Aumento do IOF: comerciantes e consumidores já sentem os impactos no bolso

Redução de compras de produtos importados e postura cautelosa são alguns dos efeitos da mudança no imposto


Por Fernanda Castilho

21/08/2025 às 06h00

O Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) ficou no centro das discussões políticas no primeiro semestre deste ano. Após imbróglio entre Governo e Congresso, o Supremo Tribunal Federal (STF) deu a palavra final autorizando o aumento do imposto. As alterações das alíquotas, que buscam aumentar a arrecadação, atingem principalmente compras internacionais com cartões de crédito, débito e pré-pagos, aquisição de moeda estrangeira, remessa de recursos para o exterior e tarifas de crédito para Microempreendedores Individuais (MEI) e optantes do Simples Nacional.

Com essas mudanças, comerciantes e consumidores já sentem os impactos no bolso, reduzindo compras de produtos importados e adotando posturas cautelosas diante de um cenário ainda incerto. Somadas a outros fatores, como Selic alta, economistas avaliam custo maior para entrada e saída de capital no país, que, paralelamente, reduz o capital especulativo, e como os efeitos chegam ao dia a dia do consumidor comum.

Aumento de impostos traz período de incertezas ao mercado

Como explica Carla Beni, economista e professora da Fundação Getúlio Vargas (FGV), o IOF é um imposto regulatório que incide sobre operações de crédito, de câmbio, de seguro e de títulos de valores mobiliários, e seu recente aumento, por exemplo, encarece o crédito para as empresas que precisam de empréstimos. Acrescido pela alta da Selic, há elevação da taxa de juros e contenção do crédito, componentes que formam uma política monetária restritiva, impactando o setor privado. “Entendo que o Governo ficou amarrado com a questão fiscal, precisando aumentar recursos, com um volume de emendas gigantesco do Congresso, que não está preocupado com a questão fiscal. Então, não teve alternativa para fechar o arcabouço fiscal. O contraponto é que, com o custo adicional, o setor privado deve incorporar e não necessariamente repassar isso para o consumidor final.”

Segundo Flávia Chein, economista e professora da Faculdade de Economia da UFJF, qualquer aumento de impostos traz efeitos sobre a produção e o consumo no país. Porém, quando a trajetória de inflação está sob controle e com uma previsão de crescimento de longo prazo sustentável, os reflexos podem ser menos danosos. Com esse aumento, o custo para viagens internacionais fica mais caro, reduzindo a demanda, e o crédito para pessoas jurídicas tende a ficar mais alto, impactando novos investimentos. “Podemos esperar, no curto prazo, um período mais complicado, com mais incerteza para o mercado, o que, obviamente, deve gerar novas altas de preços e elevação do custo de empréstimos e financiamentos que afetarão o bem-estar do consumidor comum.”

A economista considera que, para estabilizar a economia, o Governo tem como possibilidade tentar zerar o déficit nas contas públicas, cortando gastos e aumentando receitas. “O crédito ficará bem complicado se tivermos o aumento do IOF combinado com a alta da Selic. O que se espera é que o Banco Central inicie uma trajetória de queda da taxa para contrabalançar o novo aumento de custo dos empréstimos e financiamentos.” 

Medida é considerada ‘questionável’

A advogada tributarista e professora do Insper, Thais Romero Veiga Shingai, afirma que, com a elevação do custo do crédito para o setor privado, mesmo que não seja pago diretamente pelo cidadão, tende a ser repassado no preço de bens e serviços, afetando o consumidor final. “Mesmo quem não toma empréstimos ou não realiza operações cambiais pode sentir o efeito no bolso, porque o aumento no custo financeiro das empresas tende a ser embutido nos preços que pagamos no dia a dia”, explica.

Thais avalia que a medida pode reduzir a capacidade de investimento das empresas e impactar a produção e o emprego. “Embora o Governo estime arrecadar valores consideráveis, essa escolha vai na contramão da necessidade de simplificar a tributação e reduzir custos financeiros, especialmente em um momento de transição para o novo sistema tributário.”

Em análise sob o ponto de vista constitucional, a advogada considera a medida ‘questionável’, pois o imposto tem função preponderantemente regulatória, destinado a influenciar a política cambial, monetária e creditícia. “Quando o próprio Governo declara que a motivação é meramente arrecadatória, como ocorreu na apresentação dos decretos, há um desvio de finalidade, uma inconstitucionalidade. O IOF deveria funcionar como um instrumento de ajuste fino da economia, e não como um mecanismo permanente de aumento da carga tributária”, declara.

Comerciantes e consumidores reduzem compras de importados

“Já faz alguns anos que eu compro produtos do exterior, na maioria das vezes roupas, na Shein, o único aplicativo que confiei”, afirma Maria Cecília Gervasio, 25 anos, estudante de contabilidade. Ela conta que costumava fazer compras mensais na loja virtual, mas, agora, por conta das taxações, diminuiu suas encomendas. “Os produtos estão no mesmo valor das lojas físicas, na compra presencial. Passei a ser menos consumista e parei de adquirir sem necessidade”.

Caso semelhante ao da bartender Christiane Rossi, 36, que frequentemente comprava em e-commerces, como Shein e Shopee, mas diminuiu seus pedidos devido ao aumento das taxas. “No momento, dou preferência para lojas nacionais nesses mesmos sites, que nem sempre oferecem a mesma qualidade, mas ainda compensam em comparação aos valores das taxas de importação.”

 

Garrafaria, loja de vinhos, bebidas destiladas e alimentos gourmet, na qual a maioria dos produtos comercializados são importados.
(Foto: Leonardo Costa)

Do outro lado do balcão, a proprietária da Garrafaria, Isabela Romanelli, 31, afirma que houve aumento ‘significativo’ do valor dos produtos importados, negociados em moeda estrangeira. Entre as garrafas de vinhos, as bebidas destiladas e os alimentos gourmets dispostos nas gôndolas, ela estima que 80% desses itens comercializados pela loja são importados. “As operações de câmbio são diretamente impactadas, e é inevitável que os revendedores, como nós, sofram com os preços mais altos.”

Com a intenção de entender os impactos no mercado, a proprietária diminuiu a compra desses produtos e tem evitado repassar as variações de preços aos consumidores. “Ainda não observamos diminuição das vendas. Tendo em vista que nossa loja trabalha majoritariamente com produtos importados, a procura se mantém, e o que ocorre, às vezes, é de um cliente optar por um produto diferente com preço mais baixo.”

Tópicos: economia / IOF

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