio atendimento. De acordo com o sócio-gerente do restaurante, Anis Júnior, a equipe também passou por treinamento para lidar com as novas adequações. Já a clientela, avalia, está se adaptando aos poucos com as mudanças.

“No início, os clientes estavam meio receosos, mas agora já estão acostumando com esse novo normal. As ruas estão bem mais cheias, aí as pessoas já estão se adaptando a essa nova fase, estão entendendo melhor como essa nova dinâmica funciona, até para sair na rua e entrar em um estabelecimento comercial”, comenta.

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No Birosca, foram disponibilizados produtos para higienização dos clientes (Foto: Fernando Priamo)

Cerca de cem estabelecimentos fechados devido à pandemia

Durante os últimos seis meses, com grande parte do setor com funcionamento interrompido devido às restrições necessárias ao enfrentamento da Covid-19, cerca de cem estabelecimentos encerraram as atividades na cidade, de acordo com levantamento da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes – Zona da Mata (Abrasel/ZM) e do Sindicato de Hotéis, Restaurantes e Bares de Juiz de Fora. Para evitar novas perdas, as entidades representativas lançaram uma campanha a fim de promover uma retomada consciente, tanto entre empresários como entre os clientes. “Determinados comportamentos do próprio consumidor no ambiente do bar e do restaurante têm que ser modificados, inclusive a escolha do horário de sair de casa, por exemplo”, diz a presidente da Abrasel/ZM, Francele Galil, em referência à redução do horário de funcionamento dos estabelecimentos.

De acordo com Francele, a orientação é que os estabelecimentos ofereçam álcool em gel para os clientes e se atentem às regras de distanciamento das mesas, além de terem atenção redobrada quanto à higienização do espaço. No caso dos consumidores, o uso das máscaras de proteção é obrigatório, exceto nos momentos em que estiverem comendo ou tomando alguma bebida. “Esse é o novo normal. Apesar de termos o distanciamento, nós recomendamos evitar contato muito próximo e de toque com outras pessoas que estiverem também no ambiente”, reforça.

Para a presidente da Abrasel, conforme a flexibilização econômica ocorre, a população está voltando a buscar novos espaços para lazer, demonstrando necessidade de retomada de outras atividades voltadas ao entretenimento. “É importante conseguirmos reabrir mais pontos, para que possamos distribuir melhor esse fluxo de pessoas para outros ambientes”, aponta.

Expectativa de recuperação

Aos poucos, Juiz de Fora tem retomado a rotina dentro do novo cenário e, com isso, já observa-se movimento nos bares e restaurantes – dentro das limitações. A expectativa é que o setor se recupere da crise ocasionada pela pandemia, de acordo com o coordenador executivo do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Juiz de Fora, Rogério Barros. “Com certeza não será um ano bom para o setor, porque ficar quase seis meses parado é metade do ano, metade do faturamento”, aponta. “Você não pode ter um movimento muito forte em razão dos protocolos, mas tem sido um movimento bom, que tem ajudado a pagar os aluguéis”, exemplifica.

A campanha lançada pelo Sindicato e pela Abrasel tem como objetivo evitar novas perdas ao setor, visto que, caso o cenário de contaminação pelo coronavírus se acentue, o mesmo pode passar por regressões, com restrições ainda mais acentuadas novamente. “Os protocolos devem ser mantidos, e os clientes devem respeitá-los porque ainda não é momento de ‘liberou geral’. Ainda estamos em uma fase que pode ser regredida”, diz Barros. “Temos feito a campanha nos meios de comunicação para poder orientar tanto os frequentadores quanto os empresários. Os empresários já estão bem estruturados porque eles já foram penalizados com fechamento no mês de março.”

Como lembrado pelo coordenador-executivo do Sindicato, a Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) mantém o trabalho de fiscalização dos estabelecimentos a fim de evitar excessos. Desde 28 de agosto até a última terça-feira (22), a Secretaria de Meio Ambiente e Ordenamento Urbano (Semaur) emitiu 24 documentos para bares e similares, sendo doze notificações, um termo de intimação, cinco diligências e seis autos de infração. Entretanto, essas fiscalizações não são relativas somente ao descumprimento às medidas para enfrentamento da Covid-19, mas também englobam falta de alvarás e utilização de mesas e cadeiras em via pública. No caso de restaurantes, apenas um documento foi emitido neste intervalo. Na terça, os fiscais da Semaur interditaram um restaurante que estava atuando com autosserviço, localizado no Bairro Santa Therezinha.

Especialista defende testagem em massa para retomada econômica

Apesar de severas, as medidas de segurança adotadas para reabertura dos setores econômicos na cidade não são garantia de proteção integral em relação à contaminação pelo coronavírus, de acordo com o médico infectologista Marcos Moura. Desta forma, cabe a cada cidadão ter um discernimento quanto aos riscos ao frequentar esses espaços. “Durante uma pandemia, as prevenções são muito frágeis porque a pessoa está em risco o tempo todo”, diz. “As pessoas vão acabar se colocando em risco e não podem achar que a culpa é do bar, mas sim de todo o modelo, porque, basicamente, o que temos parado são as escolas. A pessoa que não está indo na escola, como o universitário, está fazendo outras coisas que a coloca em risco”, exemplifica.

Para o especialista, a retomada das atividades na cidade deveria se basear em uma política de testagem em massa, a fim de ter um cenário mais próximo dos reais contaminados pelo coronavírus. Isto porque os exames só são realizados em pessoas que apresentam quadros graves da doença. “Acho que só pode ter uma retomada se você conhece a quantidade de pessoas infectadas em uma cidade. Nós não temos um diagnóstico efetivo. As pessoas que estão ficando doentes, se não têm a doença de forma grave, elas não sabem se tiveram Covid-19 ou não, então ficam em uma subposição”, explica Moura.

Conforme lembrado pelo infectologista, a média de testes confirmados é de apenas cerca de 1%, levando em conta toda a população de Juiz de Fora, estimada em 573.285 pessoas de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Segundo o boletim epidemiológico da PJF, divulgado na última quinta-feira (24), a cidade totalizava 5.816 contaminados pelo vírus. No que diz respeito a casos suspeitos de Covid-19, foram mais de 21 mil notificações.

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