Food bike abre oportunidade de renda
Novo modelo de negócio faz releitura da tradicional comida de rua
A releitura da conhecida comida de rua tem nome, sobrenome e se mantém sob duas rodinhas: food bike. O modelo de negócio associado ao conceito de food truck é mais simplificado na sua operação e exige menor investimento. Apesar de o comércio ambulante de comida de rua não ser um conceito novo, a modalidade traz uma série de inovações para o mercado, contribuindo para enterrar, de vez, o estigma de comida barata e de baixa qualidade oferecida nas ruas. O movimento que ganhou força no país em 2014, quatro anos depois, mostra que tem potencial e começa a dar os primeiros passos rumo à regulamentação em Juiz de Fora.
Por ser um nicho muito específico, o Sebrae-MG não dispõe de números de empreendedores com este perfil na cidade. O dado disponível é que 297 microempreendedores individuais atuam na categoria serviços ambulantes de alimentação em Juiz de Fora. O número representa 1,26% do total de MEIs no município: 23.570. Mas capacidade para expansão existe. O potencial de consumo para alimentação fora do lar, no qual o food bike está inserido, este ano, bate a casa dos R$ 664 milhões, 4,3% dos cerca de R$ 15 bilhões que devem ser gastos na cidade este ano. Os números referem-se à pesquisa divulgada esta semana pelo IPC Marketing Editora.
Muito antes da disseminação de bikes em eventos gastronômicos, Beatriz Campos Cavalcante, dona da marca Bhia Mel, resolveu aplicar, em Juiz de Fora, a modalidade de negócio que crescia em São Paulo. Era 2016, ela estava desempregada e identificou potencialidade no nicho de mercado. Dois anos antes, Beatriz já vendia pães de mel para familiares e amigos. Com o uso da bicicleta customizada, no entanto, começou a participar dos eventos gastronômicos realizados na rua e, além de aumentar as vendas, ganhou visibilidade. “É um negócio que chama a atenção porque é diferente, colorido. Muitos passaram a conhecer a marca.”
Quando ficou desempregada, Beatriz alimentou o sonho de ter o negócio próprio. “Sempre gostei de pão de mel, mas achava o produto muito seco.” Beatriz pesquisou na internet, fez inúmeros testes e chegou a uma receita de sucesso. O carro chefe é o pão de mel gourmet (com mais de dez opções de recheio), mas no mix há outras opções, como cesta, ovo de colher, pão de mel no pote, panetone, bolo e lembrancinhas para festas. A empresária diz que as vendas hoje acontecem prioritariamente pela food bike, mas ela tem planos de montar uma lojinha no próximo ano. “Minha fonte de renda vem da food bike. Depois dela, até arrumei um emprego, mas o negócio começou a crescer e decidi me dedicar exclusivamente a ele.” Para participar dos eventos, Beatriz vai pedalando ou conta com a ajuda do transbike.
Já a bicicleta estilosa de Luiza Coury Bernardes ganhou lugar de destaque na vitrine da Basílico, marca especializada em massas e molhos artesanais. Há dois anos, ela começou as vendas utilizando a food bike e, graças à clientela conquistada sob duas rodas, conseguiu montar, há seis meses, sua loja física. Mas a mascote não fica apenas na vitrine. Os pneus sujos de poeira, aliás, comprovam isso. A bicicleta ganha as ruas nos inúmeros eventos em que a marca participa. “Sempre recebi muitos elogios, além de chamar bastante a atenção da clientela.”
Para Luiza, outro benefício da modalidade do negócio é a possibilidade de participação em feiras e encontros de food trucks. A empresária conta que sempre se preocupou em cuidar do cenário, enfeitando o espaço com tapete de grama sintética e flores, com o objetivo de criar uma atmosfera acolhedora. O perfil dos produtos, diz, é adequado ao meio de venda, já que ela comercializa massa seca embalada e molho em potinhos. “Manter a loja física tem um custo muito maior. Quando usava só a bike não tinha esse custo fixo, o lucro era todo para mim. Com isso, fui guardando dinheiro para concretizar o projeto de abrir a loja.”
Lei autoriza atividade, mas carece de regulamentação
Apesar de ter sido sancionada há pouco mais de um mês, a Lei Complementar 77/2018, que dispõe sobre a comercialização de alimentos em food bike em Juiz de Fora, não é autoaplicável e carece de regulamentação pelo Executivo. Procurada, a Secretaria de Atividades Urbanas (SAU), por meio de sua assessoria, informou que enviará expediente à Procuradoria Geral do Município, solicitando que os termos da lei sejam avaliados e que se verifique a elaboração de decreto regulamentador. Não foram divulgados prazos. Conforme a SAU, a norma, da forma atual, não traz informações relevantes, como os produtos que poderão ser comercializados, os locais para a atividade, o preço público a ser cobrado e as penalidades em caso de algum descumprimento.
A lei de autoria do vereador José Fiorilo (PTC) permite a comercialização de alimentos em food bike em praças, vias públicas e locais particulares na cidade, não se confundindo com o comércio ambulante, regido pelo Código de Postura Municipal. Conforme o texto, a comercialização de gêneros alimentícios diretamente ao consumidor deverá ter caráter eventual e ser feita de modo estacionário ou itinerante, não possuindo ponto fixo nem concorrendo com o comércio local de forma permanente. O artigo terceiro prevê que a atividade será regida por autorização ou permissão do Município em caráter personalíssimo, vedada a transferência ou cessão a terceiros e obedecendo as normas editadas por órgãos, como Anvisa, Contran, Código Sanitário, Código de Posturas do Município e normas ambientais.
Conforme a norma, o horário de funcionamento não deve exceder às 22h em áreas exclusivamente residenciais, e o interessado deve manter distância mínima de 50 metros de bar, lanchonete, restaurante e padarias. Outra exigência é que os alimentos devem ser embalados em material descartável, contendo informações, como nome e endereço do fabricante, data de fabricação e prazo de validade, além de registro e autorização do órgão competente (quando previsto em lei). O uso de garrafa e copo de vidros, mesa, banco, cadeira ou similar é proibido.
Sebrae calcula custo médio mensal de R$ 3 mil
Conforme o Sebrae-MG, o investimento depende do tamanho do negócio, da localização, das especialidades servidas ao público e da estratégia adotada pela empresa. O custo médio mensal gira em torno de R$ 3 mil. A necessidade de pessoal depende, basicamente, da estrutura, do volume de atendimento e do que é vendido. Basicamente, deverá ser composta de um funcionário para operar a bicicleta, que fará as atividades de cozinheiro (caso seja preciso), atendente, caixa e administrador do negócio. A estrutura física pode ser dimensionada para apenas armazenar e comercializar comidas prontas ou para processar e comercializar comidas cruas ou semiprontas. Para aumentar as chances de sucesso, o empreendedor deve realizar pesquisas de mercado e elaborar um plano de negócios.
A consultora de Marketing do Sebrae, Paula Bento, avalia que a food bike, graças à sua proposta diferenciada, mantém um conceito que garantiu um posicionamento no mercado. Segundo ela, os produtos que costumam ser mais comercializados neste perfil de negócio são doces, pipoca, salgadinhos e cerveja e, mesmo fugindo do nome original, camisa e acessórios também são comercializados em bikes. Paula cita o exemplo de uma empreendedora que vende lacinhos de cabelo na porta das escolas. O diferencial, diz, é que ela muda o mostruário de acordo com o local de venda, priorizando as cores do uniforme da escola visitada. “É um exemplo de venda bem segmentada. E preciso inovar no posicionamento, para que ele se torne atrativo.”
A mobilidade, afirma, é um dos benefícios do negócio, já que o empreendedor não fica dependente de um ambiente e pode ir até o cliente. “A bike já é uma inovação, uma ruptura do ponto de venda.” A venda direta, diz, permite proximidade entre cliente e empreendedor, “deixando mais rica a relação e potencializando o relacionamento”. A consultora alerta que a escolha pela bike é um diferencial, mas o que vai levar às vendas é a capacidade de o produto se diferenciar e atender uma necessidade de mercado. “Um produto de boa qualidade gera desejo nas pessoas e tem chances de ser valorizado, tornando-se referência na cabeça do consumidor.”
Luiza participa de feiras e encontros e, graças à food bike, conta com uma loja física onde também vende seus produtos
Beatriz estava desempregada quando montou sua food bike; hoje já planeja montar uma loja física devido ao sucesso do negócio